Correio Braziliense, n. 21725, 09/09/2022. Política, p. 5

Ações querem punir 7 de Setembro bolsonarista

Victor Correia


Jair Bolsonaro (PL) tornou-se alvo de ações judiciais no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que o acusam de abuso de poder econômico e político por transformar a comemoração do Bicentenário da Independência em um evento pela reeleição à Presidência da República. A representação mais grave foi impetrada, ontem, pelo PDT, pedindo a inelegibilidade tanto de Bolsonaro quanto de seu vice, Walter Braga Netto. Já os partidos da coligação que apoia a candidatura de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) pediram que Bolsonaro seja multado e impedido de usar as imagens dos atos na campanha eleitoral — o União Brasil fez a mesma solicitação.

Especialistas e juristas, porém, divergem quanto ao mérito das acusações. Enquanto uns veem um discurso calculado do candidato à reeleição, no limite da legalidade, outros apontam casos claros de abuso.

A ação de investigação judicial eleitoral (Aije) enviada ao TSE pelo PDT tem como objetivo “apurar e reprimir” abuso de poder político, econômico e midiático. Bolsonaro usou entrevista na TV Brasil antes do desfile, em Brasília, para convocar apoiadores às manifestações. Depois da cerimônia, se dirigiu a um trio elétrico estacionado em frente ao Congresso e discursou aos manifestantes. No Rio de Janeiro, ele participou de motociata e fez novo discurso a apoiadores.

“O evento foi desvirtuado apenas para satisfazer aos interesses da campanha eleitoral dos investigados, sem ao menos voltar-se aos fins a que se destinava. Além do uso da estrutura (palanque, veiculação através da TV Brasil), que foi custeado com o erário, o primeiro investigado (Bolsonaro) cumprimentou pessoas, posou para fotos com aliados e, em discurso realizado em cima de um trio elétrico, conclamou apoiadores a votarem nele no primeiro turno”, acusa o PDT na representação.

A outra ação, assinada por Solidariedade, Rede, PSB e Avante, exige que Bolsonaro seja multado por ter feito comício em um evento de governo e proibido de usar as imagens captadas nos atos na campanha eleitoral. “O candidato à reeleição à Presidência da República se utilizou de um evento organizado, despendido, com todo o apoio da máquina pública, para realizar verdadeira propaganda eleitoral. Os atos de 7 de Setembro transformaram-se em verdadeiros comícios”, apontaram as legendas. PT e União Brasil devem mover ações semelhantes.

 

Divergências

Especialistas divergem sobre a ilegalidade da atuação do presidente nos atos. Para o especialista em direito eleitoral Acacio Miranda, o discurso em cima do trio elétrico foi calculado não só para evitar consequências legais, mas também como estratégica política. Para configurar abuso nas eleições, é preciso que o candidato ultrapasse as limitações financeiras impostas pela legislação (no caso do poder econômico), use prerrogativas de cargo público para obter vantagens (no político) ou os meios de comunicação oficiais para se promover.

“Agiu no limite da legalidade, mas dentro da lei. Diferentemente da postura anterior dele (em 2021), teve um respeito à Justiça Eleitoral. Acho que isso foi uma estratégia não só jurídica, mas política”, avalia.

Silvana Batini, professora da FGV Direito Rio e ex-procuradora regional eleitoral do Rio de Janeiro, aponta que não há tempo hábil para a apuração das ações antes do pleito. Ela vê o pedido de inelegibilidade como uma escalada da batalha judicial entre os partidos.

“Nunca vi uma ação do tipo ser julgada procedente. Geralmente para prefeitos, vereadores, sim, mas contra um presidente, nunca”, salientou.

Membros do Judiciário, porém, veem claro abuso de poder político por parte de Bolsonaro ao se apropriar de uma data nacional para se promover. Uma das teses é que os casos têm que ser julgados pela ótica do efeito sobre o eleitor, para não deixar que tecnicalidades — como sair da área do desfile para discursar em um trio elétrico a poucos metros — distorçam a ocorrência.