Valor Econômico, v.20, n. 4869, 30/10/2019. Política p.A7

 

Partidos em fase de formalização já chegam a 76


Bolsonaro colocou criação de nova sigla como alternativa para viabilizar uma saída do PSL


Por Andrea Jubé e Luísa Martins 

O presidente Jair Bolsonaro afirmou que a saída para o impasse com o PSL pode ser um “novo partido”, sem adiantar se estaria disposto a articular a criação de uma nova legenda. Pelo menos 76 partidos políticos informaram ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que deram início ao processo de formalização eleitoral: a Unidade Popular (UP) e o Partido Nacional Corinthiano (PNC) podem ser constituídos ainda neste ano. O ex-ministro do TSE e advogado de Bolsonaro, Admar Gonzaga, disse ao Valor que, se for esse o desejo do presidente, vai ajudá-lo a constituir um novo partido. Ele confirmou que a possibilidade é analisada. Gonzaga foi o especialista em Direito Eleitoral que auxiliou o então prefeito de São Paulo Gilberto Kassab a criar o PSD em tempo recorde.

A constituição de um partido leva em média dois anos entre o registro no cartório civil e a coleta das 491,9 mil assinaturas, distribuídas em pelo menos um terço dos Estados. A reforma eleitoral de 2017 acrescentou uma nova exigência: que os subscritores não sejam filiados a outras legendas. Mas juristas experientes na área eleitoral afirmam que a força política de Bolsonaro permitiria que ele abreviasse esse prazo.

Em 2011, Kassab, com a ajuda de Gonzaga, registrou o ato de fundação, o estatuto e o programa do PSD em cartório em maio. Em setembro daquele ano o plenário do TSE chancelou a criação do partido em tempo hábil para que os filiados disputassem o pleito de 2012.

A proeza de Kassab foi um ponto fora da curva: o Rede Sustentabilidade de Marina Silva, por exemplo, demorou mais de dois anos para obter o registro eleitoral - embora essa contabilidade contemple os percalços das eleições de 2014, em que ela concorreu pelo PSB. O processo do Rede começou em fevereiro de 2013, mas sem a validação das assinaturas necessárias, estendeu-se até setembro de 2015.

“Com o grau de apoio que o presidente tem da população, com uma grande mobilização dos eleitores, é possível criar o partido em menos de dois anos”, a tempo de que os filiados concorram no pleito municipal de 2020, diz Gonzaga.

Ele acredita que em duas semanas Bolsonaro conseguiria alcançar as quase 500 mil assinaturas necessárias. O problema seria a logística da Justiça Eleitoral, porque os cartórios eleitorais têm de validar as assinaturas dos apoiadores. Mas como essa não é a única atividade, eles acabam sobrecarregados, retardando os processos. “Acaba sendo uma demanda muito pesada para eles”, observou.

Haveria, segundo adversários políticos, chances de Bolsonaro ser responsabilizado por utilizar a máquina administrativa para interesses partidários. Bastaria a articulação, por exemplo, com alguns de seus ministros que ainda não são filiados a nenhuma sigla.

Existem hoje 32 partidos em atividade no Brasil. Também ex-ministro da Corte, o advogado Marcelo Ribeiro concorda que um “grande poder de arregimentação popular” abrevia o prazo de criação de uma nova legenda. Ele lamenta, entretanto, a quantidade de siglas em funcionamento. “Esse excesso de partidos dificulta as ações do governo, que tem de negociar com um monte de gente”, criticou. “Seria mais racional ter partidos maiores, que fizessem luta política interna.”

Na hipótese de buscar uma legenda em atividade, Bolsonaro foi desaconselhado a procurar o Patriota, com quem flertou antes de entrar no PSL. Um aliado recomendou que o presidente buscasse o Partido Militar Brasileiro (PMBR), um dos 76 que comunicou registro em cartório ao TSE.

Mas o partido com a bandeira da segurança pública, e que representaria os milhares de policiais militares de todo o país, está longe da meta de apoiamentos: em São Paulo, onde obteve o maior número de assinaturas, alcançou 16 mil subscrições. Além disso, o prazo para alcançar as assinaturas a partir do registro em cartório, feito em 2012, estaria esgotado.

Dos 76 partidos que comunicaram ao TSE o registro da ata de fundação e estatuto em cartório, mas que ainda recolhem as assinaturas necessárias, muitos reeditam os nomes de siglas já extintas, como Arena e Prona. Outros partidos adotam nomes singulares, como Iguais, Animais, Liberdade, Piratas, Partido das Sete Causas e Partido dos Conservadores.

O partido que está com o processo mais avançado é a Unidade Popular (UP), que começou a tramitar no TSE no fim de julho. O presidente do diretório nacional é o mineiro Leonardo Roque, coordenador nacional do Movimento de Luta nos Bairros.

No último dia 24, o relator do processo, ministro Jorge Mussi, deferiu o registro do estatuto e do diretório nacional da UP. Mas determinou ajustes em dispositivos do estatuto relativos ao prazo dos mandatos dos dirigentes das comissões provisórias e à destinação dos recursos do fundo partidário em caso de extinção da legenda.

O ministro Tarcísio Vieira pediu vista do processo. A Unidade Popular obteve 497,6 mil assinaturas de eleitores não filiados a outros partidos - pelo menos seis mil a mais que o mínimo exigido.

Outra sigla em formação com processo mais adiantado no TSE é o Partido Nacional Corinthiano - que, apesar do nome, não tem ligação institucional com o time de futebol. O pedido de registro do estatuto, também relatado pelo ministro Jorge Mussi, começou a tramitar há 14 meses e a sigla gostaria de lançar vereadores para concorrer já no ano que vem.

Neste caso, entretanto, o Ministério Público Eleitoral questionou as certidões consolidadas pelos tribunais regionais eleitorais, que não especificaram quantos apoiamentos foram obtidos no prazo legal de dois anos, contados a partir do registro da sigla em cartório. Para o procurador eleitoral, pode haver apoiamentos obtidos fora do prazo legal.

Na sequência vem o Partido da Evolução Democrática (PED), cujo processo começou a tramitar no TSE há um ano. O relator é o ministro Luís Roberto Barroso. No caso, a Procuradoria-Geral Eleitoral manifestou-se pela rejeição do pedido pela não comprovação dos apoiamentos necessários no prazo de dois anos.

O quarto processo em andamento no TSE trata da criação do Partido Nacional Social Democrático Cristão (PNSDC). O pleito começou a tramitar em agosto. O relator do caso também é o ministro Jorge Mussi.