Valor Econômico, v. 20, n. 4948, 27/02/2020. Política, p. A8

PEC pode criar terceira mesa diretora no Congresso

Marcelo Ribeiro
Raphael Di Cunto


Aliados do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) flertam com a possibilidade de separar as presidências do Congresso e do Senado, por meio de uma proposta de emenda constitucional (PEC), para mantê-lo em um cargo de prestígio por mais dois anos. Principal beneficiário do eventual projeto, Maia não quis comentar a iniciativa de alguns de seus pares.

Esse é um caminho para garantir espaço honroso para o deputado do DEM após três mandatos consecutivos à frente da Câmara e também para evitar que ele mude de posição sobre sua reeleição, hoje proibida, e assim atrapalhe os planos de seus operadores de disputarem a sua sucessão. Eles receiam que, se não tiver outra alternativa, Maia poderia tentar mudar a Constituição para permanecer mais dois anos, até a eleição para a Presidência da República em 2022.

Diante da preocupação de que Maia fosse despejado na planície do Congresso após deixar o posto, aliados iniciaram conversas para definir uma posição que ele poderia ocupar a partir de fevereiro de 2021. Querem deixá-lo em evidência para ser uma alternativa à Presidência ou a vice de algum nome de “centro”.

Inicialmente, a cadeira de líder da Maioria na Câmara era considerada um “cargo à altura”. O posto é ocupado pelo deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) e é responsável por negociar uma posição conjunta de partidos como PP, PL, PTB, SD e PSD, que formam o chamado “Centrão”. Alguns postulantes ao comando da Casa, porém, interpretaram que isso acarretaria no fortalecimento da candidatura de Aguinaldo.

A migração para um ministério seria vista como natural não fossem os embates protagonizados entre Maia, o presidente Jair Bolsonaro e auxiliares na atual legislatura. Não haveria, no entendimento de aliados, confiança entre eles para ocupar um cargo de prestígio no governo.

Com este cenário, ganharam força as especulações de que Maia poderia endossar o movimento do presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), de tentar emplacar uma PEC que viabilizasse a reeleição de ambos, possibilidade já rejeitada por ele em algumas oportunidades.

Para afastá-lo dessa alternativa, parlamentares estariam estudando investir na elaboração de um texto que dissociasse a figura dos presidentes do Congresso e do Senado. Hoje, Alcolumbre ocupa os dois cargos. A partir desse projeto, uma terceira Mesa Diretora seria definida para comandar o Congresso.

Segundo deputados que simpatizam com a PEC, o texto daria mais poder institucional ao Congresso e sobre o Orçamento, que agora é impositivo e sob maior responsabilidade do Legislativo. O presidente da Casa ficaria responsável por executar um papel similar ao de um primeiro-ministro. Seria um avanço em relação ao parlamentarismo branco, que já vem sendo praticado por Maia desde o ano passado. A proposta passou a ser considerada antes mesmo de Bolsonaro compartilhar vídeo sobre as manifestações de 15 de março, em apoio ao governo e contra o Congresso.

No novo perfil, o presidente do Congresso teria como uma de suas atribuições defender as posições de Câmara e Senado em relação a propostas encaminhadas pelo Palácio do Planalto, o que já vem sendo feito de maneira mais contundente por Maia desde que Bolsonaro chegou à presidência.

Apenas em 2020, o deputado do DEM já fez críticas públicas a dois integrantes da Esplanada: os ministros da Educação, Abraham Weintraub, e do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), Augusto Heleno. Já na abertura dos trabalhos do ano legislativo, Maia passou um recado sobre a independência do Poder Legislativo em relação ao Executivo.

Na avaliação de aliados de Maia, o principal entrave para o avanço da eventual PEC seria a resistência dos senadores, já que o projeto representaria uma perda de poder do presidente do Senado. Para evitar que Alcolumbre trave a tramitação da proposta, os parlamentares avaliam incluir um trecho que viabilize a reeleição dele no cargo.

Senadores alinhados com Alcolumbre chegaram a cogitar um projeto que permitisse a reeleição dele, mas impedisse a de Maia. O texto permitiria apenas uma reeleição, não importa a legislatura (hoje é autorizada a reeleição, mas só entre uma legislatura e outra, por serem novos mandatos). Maia está no terceiro mandato consecutivo à frente da Câmara, mas Alcolumbre está em sua primeira gestão.

Para aliados do presidente do Senado, essa PEC teria mais chances de avançar na Câmara, já que tranquilizaria deputados que querem disputar a presidência da Casa. Haveria mais disposição de votar a favor do projeto, porque Maia não poderia se beneficiar da mudança constitucional.

No final do ano passado, Alcolumbre disse que não estava trabalhando numa PEC para sua recondução, mas que estava “à disposição” caso seus pares quisessem que ele permanecesse.