Valor Econômico, v. 20, n. 4894 05/12/2019. Política, p. A17

 

Deputados avaliam mudar PEC sobre 2ª instância
 Raphael Di Cunto
 Marcelo Ribeiro
 Isadora Peron
 Vandson Lima
 Renan Truffi


 

A Câmara dos Deputados instalou ontem a comissão especial que analisará a proposta de emenda constitucional (PEC) para permitir a prisão após condenação na segunda instância do Poder Judiciário, com a promessa de votar o texto em plenário até março. Os senadores, entretanto, voltaram a pressionar e a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado deve votar na próxima semana projeto de lei para alterar o Código de Processo Penal (CPP) com esse mesmo objetivo.

Há, na Câmara, um movimento para que a PEC da prisão em segunda instância só passe a valer para os processos iniciados após a promulgação. Com isso, acreditam que o clima político ficaria mais favorável: o PT pararia de atacar a proposta, já que não levaria mais à prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e os parlamentares que respondem a acusações de irregularidades ficariam mais tranquilos.

Além disso, diminuiria a pressão de empresas e governos, que também serão afetados. A PEC transforma os recursos ao Supremo Tribunal Federal (STF) e Superior Tribunal de Justiça (STJ) em novas ações (revisionais). Sem o caráter de recurso, a execução da decisão dos tribunais regionais não ocorrerá apenas nas questões criminais, mas para todo o Judiciário, de processos trabalhistas a tributários.

Por outro lado, um deputado que participa das negociações admite que haverá pressão contrária do Novo, do PSL e de movimentos que veem na PEC a possibilidade de mandar Lula e outros condenados na operação Lava-Jato de volta para a prisão.

Os deputados discutem ainda alterações no texto. O deputado Fabio Trad (PSD-MS) foi escolhido relator da PEC e defendeu que é preciso acabar com a sensação da impunidade, mas também é preciso avaliar situações como a de alguém inocentado na primeira instância e condenado pelo tribunal regional. “Vamos desrespeitar o princípio da dupla jurisdição?”, questionou. 

Enquanto os deputados discutem os termos da PEC, os senadores voltaram a pressionar para votar um projeto próprio. Há duas semanas, houve um acordo para priorizar a proposta da Câmara, mas ontem 43 senadores entregaram um manifesto durante audiência pública com o ministro da Justiça, Sergio Moro, e a presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, Simone Tebet (MDB-MS), pautou o projeto para a próxima semana.

Para o deputado Marcelo Ramos (PL-AM), eleito presidente da comissão da Câmara, o projeto do Senado é uma “demagogia” e “tecnicamente equivocado” porque será derrubado depois pelo STF. O texto permite a prisão se os recursos ao STF e STJ forem “meramente protelatórios”. “Todo recurso admitido pelos tribunais superiores é plausível, não é protelatório. Então não terá efeito nenhum”, disse.

Já os senadores acusam os deputados de tentarem empurrar a votação para o ano que vem, com a intenção de diminuir a pressão popular sobre o Congresso e acabar mantendo a atual jurisprudência do STF, que exige o trânsito em julgado (fim de todos os recursos) para a execução da pena de prisão. Simone disse que tem obrigação de pautar o projeto, já que é demanda da maioria do Senado, mas não deixou de criticar a falta de um calendário por parte do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ).

O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), contudo, disse que 95% dos líderes participaram do acordo e que defenderá o procedimento estabelecido, inclusive com uma comissão de senadores para acompanhar as discussões na Câmara. “Minha preocupação é que havia um entendimento. Estou com a constituição da comissão de acompanhamento da PEC pronta para publicar. Considero a legitimidade de pautar, mas estou ainda na tese do que foi conciliado. Vou tentar ouvir mais os senadores, mas quero ficar com a tese da minha reunião”, disse.

Maia evitou comentar as negociações no Senado, mas disse que a PEC é a única capaz de garantir segurança jurídica e prometeu votar a proposta em fevereiro ou “no máximo março”. Trad disse que fará seu parecer no prazo mínimo regimental, de 11 sessões de plenário (cerca de três semanas), mas que pode se alongar. “Mas não posso prever se o andamento dos debates não exigirá mais audiências públicas”, disse.