Valor Econômico, v. 20, n. 4895, 06/12/2019. Política, p. A12
 

Moro tenta reverter mudanças no Senado
 Isadora Peron
 Renan Truffi
 Vandson Lima 


 

Depois da Câmara dos Deputados aprovar o pacote anticrime com grandes modificações, o ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, afirmou ontem que vai tentar um acordo para alterar o texto no Senado. Um dos pontos que preocupa o ex-juiz da Lava-Jato, segundo apurou o Valor, são as restrições às prisões preventivas.

O instrumento tem sido uma das medidas cautelares mais usadas pelas operações de combate à corrupção, como a que investiga os desvios na Petrobras. Alguns réus estão presos há anos por pedidos de prisão preventiva, como o ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (MDB-RJ), encarcerado desde outubro de 2016.

O texto aprovado pela Câmara prevê que a medida tem de ser fundamentada pelo juiz, e traz uma lista de situações que não serão consideradas como fundamento. O magistrado também terá que revisar a necessidade de manter a prisão a cada 90 dias. Se passar o prazo, a permanência na cadeia será considerada ilegal.

Outro tema que Moro acredita que pode ser retomado pelos senadores é o chamado “plea bargain”, um acordo entre acusação e defesa para encerrar o processo em troca de redução de pena. “Vejo plenas condições de retomar esse instrumento em algum outro momento. Não existe, a meu ver, uma resistência absoluta a esse tipo de medida”, disse o ministro.

Ele também afirmou que vai tentar negociar a volta da redação original do em relação ao Banco Nacional de Perfis Genéticos, que previa o recolhimento de material para todos que cometessem crimes dolosos.

O pacote anticrime aprovado pelos deputados deixou de fora os principais pontos do texto de Moro, como a prisão após condenação em segunda instância e o chamado excludente de ilicitude para policiais - uma promessa de campanha do presidente Jair Bolsonaro.

Apesar dos reveses, Moro fez questão de ressaltar que não vê a aprovação do texto como uma derrota política e que o projeto traz avanços em relação à legislação atual. “Houve várias inovações importantes. Parte delas não foi aprovada, isso faz parte do debate democrático, do Congresso”, disse Moro.

 

De acordo com o ministro, há uma série de pontos que foram aprovados pela Câmara que são “extremamente relevantes” e que “eram almejados faz muito tempo”. “Se foi aprovado com a redação original ou com uma redação diferente, não tem nenhum problema, o importante é que essas medidas foram aprovadas.”

Ele destacou, por exemplo, o fato de o texto ter incluído a proposta de cumprimento imediato da pena após condenação do Tribunal do Júri. “Colocaram lá um parâmetro de pena de 15 anos, mas é um avanço em relação à situação atual. Isso vai permitir que condenados por homicídios e feminicídios sejam enviados mais cedo para cadeia”, disse.

No Senado, a presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), Simone Tebet (MDB-MS), vai tentar atrelar a aprovação do pacote anticrime com o projeto de lei que trata da prisão em segunda instância, pautado para votação no colegiado, mas que enfrenta resistência do presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), e de parte dos líderes partidários.

Como Alcolumbre tem insistido que o Senado deve aguardar a PEC da segunda instância ser aprovada na Câmara dos Deputados, Simone sinalizou que o chamado grupo "Muda Senado" poderia facilitar a tramitação da versão do pacote anticrime enviado pela Câmara, apesar do texto ter sido alterado em seus pontos principais. Como compensação, o colegiado  também colocaria em apreciação a prisão em segunda instância. A oferta contraria, a princípio, o acordo feito por líderes da Câmara e Senado há alguns dias. Na ocasião, ficou estabelecido que o Congresso iria dar prioridade para a PEC do deputado Alex Manente (Cidadania-SP).