Título: Estudo permitiu a cura da úlcera
Autor: Claudia Bojunga
Fonte: Jornal do Brasil, 04/10/2005, Saúde & Ciência, p. A12

Ganharam o prêmio Nobel de Medicina e Fisiologia de 2005, os pesquisadores australianos Barry J. Marshall e J. Robin Warren, que identificaram a bactéria causadora da gastrite e úlcera. Por causa da descoberta, é possível hoje tratar esses males com antibióticos.

- Antes, as doenças do estômago eram relacionadas apenas com hábitos alimentares e problemas emocionais - explica ao JB Luiz Gonzaga Vaz Coelho, presidente da Federação Brasileira de Gastroenterologia. - Sem dúvida, foi uma revolução.

A comprovação da existência da bactéria chamada Helicobacter pylori é considerada um dos episódios científicos mais importantes dos últimos 25 anos.

- Tem um aforisma antigo sobre úlcera ( que é como uma ferida no estômago) que diz: ''uma vez ulceroso, sempre ulceroso''. Agora, com a possibilidade de eliminação da bactéria esta nunca mais volta.

- Para as pessoas que tinham um quadro grave, era comum terem de passar por cirurgia para tirar um pedaço do estômago - afirma Alexandre Abrão, chefe do setor de Gastroenterologia e Endoscopia Digestiva do Hospital Universitário Pedro Ernesto.

Em relação à gastrite - inflamação da mucosa do estômago - a bactéria é uma das causas, mas não a única. A Helicobacter pylori também é considerada fator de predisposição a câncer gástrico.

Cerca de dois terços da população mundial têm a bactéria, mas nem todas essas pessoas apresentam sintomas.

A pesquisa foi realizada em 1982, mas só agora os australianos foram laureados. Vão dividir o prêmio de US$ 1,29 milhão.

- Tudo em medicina é desta forma. É necessário realizar muitos trabalhos para se ter certeza da relação de causa e efeito - explica Abrão.

Warren, de 68 anos, foi o primeiro a observar que os sinais de inflamação estavam sempre presentes na mucosa gástrica atacada pela bactéria. Marshall, de 54, se interessou e resolveu participar do estudo sistemático realizado em uma centena de biópsias. Depois, testaram a existência da bactéria através de uma cultura feita em laboratório.

Apesar do atual reconhecimento, na época em que apresentaram os resultados foi bem diferente. As conclusões foram recebidas com ceticismo pela comunidade científica.

- Não se acreditava que podia haver bactérias em um meio ácido, que normalmente esteriliza as possibilidades de organismos vivos, como o estômago - confirma Coelho, que também é professor de Gastroenterologia da Universidade Federal de Minas Gerais.

O descrédito foi tanto, que Marshall resolveu beber o caldo de bactéria para provar que esta tinha relação com males no organismo.

- Pensei durante quatro semanas até fazer isso. Por sorte, só desenvolvi um infecção temporária - conta o médico.

Começou a ter dor de estômago e enjôo. Submetido a uma endoscopia, ficou constatada a presença da Helicobacter pylori em torno da inflamação.

Atualmente, os dois pesquisadores fazem experiências com ratos para descobrir os mecanismos da inflamação e sua eventual transformação em tumor.

Quando receberam a notícia de que haviam ganhado o prêmio Nobel, estavam juntos em um restaurante e contaram ter ficado muito surpresos.