Valor Econômico, v. 20, n. 4894 05/12/2019. Política, p. A14
Ressalva do STF pode favorecer Flávio Bolsonaro
Luísa Martins
O plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) concluiu ontem o julgamento que oficializa a dispensa de aval judicial para que a Unidade de Inteligência Financeira (UIF) e a Receita Federal repassem relatórios de inteligência ao MP. Porém, o Supremo fez uma ressalva: esse compartilhamento deve ser realizado “unicamente por meio de comunicações formais”.
A tese fixada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o compartilhamento de dados fiscais sigilosos com o Ministério Público (MP) pode dar margem para barrar mais uma vez as investigações contra o senador Flávio Bolsonaro (sem partido-RJ).
Esse trecho da tese é a brecha que pode beneficiar o filho mais velho do presidente Jair Bolsonaro - o MP do Rio de Janeiro teria requerido informações sigilosas ao antigo Coaf por e-mail, em dezembro do ano passado, de acordo com os autos de uma reclamação no STF que trata sobre o caso.
“O parquet estadual [o Estado] requereu diretamente ao Coaf, por e-mail, informações sigilosas. (...) Destaca-se, ainda, a presença, nos autos, de e-mail enviado pelo MPRJ, datado de 14.12.2018, em que o MPRJ solicitou ao Coaf, a partir do compartilhamento inicial do RIF 27.746, a ampliação das informações prestadas”, escreveu o ministro Gilmar Mendes em determinada ocasião.
Autor do voto que prevaleceu, o ministro Alexandre de Moraes afirmou a jornalistas que e-mails não podem ser considerados uma “comunicação formal”, embora isso não esteja explícito na tese final.
“Não pode ser e-mail, telefone, WhatsApp. Isso é para quem tem preguiça de fazer ofício.”
Em nota de esclarecimento, o Ministério Público do Rio de Janeiro disse que “sempre atuou dentro dos parâmetros oficiais e legais em todas as suas solicitações aos órgãos de inteligência, observando rigorosamente os protocolos”. No comunicado, o MPRJ afirma que, de acordo com os ministros do STF, o compartilhamento de dados só pode ser feito por “meios formais - sistemas e vias de cada órgão”.
O advogado Frederick Wassef, que representa o senador, não vai comentar o caso até a publicação do acórdão do julgamento. Não há prazo regimental no STF para que isso ocorra. Na semana passada, a Corte formou maioria para dispensar o aval judicial prévio ao repasse de informações ao MP por parte dos órgãos de controle. A decisão, contudo, só foi sacramentada ontem, quando o plenário decidiu que a UIF deveria compor o resultado final do julgamento.
Isso porque, na sessão anterior, alguns ministros entenderam ter havido uma ampliação indevida, já que o caso concreto em análise - sonegação de impostos por um posto de gasolina em Americana (SP) - tratava apenas sobre dados da Receita.
Porém, ao longo dos últimos dias, Moraes costurou com os colegas uma tese que chegasse “o mais próximo de um consenso”. O único a divergir foi o ministro Marco Aurélio Mello.
Favorável à autorização judicial, ele considerou que, como ficou vencido no mérito, seria incoerente se acolhesse a tese proposta.