Título: Uma muralha no meio do caminho
Autor: William Pesek Jr.
Fonte: Jornal do Brasil, 09/10/2005, Economia & Negócios, p. A23

Para um dirigente que procura aquecer a economia e reduzir a dependência de seu país com relação aos Estados Unidos, este parecia o caminho óbvio a seguir: ligar seu destino ao da China. Foi o que fez o presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva. Em novembro do ano passado, quando o presidente da China, Hu Jintao, visitou a maior economia da América do Sul, Lula concordou em reconhecer a China como ''economia de mercado'' segundo as normas da Organização Mundial de Comércio (OMC).

O objetivo dessa iniciativa, que diverge da posição da maioria dos outros principais países do mundo, era claro. Lula e Jintao disseram que previam duplicar o comércio bilateral para US$ 20 bilhões no período de três anos. Para o Brasil, esses negócios representariam uma dádiva dos céus. Para a China, ser qualificada como uma economia de mercado representa pagar menores tarifas para exportar seus produtos.

Agora, Lula deve explicações ao enorme contingente de pessoas que se perguntam se ele não teria cedido demais e com excessiva rapidez. Especialistas se perguntam como o Brasil desguarneceu seus flancos para uma superpotência em ascensão pouco disposta a fazer o mesmo.

- A abertura da economia brasileira não pode repousar apenas em franquear o ingresso das importações de todos os países sem obter nada em troca - diz Josué Gomes da Silva, presidente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (ABIT). - Corremos o risco de ser inundados com produtos importados, num momento em que nós, na posição de produtores, não estamos preparados para concorrer com os artigos de baixo custo da China.

Há um certo exagero nessa opinião. Mesmo que a China não esteja investindo nas ferrovias, portos e usinas siderúrgicas brasileiras com a rapidez esperada, ela é um consumidor em expansão. As necessidades da China por recursos naturais e bens manufaturados podem ser uma bênção para um país dado a surtos de crescimento seguidos por depressões, como o Brasil. Além disso, a história mostra que um país não se empobrece com o enriquecimento de outro.

Nunca uma economia tão subdesenvolvida como a chinesa, com uma população tão grande e uma expansão recorde tão temerária ingressou na comunidade mundial com tanta prontidão. Isso explica por que os dirigentes empresariais encaram a China com um misto de empolgação e apreensão.

Para eles, o Brasil foi possivelmente rápido demais em qualificar a China como uma economia de mercado, uma iniciativa que dificulta a imposição de sanções antidumping contra seus produtos. Talvez o mais grave sejam as barreiras invisíveis ao fluxo de produtos para a China, que ainda não aderiu ao livre comércio, ao capitalismo ou às normas de propriedade intelectual.