Título: ¿PMDB sonha com o Planalto¿
Autor: Daniel Pereira, Paulo de Tarso Lyra e Sérgio Prado
Fonte: Jornal do Brasil, 10/10/2005, País, p. A4

Apesar de cobiçado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva como parceiro preferencial na campanha pela reeleição, o PMDB terá candidatura própria ao Planalto em 2006. Quem garante é o líder do partido no Senado, Ney Suassuna (PB). A decisão, diz o senador, não decorre do enfraquecimento do governo em razão da crise política. ¿ Um partido existe para ter poder. O PMDB cansou de ser só coadjuvante ¿ afirma.

Suassuna elogia a atuação do governo, mas faz restrições ao relacionamento com os parlamentares.

¿ O governo não tem acertado na relação com o Congresso e tem pago caro por isso ¿ declara.

Para superar a turbulência política, ele sugere que o Planalto trabalhe pelo desfecho o mais rápido possível dos processos de cassação. Defende punição aos envolvidos como forma de dar um exemplo ao país e diz que não acredita na absolvição do deputado José Dirceu. Em entrevista ao Jornal do Brasil, Suassuna reconhece que a reforma política não anda porque os políticos priorizam seus interesses particulares.

- Por que o PMDB apoiou Aldo Rebelo, e não Michel Temer, na sucessão da Câmara?

- No início, não desejávamos apoiar o Aldo. Houve uma reunião na casa do Renan Calheiros na qual foi acertado que seria o Temer. O Renan fez contato com o presidente Lula, que não vetou. A única ponderação que o Lula fez era a de que não dava para ser presidente da Câmara e do partido ao mesmo tempo. Enquanto isso, Temer correu para buscar o apoio do PSDB e do PFL. Como não teve sucesso na aliança, não insistimos com ele. Havia um sentimento antigoverno, mas que não era favorável ao Temer.

- Na presidência da Câmara, Temer não ganharia força para trabalhar pela candidatura própria, que impediria uma aliança com o PT em 2006?

- É irreversível a candidatura própria do PMDB à presidência. Ninguém dentro do PMDB pode frear essa decisão.

- E a versão segundo a qual Renan trabalharia para ser vice na chapa do presidente Lula?

- O Renan jamais manobrou ou verbalizou essa opção em reuniões da cúpula do partido ou do nosso grupo.

- E se o presidente Lula oferecer o posto ao PMDB?

- Teremos candidatura própria. O acordo com Lula foi nesses moldes desde o início. Agora, daremos governabilidade até o último dia do governo.

- Nas últimas eleições, o PMDB foi coadjuvante na disputa presidencial. A perspectiva de vitória mudou o ânimo do partido?

- Um partido existe para ter poder. O PMDB cansou de ser só coadjuvante. As regionais estaduais clamam por independência no primeiro turno, para poder ajudar os seus candidatos a senador e a governador.

- Qual o favorito para concorrer à presidência pelo PMDB?

- O candidato que se movimenta com maior rapidez é Anthony Garotinho. É extremamente determinado e, num partido pequeno, já teve um número considerável de votos. E ainda está em vantagem porque já está percorrendo o país.

- Mas o grupo do qual o senhor faz parte tem restrições à candidatura de Garotinho.

- Não é restrição. Os governadores do partido não estão fazendo campanha para Garotinho, o que tem levado muita gente a dizer que ele não tem a preferência dos governadores. Mas o PMDB ainda está se definindo. Não há partido político que tenha tantos e bons candidatos como o PMDB. Temos o Sarney, os governadores do Rio Grande do Sul e de Pernambuco, o presidente do Supremo, Nelson Jobim, e o ex-presidente Itamar Franco.

- A oposição diz que o presidente Lula é um candidato derrotado em 2006.

- Se estivesse na oposição, faria o mesmo discurso. Mas isso não pode ser levado como verdadeiro, porque apesar de todo o desgaste das CPIs, Lula continua com um número de eleitores enorme. E se a economia continuar subindo e a crise declinando, Lula volta a crescer.

- Qual a sua avaliação sobre o desempenho do governo?

- Na comparação com os governos anteriores, o atual está bem colocado. Na economia, vai muito bem. Faço restrições à tomada de decisões.

- E a relação com o Congresso Nacional?

- Não tem acertado na relação com o Congresso e tem pago caro por isso.

- O que está errado? São compromissos não cumpridos, como liberação de verbas?

- É isso. Mesmo nos estados, o governo demora a agir, porque o PT é um partido dividido em grupos. Você dá a ordem aqui, mas a tendência de lá não cumpre o que o presidente disse.

- O senhor elogia a economia, mas os investimentos em infra-estrutura estão parados.

- Com os juros atuais, quem investirá, se pode auferir lucro sem fazer nada, aplicando em títulos do governo? Há investimento quando se tem certeza do lucro, expectativa de continuidade de um quadro favorável. Temos eleições em 2006 e CPIs pra cima e pra baixo. É difícil investir.

- Houve o tal choque de gestão anunciado pelo governo?

- O governo perdeu muito tempo na briga política, que gasta energia e não produz os resultados que o público espera. Espero que isso mude.

- Foi isso que enterrou as reformas política e eleitoral?

- Foi isso que dificultou as reformas. Vou dar um exemplo. No meu estado, a manutenção da verticalização não é ruim, pelo menos para o meu grupo. Chego no Congresso, e o meu partido diz que tem de derrubar a verticalização. É um negócio complicado.

- Tem de haver desfecho o mais rápido possível dos processos para que a crise acabe?

- Tem. Agora, não se pode tirar o direito de defesa do cidadão. Cabe ao Conselho de Ética desburocratizar, mas sem cercear. Senão, o parlamentar é cassado, recorre à Justiça e ganha o mandato de volta.

- Houve cerceamento?

- Não. Mas tem de criar fóruns para ouvir testemunhas. Se a crise perdura, o governo enfraquece. Se a crise acaba, o governo tem chance de se recuperar. Cabe ao governo ajudar com as suas forças para que isso aconteça logo.

- É necessário haver punições?

- Não há dúvida. Se não houver punição, daremos um péssimo exemplo para o país.

- É casuísmo mudar a Constituição a fim de dar tempo para a votação das reformas?

- A gente está querendo mudar exatamente para inibir os fatos que acabamos de descobrir, que são geradores de caixa dois.

- A classe política só descobriu o caixa dois agora?

- Sempre existiu, mas agora se desnudou. A sociedade já não aceita isso. Precisamos aprovar as modificações para inibir a existência do caixa dois.

- Há caixa dois ou pagamento de mesada mesmo?

- Isso é um assunto da Câmara. Não chegou ao Senado.

- Mas a CPI é mista e há denúncia contra o senador Eduardo Azeredo (MG), presidente do PSDB.

- Cumprimos a nossa obrigação ao recomendar a abertura de processo contra deputados. Pode aparecer mais algum? Pode. As CPIs exauriram? Não sabemos. O combustível parece que está acabando.

- A oposição acusa o governo de tentar assar uma pizza.

- Ministros e diretores de empresas como Correios, Furnas e IRB já caíram. Três parlamentares renunciaram. Há 16 deputados com cabeça à prêmio. E ainda não terminou. Então, a pizza nunca acontecerá.

- As CPIs conseguirão identificar a origem dos recursos ilícitos? Quais são as suspeitas?

- Espero que sim. O dinheiro veio de vários cantos. Há alguma coisa do exterior, não resta dúvida, e alguma coisa que saiu daqui, foi pra lá e está voltando.

- Saiu de onde?

- Não sei. Há dinheiro doado por empresários. Há dinheiro de empréstimo, embora seja uma coisa difícil de a gente acreditar. No mundo empresarial, todo mundo sabe que os bancos não emprestam se você não tiver uma garantia real.

- O deputado José Dirceu será cassado?

- A situação do Dirceu é difícil. Ele é unanimidade em todas as linhas de acusação. Provas não existem, mas os indícios são tantos e tem tanta gente com mágoa, querendo ir à forra, que dificilmente Dirceu conseguirá escapar. Além disso, ele foi de uma infelicidade sem tamanho ao dizer que ''a cada dia me convenço mais da minha inocência''.

- O que o senhor achou da polêmica criada pelo bispo de Barra (BA), Luís Flávio Cappio?

- Ele nunca foi ao interior da Paraíba para ver o cidadão sentado na porta da casa, com os filhos, chorando por falta de comida e de água, porque a única coisa que sabe fazer é plantar. Como plantar se está tudo seco? Esse bispo nunca passou por essa experiência e faz greve de fome. Deveria ter feito greve de sede. Aí, se igualava aos que estão morrendo lá no meu estado.

- O projeto deve ser suspenso?

- De maneira nenhuma, pois daqui a pouco surgirá um empresário dizendo que está em greve de fome porque não quer mais pagar imposto. Vão suspender os impostos no país?