Valor Econômico, v. 20, n. 4840 19/09/2019. Política, p. A10

Câmara volta a mudar regras eleitorais

 Raphael Di Cunto
 Marcelo Ribeiro


 

A Câmara dos Deputados aprovou ontem à noite o texto-base do projeto de lei que flexibiliza as regras sobre prestação de contas dos partidos. Após o Senado, sob pressão, excluir praticamente todas as mudanças do projeto que afrouxava as regras de contabilidade dos partidos, como as

Num parecer que passou pelo aval do Centrão, oposição, DEM e PSDB, o relator do projeto, deputado Wilson Santiago (PTB-PI), concordou com a exclusão de três pontos mais polêmicos do projeto: que os partidos pudessem prestar contas em qualquer formato, sem utilizar o sistema do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o que dificultaria a fiscalização; a necessidade de comprovar dolo (intenção) para aplicar multas eleitorais; e de os partidos mudarem, até a data de julgamento das contas, “erros formais e materiais, omissões ou atrasos na divulgação”.

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), defendeu o texto e destacou que são “da democracia” as críticas da sociedade e ajustes no texto. “Não entendemos que o projeto que a Câmara votou seja ruim”, disse. O deputado Paulinho da Força (SD-SP), principal articulador nos bastidores, afirmou que a decisão foi retirar “alguns exageros”, mas “manter os avanços” na legislação eleitoral e partidária.

Entre os “avanços” está proibir o bloqueio completo do fundo partidário para ressarcir os cofres públicos por irregularidades no uso do dinheiro (haverá um limite de 50% da cota mensal) e a autorização para criação de institutos para gerirem os 5% do fundo destinado a promoção de mulheres na política (para evitar que o dirigente partidário seja responsabilizado por problemas nos gastos).

O texto também permite que os partidos contratem os funcionários e dirigentes que receberem mais de R$ 11 mil de salários fora da CLT, estabelece as fontes de receita do fundo eleitoral para 2020 (o valor, contudo, ficou para ser decidido pela lei orçamentária anual) e recria a propaganda partidária na TV e rádio, que será exibida fora dos períodos eleitorais (e que foi extinta há três anos para pagar a criação do fundo eleitoral).

Além disso, o projeto autoriza uma série de gastos com o fundo partidário que estavam sendo condenados pelo TSE, como o pagamento de multas eleitorais, a compra de imóveis, o custeio de impulsionamento de conteúdo na internet e redes sociais e a contratação de advogados e consultorias. Este último ponto passou por alteração para vedar a possibilidade de que esses advogados atuem na defesa de filiados acusados de corrupção.

Conforme o Valor revelou esta semana, paralelamente ao afrouxamento nas prestações de contas, os partidos se mobilizaram no Congresso e aprovaram dispositivo na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2020 para elevar o valor do fundo partidário, exigindo a correção pela inflação, e proibir que o governo cortasse o dinheiro, que somará R$ 959 milhões em 2020. Pela lei eleitoral, o fundo seria de R$ 355,3 milhões (equivalente a R$ 0,35 por eleitor).

Apesar de o projeto estabelecer apenas a fonte de custeio do fundo eleitoral para 2020, os debates no plenário da Câmara giraram em torno de usar ou não dinheiro público para campanhas eleitorais. O Novo, contrário ao fundo, foi atacado pela maioria dos partidos. PSL e Podemos também criticaram o fundo e foram rebatidos com ironias dos outros partidos, dizendo então que não usassem o dinheiro.

O deputado Fabio Trad (PSD-MS) afirmou que o modelo é melhor que o financiamento privado, em que “grandes empresários vão cobrar um posicionamento político” após fazerem a doação. “Antes ser financiado pela sociedade de uma forma límpida e transparente do que ser financiado por uma corrupção antecipada de quem quer fortalecer o mercado”, disse.

Líder do Novo, o deputado Marcel van Hattem (RS), disse que o fundo era uma pauta “corporativista, de interesses muito próprios”.  “É completamente falacioso o discurso de que o dinheiro público vai para campanhas dos mais pobres. Mentira! O dinheiro foi para aqueles que já tinham mandado tentarem se reeleger”, atacou.