Valor Econômico, v. 20, n. 4842 21/09/2019. Política, p. A10

 

No STF, ala pró-Lava-Jato manifesta-se
 Mariana Muniz
 Renan Truffi 


A decisão do ministro Luís Roberto Barroso de autorizar operações de busca e apreensão contra o senador Fernando Bezerra (MDB-PE) e a inclusão na pauta da Segunda Turma pelo ministro Edson Fachin de uma ação penal que vai tratar do uso de dados sigilosos do Coaf - antecipando-se ao presidente da Corte, ministro Dias Toffoli - tem sido vista por interlocutores da Corte como uma reação da ala pró Lava-Jato ao que veem como tentativas de enfraquecer as operações.

Fontes ligadas ao Supremo apontam que o movimento de ministros para se contrapor às tentativas de blindar integrantes da classe política das investigações se tornou mais forte nos últimos dias, uma reação que deve se desenrolar em novos capítulos.

Na quinta-feira, Bezerra Coelho, que é líder do governo no Senado, foi alvo da Operação da Polícia Federal (PF), autorizada por Barroso, que investiga suposta irregularidade durante sua gestão como ministro da Integração Nacional, no governo de Dilma Rousseff (PT). O ministro do STF contrariou manifestação da então procuradora-geral da República, Raquel Dodge, que havia sido contra a diligência.

E justificou a medida dizendo que na “criminalidade organizada econômica [...], o natural é que todos os envolvidos tentem ocultar provas e não evitar deixar registros de seus atos. A medida cautelar serve justamente para tentar encontrar documentos mantidos sigilosamente, longe dos olhos do público e das autoridades de investigação.”

Em outro episódio da reação, na quarta-feira, Fachin - que é o relator da Lava-Jato no Supremo - decidiu pautar para a sessão de amanhã a discussão sobre a possibilidade de o Coaf enviar relatórios ao Ministério Público Federal (MPF) sem passar por um juiz. O recurso discute se “relatório de inteligência financeira” enviado pelo órgão ao MPF sem passar por um juiz pode instruir inquéritos e ações penais.

A questão sobre o uso de dados do Coaf está prevista para ser julgada pelo plenário do STF em 20 de novembro. Em 16 de julho, Toffoli suspendeu todos os inquéritos e processos instruídos com dados repassados pelo Coaf ao MPF sem autorização judicial. A decisão foi dada em um processo envolvendo o senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ).

O caso pautado por Fachin diz respeito a uma ação penal envolvendo o deputado Aníbal Gomes (MDB-CE) e seu assessor Luís Carlos Batista Sá por corrupção e lavagem de dinheiro.

O pedido de pauta foi interpretado como uma reação do ministro. Pela pauta de julgamentos, contudo, dificilmente o caso será de fato discutido. Também é na sessão de amanhã que o colegiado começa a analisar a ação penal envolvendo o ex-ministro Geddel Vieira Lima e seu irmão, o ex-deputado Lúcio Vieira Lima (MDB-BA), no caso do bunker de R$ 51 milhões descobertos em um apartamento em Salvador, em setembro de 2017.

Do lado do Senado, governistas estão em compasso de espera para saber se a operação da PF deve trazer a público fatos constrangedores contra Bezerra Coelho ou não. No meio do que pode ser um embate entre STF e Congresso, Bezerra pode não conseguir se sustentar na liderança do governo se mais detalhes dessa investigação vierem à tona e acabarem constrangendo o governo Jair Bolsonaro.

Outro fator que pode ser determinante para a saída de Bezerra da representação do governo na Casa é a construção de um novo alternativo ao dele para a função. Hoje, a avaliação é que não há nenhum senador governista com força suficiente para substituí-lo no Senado. Mas, senadores próximos a Bolsonaro não descartam que outro parlamentar possa se fortalecer, nos próximos dias, como forma de se capitalizar para o cargo.

Dentro do PSL, a ordem é manter distanciamento. Nos bastidores, os senadores do partido lembram que Bezerra Coelho foi uma escolha do ministro-chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni (DEM-RS), com quem o grupo não tem simpatia. “Onyx colocou o Bezerra, ele se vira pra resolver o problema que criou”, disse um interlocutor do partido.