Título: O caro crédito do BNDES
Autor: Daniele Carvalho
Fonte: Jornal do Brasil, 05/10/2005, Economia & Negócios, p. A19

O empresariado não vem tendo o mesmo alívio que as pessoas físicas na hora de buscar empréstimos. Enquanto o consumidor foge dos juros altos no cheque especial recorrendo ao crédito consignado, as pessoas jurídicas não têm para onde fugir: a Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP), que corrige os financiamentos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, mais do que dobrou desde o fim do ano passado, em termos reais. Cálculos da economista Mônica Baer, da MB Associados, mostram que, em 2004, a TJLP era de 1,9%, descontada a inflação. Este ano, com o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA, referência oficial para as metas de inflação) em 5,1%, o percentual saltará para 4,4%.

Para chegar à taxa real, Mônica levou em conta a inflação do ano passado pelo IPCA, de 7,6%, e a TJLP no período ¿ de 10% no primeiro trimestre e de 9,75% nos demais.

O mesmo aumento também é verificado quando se aplica uma taxa de inflação anualizada. Como a TJLP é uma taxa anualizada, ou seja, determinada hoje para um horizonte de 12 meses, pode-se aplicar uma taxa de inflação compatível com o mesmo prazo. Com estes parâmetros, conforme o economista-chefe da Global Invest, Alex Agostini, o juro real passou de 3,98% em abril de 2004 para 4,81% em setembro de 2005.

Este é o principal motivo da irritação do presidente do BNDES, Guido Mantega, com a decisão do Conselho Monetário Nacional (CMN) de manter a TJLP em 9,75% ao ano, na semana passada. Desde abril de 2004, a taxa está congelada. Nos bastidores, Mantega não tem escondido sua contrariedade com a medida, num momento em que o banco luta para estimular a produção e reduzir gargalos de infra-estrutura. Em público, no entanto, evita os embates diretos.

¿ Confrontando os indicadores, temos uma taxa real mais elevada ¿ reconheceu, ao participar de encontro com líderes de associações de trabalhadores. Dias antes do anúncio do CMN, Mantega comentou que não via motivos para a TJLP não recuar, tendo em vista que a inflação e o risco país, indicadores observados para a elaboração da taxa, estão em queda.

¿ Não tenho dúvida de que, se a taxa tivesse recuado, a procura por crédito seria bem maior. Pior do que não reduzir a TJLP é não sinalizar a intenção de reduzir. Passa uma sensação de insegurança do governo em relação à inflação ¿ criticou Paulo Godoy, presidente da Associação Brasileira de Infra-estrutura e Indústria de Base (Abdib).

Segundo o executivo, muitos projetos estão à espera de condições de crédito mais atraentes para saírem do papel.

¿ Com indicadores tão positivos da economia, o momento era de incentivar o setor produtivo e não desmotivá-lo. Há uma falta de sintonia entre o CMN e o setor industrial ¿ afirmou.

Apesar da queda-de-braço, Mantega afirmou que está confiante no desembolso de R$ 50 bilhões em empréstimos este ano. Os números mostram, no entanto, que a tarefa é árdua: de janeiro a agosto, a instituição liberou apenas R$ 28,8 bilhões, de um orçamento total de R$ 60 bilhões. O presidente do BNDES lembrou, porém, que o quarto trimestre é um período em que tradicionalmente o volume de desembolso acelera.

¿ Temos grandes projetos próximos de serem aprovados, entre eles alguns de siderurgia, petroquímica e papel e celulose ¿ afirmou.