Valor Econômico, v. 20, n. 4841 20/09/2019. Política, p. A7
 

Privatização da Eletrobras corre risco no Senado
 Renan Truffi
 Edna Simão 


 

O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), disse ontem que o governo não tem voto suficiente no Senado para avançar na privatização da Eletrobras. Ele sugeriu que as privatizações comecem por outras companhias estatais, a exemplo dos Correios. Alcolumbre descartou, também, uma outra ideia esboçada pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, de obter um “fast track” para acelerar o programa de privatizações do governo Bolsonaro. A discussão, segundo ele, terá que ser “caso a caso”.

Quase todos os senadores do Norte e do Nordeste estão contra a venda da Eletrobras, “inclusive eu”, disse o presidente do Senado que é do Amapá, lembrando, ainda, que o governo não tem base de sustentação política no Congresso para garantir a aprovação da operação.

“Tem que ter uma agenda de privatizações. O governo não pode começar pela Eletrobras. Começa com o que tem mais facilidade para depois ir para o que tem mais dificuldade”, disse Alcolumbre, durante o evento “E agora, Brasil?” organizado pelo jornal “O Globo” em parceria com o Valor, em Brasília.

O alerta de Alcolumbre joga um balde de água fria nas pretensões da área econômica do governo, que considera a privatização da Eletrobras uma das prioridades para 2020 não só do ponto de vista fiscal, mas para assegurar os investimentos necessários para a expansão da oferta de energia, já que o grupo Eletrobras não tem os recursos necessários para  garantir o atendimento da demanda futura.

A proposta de Lei Orçamentária Anual (PLOA) para o ano que vem prevê R$ 16,2 bilhões com a descotização da Eletrobras. Se a operação não for aprovada, o governo terá que encontrar uma saída para compensar essa perda de receita.

“Se você me perguntar hoje, qual seria uma empresa que com muita dificuldade seria privatizada seria a Eletrobras. Se o governo continuar insistindo em colocá-la como o primeiro passo, acho que pode acabar prejudicando as outras empresas estatais [cuja venda] seria importante para nossa modernização”, ressaltou o presidente do Senado.

Segundo ele, 48 senadores do Norte e do Nordeste já manifestaram receio de autorizar a privatização da estatal do setor elétrico. Na sua avaliação, a resistência à venda dos Correios é menor, hoje, e, portanto, a ECT poderia vir a liderar a lista de alienação das empresas públicas federais.

Durante o debate, Alcolumbre ressaltou a importância da aprovação de uma reforma tributária focada na simplificação e sem aumento de carga tributária. A área econômica discutia a possibilidade da criação de um imposto sobre transações financeiras, que ficou conhecido como nova CPMF, para financiar a desoneração da folha de salário das empresas da contribuição previdenciária.

“Se tivermos oportunidade de desonerar, vamos desonerar, mas não vamos fazer nada que sufoque mais os brasileiros”, salientou o presidente do Senado. “Vamos fazer [primeiro] a simplificação de impostos, cada dia com sua agonia”, disse.

Ele enfatizou a importância da aprovação da reforma da Previdência para dar sustentabilidade às contas públicas. Sobre o novo Pacto Federativo proposto pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, Alcolumbre citou algumas iniciativas que fazem parte da descentralização de receitas e despesas entre a União os Estados e os municípios. “Já foi acordada a  aprovação de um projeto que permite a realização de securitização por Estados e municípios e, também, para aumentar em quatro anos o prazo para pagamento dos precatórios.

Ele considerou “natural” que o Congresso venha a discutir em breve a volta do financiamento privado de campanha. Segundo ele, isso deve acontecer diante das críticas feitas pela sociedade em torno dos valores discutidos para o financiamento público de campanha eleitoral e, também, por conta da difícil situação da economia brasileira.

“Diante do debate que foi estabelecido em relação ao momento que estamos vivendo, naturalmente isso [debate sobre volta do financiamento privado] vai acontecer. Não dá para mudar o financiamento por lei ordinária. Não tinha tempo para fazer isso por proposta de emenda constitucional (PEC), que seria um debate mais longo”, afirmou.

Questionado sobre o fundo eleitoral, em discussão atualmente no Congresso, Alcolumbre voltou a defender que o valor de R$ 1,7 bilhão, gasto nas eleições de 2018, é baixo para o tamanho da demanda das eleições municipais de 2020. “Eu fiz uma comparação com as eleições passadas. O que eu me posicionei foi fazendo contas”.

O presidente do Senado negou que tenha havido qualquer tipo de divisão no Congresso. A Câmara aprovou um projeto que afrouxa as regras de financiamento para partidos políticos em períodos eleitorais. O Senado, por sua vez, derrubou essas mesmas mudanças. A Câmara, porém, recolocou no projeto as alterações derrubadas pelo Senado, em uma clara desautorização daquela Casa.

O assunto colocou Câmara e Senado em rota de colisão, mas o presidente do Senado negou que tenha havido desentendimentos entre as duas Casas ou, ainda, entre ele o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, seu colega de partido. “Não houve nem racha nem acordo”, comentou Alcolumbre. No evento, o senador do Amapá procurou minimizar também sua atuação na votação da minireforma eleitoral, quando tentou colocar o projeto em votação repentinamente, sem tramitação prévia em nenhuma comissão, o que irritou parte dos senadores da Casa, que estavam contrários ao tema. Na versão de Alcolumbre, sua intenção era apenas acelerar a aprovação do projeto. “A Câmara tomou uma decisão em relação a uma matéria e eu coloquei um pouco de pressa era minha preocupação definir uma regra de financiamento de campanha. Não me debrucei sobre a matéria como um todo”, justificou.