Título: Processo de paz sofre derrota
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Fonte: Jornal do Brasil, 08/10/2005, Internacional, p. A9
Os paramilitares colombianos suspenderam na quinta-feira a desmobilização para obrigar o governo de Álvaro Uribe a ''redefinir as regras do jogo'' das negociações de paz iniciadas em 2003. As Autodefesas Unidas da Colômbia (AUC) temem a extradição de seus líderes aos Estados Unidos e o avanço guerrilheiro em seus territórios.
O governo respondeu ontem que só se os paramilitares garantirem a seriedade nas negociações será possível evitar a extradição exigida por Washington, que deseja julgar alguns de seus membros por narcotráfico. Desde o início das conversas, 10 mil combatentes de direita entregaram as armas. O anúncio da suspensão do desarmamento é a mais grave crise nas negociações.
''As normas jurídicas e as decisões relacionadas ao processo de paz tornam-se estáveis à medida que há um cumprimento do que é oferecido, preenchendo as expectativas'', afirmou a presidência, em comunicado lido pelo porta-voz, Ricardo Galán.
As AUC suspenderam a entrega de armas, prevista anteriormente para desmobilizar 20 mil combatentes até o final do ano, alegando que o governo não cumpre suas promessas.
Os paramilitares criticaram a transferência para uma prisão de segurança máxima de um de seus chefes, Diego Murillo, de 43 anos, - também conhecido como Dom Berna -, a quem uma Corte de Nova York acusa de narcotráfico e envolvimento no assassinato de um deputado no Norte da Colômbia. Pressionado por Washington, Uribe ordenou a prisão de Murillo no dia 30 de setembro, retirando-o da zona de negociação, em Santa Fé de Ralito (Norte).
No entanto, para o chefe político das AUC, Ernesto Baéz, cujo nome verdadeiro é Ivan Duque, a garantia do governo de que não vai extraditar Murillo é insuficiente:
- É como condenar um homem à pena de morte, suspender a execução, mas lhe dizer que espere sentado na cadeira elétrica - afirmou a uma rádio local, ressaltando que a detenção prejudicaria a negociação. - Exigimos uma redefinição das regras do jogo - destacou na entrevista por telefone. Baéz encontra-se em um acampamento de paramilitares que se declaram em estado de alerta.
O líder político das AUC informou ainda que 116 paramilitares desmobilizados foram assassinados e que a guerrilha marxista das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) tomou o controle das áreas desocupadas pelas AUC.
- Estão retornando a Catatumbo (fronteira com a Venezuela), a Nariño (fronteira com Equador) e o Estado não garante a segurança dos camponeses nessas regiões - alertou.
Baéz ressaltou a falta de clareza em relação ao lugar para onde seriam transferidos os paramilitares condenados por crimes cometidos em 20 anos de luta contra as guerrilhas de esquerda, incluindo assassinatos de sindicalistas e políticos.
- Existe incerteza sobre nosso futuro legal. Necessitamos do respeito à dignidade humana. As prisões colombianas violam esse direito - afirmou o paramilitar.
Uma lei aprovada em junho, criticada por organismos internacionais e pela própria ONU, limita a oito anos a pena máxima aos membros de grupos armados que participem do processo de paz.
Para a coordenadora das negociações, Maria Ema Mejína, ex-ministra das Relações Exteriores, o governo e os paramilitares estão numa luta inútil:
- Fico surpresa que pretendam impor condições para as negociações, fixar um ultimato - afirmou Maria, para quem os paramilitares não romperam com o processo de paz.