Valor Econômico, v. 20, n. 4844 25/09/2019. Política, p. A7
 

Senado reage ao STF e adia votação de reforma
 Renan Truffi
 Marcelo Ribeiro
 Raphael Di Cunto
 Luísa Martins
 Isadora Peron
 Mariana Muniz


 

Em uma reação contra o Supremo Tribunal Federal (STF), o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), e líderes partidários articularam ontem o adiamento da votação da reforma da Previdência e pressionaram pela suspensão da liminar que autorizou buscas e apreensões nos gabinetes do líder do governo na Casa, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), e de seu filho, o deputado federal Fernando Coelho Filho (DEM-PE).

Apesar de não ter nenhuma relação com as operações que atingiram os dois parlamentares e, por consequência, o Congresso, a Previdência foi sacrificada e teve a votação de seu relatório final adiada em uma semana como forma de simbolizar a contrariedade dos senadores com a postura da Corte e, especialmente, do ministro Luís Roberto Barroso, responsável por conceder, monocraticamente, a liminar que referendou as buscas. No mesmo horário em que o tema seria votado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, Alcolumbre e uma comitiva de 15 senadores, de sete partidos, resolveram ir até o Salão Nobre do Supremo para se manifestar contra a operação.

Na Corte, Alcolumbre disse ao presidente do STF, ministro Dias Toffoli, que o Senado sempre se mostrou solidário aos ataques sofridos pelo Judiciário em respeito à harmonia entre os Poderes, mas que a autorização de uma medida cautelar no gabinete de Bezerra fragiliza a boa relação entre as instituições. Além disso, o presidente do Senado explicou  à imprensa que o objetivo dos parlamentares era “reafirmar” a independência do Poder Legislativo.

“Essa visita que o Senado está fazendo ao Supremo Tribunal Federal é uma visita institucional em nome de um poder”, disse. “É um momento de reafirmação do Poder Legislativo”. A ação foi articulada na noite anterior, em jantar organizado pelo próprio Alcolumbre, com a presença de senadores de diversos partidos, como MDB, DEM, PSD, PP e PT, entre outras legendas.

A ideia era aproveitar a liminar contra o líder do para “restabelecer o poder” da Casa, defenderam senadores engajados nessa ofensiva. O senador pernambucano também participou do encontro, na residência oficial do Senado, e se mostrou “bastante abatido” pelo fato da operação da Polícia Federal ter atingido também seu filho.

Questionado pela imprensa, Alcolumbre rechaçou qualquer possibilidade de a retaliação acabar atrapalhando o calendário de aprovação da Previdência. Segundo ele, a proposta ainda será aprovada até a primeira quinzena de outubro. “Não há adiamento da reforma da Previdência. É engraçado que fica a informação ou a aparente informação de que uma reunião do Congresso Nacional, dos líderes partidários no STF, para restabelecer a harmonia e a independência entre os poderes, atrasa o calendário da reforma. Não sei quem está falando isso. Não atrasa o calendário da reforma, o calendário da votação em segundo turno sempre foi a primeira quinzena de outubro”, rebateu, demonstrando irritação.

Ainda assim, o movimento não recebeu o apoio de todos na Casa. A presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, Simone Tebet (MDB-MS), e até o relator da reforma, senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), foram pegos de surpresa pela ação e se mostraram constrangidos. Eles se posicionaram contra a ofensiva, mas acabaram sendo voto vencido. “Achávamos que deveríamos votar a reforma hoje, mas, contrariada, acatei acordo de líderes”, disse Tebet.

Agora, a reforma da Previdência será votada na CCJ apenas na terça-feira, dia 1º. Somente após isso, o texto poderá ser votado, em primeiro turno, no plenário, o que pode acontecer no mesmo dia ou na quarta-feira. A ideia é que, vencida essa etapa, a medida volte a ser apreciada, na semana seguinte, para, enfim, ser aprovada de forma definitiva, em segundo turno.

Alvo da operação, Fernando Bezerra Coelho procurou relacionar justamente a Previdência com as buscas autorizadas pelo Supremo. “Essa operação ocorre no momento em que o Senado avança com a agenda econômica e está na iminência de votar a Reforma da Previdência”, disse o emedebista, ao subir na tribuna, durante sessão do Congresso.

Ele defendeu também que a operação foi “política", além de “inconstitucional”, para impor “constrangimento” ao presidente Jair Bolsonaro. “Por qual motivo incluir o gabinete da liderança entre os locais da busca e apreensão, se não para impor ao governo do presidente Bolsonaro um constrangimento?”.

Na avaliação do senador, a operação foi “arbitrária”, “extemporânea” e “gravíssima”. “Não temo as investigações. Digo com veemência que jamais excedi os limites impostos pela lei e pela ética. Mas é estarrecedor o excesso, o abuso de uma decisão monocrática, tomada em completo desacordo com o Ministério Público Federal, titular da ação, e ainda mais quando exige medida tão invasiva ao direito individual do cidadão e fere a independência de um dos Poderes da República”, disse. Pouco tempo depois do movimento feito pelo Senado, a defesa de Bezerra Coelho entrou com pedido, junto ao próprio STF, para que seja devolvido todo o material apreendido pela Polícia Federal nas buscas.