Valor Econômico, v.20, n. 4869, 30/10/2019. Opinião p.A12

 

Ambiente de negócios do país piora, aponta Banco Mundial


Reforma tributária deve atacar o ponto mais frágil do Brasil no ‘Doing Business’

Na semana em que o presidente Jair Bolsonaro disse em Tóquio que o Brasil precisava desburocratizar, desregulamentar, abrir o mercado e privatizar muito para que a economia decolasse, o Banco Mundial divulgou informações sobre o país que vão na direção contrária. Em seu ranking “Doing Business”, que retrata o ambiente de negócios, o Banco Mundial mostrou que o Brasil perdeu postos.

O Brasil ficou no 124º lugar no “Doing Business” deste ano, oito posições abaixo do 116º posto do levantamento anterior, em um universo de 190 países analisados. O Banco Mundial também fez uma ampla revisão das notas de 2018. A nota do Brasil até melhorou, de 58,6 para 59,1. Mas outros países avançaram mais e passaram à frente porque estão fazendo reformas mais rapidamente. Uganda e Egito são alguns deles.

A China foi um dos países que mais avançou no ranking deste ano (da 44ª posição para a 31ª), depois de ter feito reformas modernizantes em oito das dez áreas analisadas pelo Banco Mundial. A Índia também foi destacada, com melhorias em quatro indicadores, que levaram o país a avançar do 75º para o 63º lugar. Os cinco primeiros do ranking são Nova Zelândia, Cingapura, Hong Kong, Coreia do Sul e Dinamarca. EUA vêm em sexto lugar.

O novo relatório revela que 115 países realizaram 294 reformas regulatórias no período analisado, de junho de 2018 a maio de 2019. Já o Brasil mostrou melhoria em três dos dez critérios - registro de propriedades, abertura de empresas e solução de insolvências. O país ficou estável em relação à proteção de acionistas minoritários, comércio internacional, acesso ao crédito, respeito aos contratos, obtenção de instalação elétrica e pagamento de impostos. Houve piora no processo de obtenção de alvará de construção.

O governo atribui esse desempenho sofrível às gestões anteriores, que promoveram a “devastação no ambiente de negócios nos últimos anos”. Mas mantém a promessa feita por Bolsonaro no início do ano, no Fórum Econômico Mundial, de levar o país para o grupo dos 50 primeiros colocados no ranking, até o fim de seu governo, em 2022. Cumprir o prometido não será fácil.

O critério em que o Brasil está pior colocado é no pagamento de impostos, 184º lugar. O empresário brasileiro gasta 1.501 horas por ano para pagar impostos, o que equivale a 62,5 dias, ou pouco mais de dois meses. O cálculo leva em conta o tempo empregado na preparação da declaração e pagamento do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ), dos impostos sobre vendas e circulação de bens e serviços, de tributos sobre salários e contribuições sociais. A situação já foi ainda pior. No relatório de 2014, o primeiro em que esse indicador foi calculado, o tempo gasto nessas atividades no Brasil chegava a 2.600 horas. No grupo América Latina e Caribe, o tempo médio destinado para o pagamento dos tributos é de 317 horas por ano; e nos países da OCDE fica em 158,8 horas.

No tempo gasto para a abertura de uma empresa as comparações também são dramáticas. Enquanto se leva um dia na Nova Zelândia e 9,2 dias em média nos países da OCDE, são 13,5 dias em São Paulo e 21,5 dias no Rio, o que coloca o país no 120º lugar nesse critério. É mais fácil abrir um negócio em países como Síria, Bangladesh, Quênia, Peru, Nigéria e Camarões, constata o estudo.

O governo tem razão ao alegar que o Banco Mundial ainda não capturou melhorias como a diminuição da taxa básica de juros, a Lei da Liberdade Econômica, a aprovação do cadastro positivo e a reforma da Previdência. Outros aperfeiçoamentos estão em gestação, como a revisão da lei de recuperação judicial e falências. O prazo médio de recuperação ou falência está em quatro anos em comparação com menos de três anos na América Latina. Haverá também marco legal específico para a recuperação de micro e pequenas empresas, chamado de “reempreendedorismo”.

Impacto mais significativo, no entanto, deve ter a reforma tributária, que deve atacar exatamente o ponto mais frágil do Brasil entre os dez critérios analisados pelo Banco Mundial. A expectativa é que ela estimule o crescimento, reduza os custos das empresas, racionalize a produção e promova a competitividade, acabando com a insegurança jurídica. Não se sabe, porém, qual é o projeto do governo. Depois do embate com o presidente por conta da proposta do imposto único, a equipe econômica passou a evitar se expor a respeito do assunto. As mudanças possivelmente virão em etapas e a primeira pode ser a simplificação do PIS/Cofins, o que deve diluir o efeito positivo.