Valor Econômico, v. 20, n. 4840 19/09/2019. Política, p. A10


Relator da tributária no Senado propõe IBS dual
 Renan Truffi
 Raphael Di Cunto



O relator da reforma tributária no Senado, Roberto Rocha (PSDB-MA), apresentou ontem seu parecer sobre o projeto na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Casa, em que prevê a criação do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) dividido em duas modalidades: uma federal e outra sob competência dos estados, numa espécie de "IBS dual".

Além disso, o tucano retira do projeto a previsão de desoneração da folha de pagamento. Ele também veta a incidência do novo tributo sobre movimentação ou transmissão de valores.

A proposta original é de autoria do ex-deputado Luiz Carlos Hauly (PSDB-SP), colega de partido de Roberto Rocha, mas passou por uma série de ajustes. No caso do IBS federal, serão cinco impostos aglutinados, em vez dos sete previstos anteriormente: IPI, Cofins, PIS/Pasep, IOF e salário-educação. Juntos, eles ficarão sob competência da União. A proposta ainda prevê a fusão do ICMS e o ISS, que formarão a versão estadual do tributo. Este último terá alíquotas fixadas por lei complementar, a ser enviada posteriormente.

"Essa dualidade do IBS seria invisível ao contribuinte, que continuaria recolhendo para duas fontes, mas segundo a mesma sistemática (mesma base de incidência e mesmo princípios referentes à não cumulatividade). Cremos, com isso, que compatibilizamos a necessidade de uniformização da tributação, mas com garantia de manter a autonomia dos entes federados", escreveu o relator.

Além disso, a proposta prevê que o IBS não poderá incidir sobre "sobre a mera movimentação ou transmissão de valores e de créditos e direitos de natureza financeira". O ministro da Economia, Paulo Guedes, e o ex-secretário da Receita, Marcos Cintra, demitido do cargo, vinham defendendo a recriação de uma nova Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF).

Rocha ainda retirou da proposta a previsão de desoneração da folha salarial, algo que vem sendo discutido pelo governo Bolsonaro. Ainda assim, o tucano manteve um dispositivo na legislação que permite essa possibilidade numa eventual mudança de entendimento. Outro ponto do projeto que foi mantido no texto é a instituição do Imposto Seletivo (IS), que terá uma função mais reguladora e menos de arrecadação. Inicialmente, inclusive, a previsão é que esse imposto iria incidir sobre setores como energia, telecomunicações, veículos e derivados do petróleo e do tabaco, mas o senador optou por não fazer essas determinações já agora. 

Como relator, Roberto Rocha aproveitou suas mudanças no projeto original para incluir uma série de benefícios fiscais destinados ao Maranhão, seu estado natal e base eleitoral. O texto prevê, por exemplo, a criação da "Zona de Processamento de Exportações do Maranhão (ZEMA)", que terá incentivos fiscais para as empresas que ali se instalarem, a ser regulamentado em projeto de lei complementar, e poderá existir por 30 anos.

No relatório, o próprio Roberto Rocha defende que as "características naturais" e de "infraestrutura" colocam o Maranhão como "local perfeito" para uma zona especial.

A proposta beneficiaria, principalmente, o Porto de Itaqui, localizado em São Luís, capital do estado. Essa decisão foi malvista por parlamentares que, nos bastidores, veem “politicagem eleitoral” por parte do tucano.

Rocha deseja concorrer ao governo do Maranhão em 2022 e é inimigo político do atual governador Flavio Dino (PCdoB-MA). “É por conta de posições como essas que ele não está conseguindo se firmar como interlocutor da reforma”, disse um parlamentar que participa de perto das negociações. "O Senado era a Casa ideal para fazer essa discussão, que é sobretudo federativa, mas a reforma na Câmara está concentrando mais as atenções", opinou.

A proposta deve ser apreciada em cerca de 15 dias na comissão, enquanto os senadores aguardam a apresentação de um projeto do governo. A última promessa feita é que a proposta da equipe econômica chegará depois da viagem do presidente à Assembleia-Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), prevista para a semana que vem.

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), criticou o relatório. “Respeitamos a proposta do IVA-Dual, mas achamos que a proposta dos governadores, de um IVA único, é melhor e mais moderna”, disse. O comitê gestor desse IVA, afirmou, será controlado pelos Estados, que são quem têm a maior parcela deste arrecadação com a incorporação do ICMS ao IVA, que unirá também ISS, IPI, PIS e Cofins. Maia afirmou que, com a adoção da proposta dos governadores, que pela primeira vez uniu São Paulo e o Amazonas em torno de um único texto, os deputados estão agora “num segundo embate”, que é a pressão dos setores de comércio e serviços contra mudanças na carga tributária com a adoção do IVA.  “Espero que eles sejam tão patriotas na reforma tributária como forma na previdenciária, quando não foram afetados”, disse.

Maia e o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), discutem criar uma comissão mista destinada a unificar as duas propostas em tramitação no Congresso. "Temos que buscar uma forma regimental e tentar construir. O que eu sempre disse para vocês em relação à reforma tributária é: quem tem três reformas não têm nenhuma", justificou Alcolumbre.