Valor Econômico, v. 20, n. 4841 20/09/2019. Política, p. A11

PF investiga líder do governo no Senado por suposta propina de R$ 5,5 milhões
 Isadora Peron
 Fabio Murakawa
 Renan Truffi
 Edna Simão
 Luísa Martins


 

O líder do governo no Senado, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), e seu filho, o deputado Fernando Coelho Filho (DEM-PE), foram alvo ontem da Operação Desintegração, da Polícia Federal (PF) autorizada pelo ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF). Mandados de busca e apreensão foram cumpridos até nos gabinetes dos parlamentares. Eles são acusados de terem recebido propina de cerca de R$ 5,5 milhões de empreiteiras, entre elas a OAS.

As investigações apontam supostas irregularidades em obras como a transposição do Rio São Francisco, no período em que Bezerra foi ministro da Integração Nacional, no governo da ex-presidente Dilma Rousseff (PT).

No despacho de 30 páginas, no qual dá o aval para a PF cumprir 52 mandados de busca e apreensão, Barroso faz um resumo das investigações. A ação foi deflagrada com base no depoimento dos empresários João Lyra, Eduardo Freire Bezerra Leite e Arthur Roberto Lapa Rosal.

Os três decidiram colaborar com as autoridades após a Operação Turbulência, de junho de 2016, que investigava o acidente aéreo que matou o então candidato à Presidência Eduardo Campos, em agosto de 2014.

“Os colaboradores narraram, em síntese, que participaram do pagamento sistemático de vantagens indevidas ao senador da República Fernando Bezerra de Souza Coelho e a seu filho, o deputado federal Fernando Bezerra de Souza Coelho Filho, por determinação das empreiteiras OAS SA, Barbosa Mello SA, SA Paulista e Constremac Construções SA”, diz o despacho.

O documento também afirma que Bezerra usou “laranjas” e dissimulou “a origem dos valores recebidos diretamente de infrações penais, através de um esquema de lavagem de capitais, envolvendo empresários, operadores e outros políticos e pessoas jurídicas”.

Na peça, Barroso também justifica a necessidade de se realizar busca e apreensão em endereços ligados ao senador. A então procuradora-geral da República Raquel Dodge havia sido contra a diligência, argumentando que “a medida invasiva” teria “ pouca utilidade prática’.

Para o ministro do STF, porém, esse argumento não foi “convincente”. “Na criminalidade organizada econômica [...], o natural é que todos os envolvidos tentem ocultar provas e não evitar deixar registros de seus atos. A medida cautelar serve justamente para tentar encontrar documentos mantidos sigilosamente, longe dos olhos do público e das autoridades de investigação.”

Barroso também divulgou uma nota à imprensa em que afirmou que a decisão “foi puramente técnica e republicana, baseada em relevante quantidade de indícios de práticas de delitos”. O ministro disse que a operação “não envolveu nenhum prejulgamento” e que buscas e apreensão são “padrão em casos de investigação por corrupção e lavagem de dinheiro” e que “a investigação de fatos criminosos pela Polícia Federal e a supervisão de inquéritos policiais pelo STF não constitui quebra ao princípio de separação de poderes”. No documento, Barroso garantiu: “Só faço o que é certo, justo e legítimo”.

Horas depois do início da operação, Bezerra colocou o cargo de líder do governo Jair Bolsonaro à disposição. O ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, disse ontem que o Palácio do Planalto ainda iria aguardar os desdobramentos da investigação antes de tomar uma decisão.

A ação também voltou a trazer apreensão à PF. O ministro da Justiça, Sergio Moro, foi chamado para uma conversa com Bolsonaro no Palácio do Alvorada. O encontro não estava previsto na agenda de nenhum dos dois. Esta semana, eles haviam acertado a permanência de Maurício Valeixo à frente da Polícia Federal, vencendo a resistência do presidente. O ministro saiu da conversa tranquilizando interlocutores. Ele explicou a Bolsonaro, durante o encontro, que a investigação era antiga e relacionada ao governo Dilma. Na avaliação de Moro, o episódio está superado.

Ontem, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), defendeu Bezerra e afirmou que as buscas realizadas no Congresso representam uma “diminuição” da instituição e que ele “não vai deixar que isso aconteça”. “Vamos questionar isso juridicamente [no STF] para que o Senado se posicione como instituição desse país”, afirmou no evento “E agora, Brasil?”, realizado pelos jornais Valor e “O Globo”.

Em nota, o advogado André Callegari, que defende o senador e o deputado, afirmou que “causa estranheza à defesa que medidas cautelares sejam decretadas em razão de fatos pretéritos que não guardam qualquer razão de contemporaneidade com o objeto da investigação”. A defesa sugeriu ainda que a operação foi uma retaliação ao fato de Bezerra manter uma postura crítica à Lava-Jato. “A única justificativa do pedido seria em razão da atuação política e combativa do senador contra determinados interesses dos órgãos de persecução penal.”