Valor Econômico, v. 20, n. 4843 24/09/2019. Política, p. A6
 

Excludente de ilicitude deve ser retirado de texto de Moro
 Isadora Peron

 

Após a morte da menina Ágatha Vitória Sales Félix por policiais no Rio, o chamado excludente de ilicitude deve ser retirado do relatório final do pacote anticrime que está sendo discutido por um grupo de trabalho na Câmara dos Deputados.

Até a semana passada, havia um acordo entre a oposição e partidos do Centrão para encontrar uma redação alternativa para a proposta. A ideia era que o texto fosse menos abrangente, mas garantisse “segurança jurídica” aos policiais que matassem em serviço.

O impasse deve adiar a discussão do tema, prevista para hoje, e postergar ainda mais a conclusão dos trabalhos do grupo.

Desde sexta-feira, quando Ágatha foi baleada no Complexo do Alemão, parlamentares do PT, PCdoB e Psol passaram a afirmar que não seria possível aprovar a medida.

Ontem, o deputado Orlando Silva (PCdoB-SP) defendeu que não é preciso alterar o Código Penal, porque a atual legislação já dá garantias aos policiais. “Vamos defender a supressão desse texto”, disse ao Valor.

Já nomes como deputado Lafayette de Andrada (Republicanos-MG) afirmam que, com algumas modificações, é possível manter a ideia central do texto apresentado pelo ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro.

Até esse impasse, parlamentares da oposição e do Centrão vinham atuando em conjunto para modificar o pacote anticrime. As decisões levaram representantes do governo Jair Bolsonaro, como a deputada Carla Zambelli (PSL-SP), a abandonar a comissão.

O projeto apresentado pelo ministro fala que o juiz poderá reduzir a pena até a metade ou deixar de aplicá-la se um eventual excesso “decorrer de escusável medo, surpresa ou violenta emoção”.

Também classifica como “legítima defesa” a ação do policial que matar em serviço durante “conflito armado ou em risco iminente de conflito armado” ou quando houver vítimas mantidas reféns.

Relator do pacote anticrime, o deputado Capitão Augusto (PL-SP) classificou como “falácia” a ideia de que, se aprovada, a proposta vá beneficiar um policial como no caso de Ágatha. “Nós, falamos só da legítima defesa no caso de agressão iminente, como no caso de um policial atingir um marginal no momento em que ele estaria recarregando sua metralhadora ou fuzil”, disse.

Ontem, Moro também voltou a afirmar que o caso da menina não se enquadra na proposta. “A proposição que nós colocamos dentro do projeto anticrime diz respeito à legítima defesa, quando existe um cidadão ou um policial, num enfrentamento de um criminosa, e evidentemente não é o que ocorre em relação à criança”, afirmou após uma agenda em Goiânia.

“Respeitamos as opiniões contrárias, o que Parlamento decidir, evidentemente o Executivo respeita, mas o fato é que a situação não se aplica”, disse.

O ministro também afirmou que o governo nunca pretendeu, com a proposta, incentivar situações de confronto policial. “Confronto policial tem que ser evitado ao máximo. Agora, eventualmente, ele pode acontecer, e deve ser regulado.”