Título: Balakot: área de devastação
Autor:
Fonte: Jornal do Brasil, 10/10/2005, Internacional, p. A8

Cavando com pás, picaretas e até com as próprias mãos, pais passaram o domingo tentando tirar 850 crianças dos escombros de duas escolas na vila de Balakot, atingida pelo forte terremoto que sacudiu o Norte do Paquistão no sábado de manhã. Soterradas, algumas crianças ainda tinham forças para gritar. Para os pais, a angústia era profunda.

- Me salvem. Chamem minha mãe, meu pai - repetia, sem parar, um menino, com um tom de voz denunciando que estava prestes a desmaiar.

Na escola em que estudava, outras 200 crianças foram soterradas.

- Tragam meu filho de volta - gritava uma mãe, batendo no peito, enquanto seus parentes retiravam os corpos de quatro menores dos destroços. Só pela manhã, oito alunos foram resgatados, sem vida.

Dos 20 mil moradores de Balakot, calcula-se que pelo menos 2.500 tenham morrido em conseqüência do sismo. Milhares de pessoas estão feridas, a maioria crianças e mulheres que estavam em casa no momento do desastre, enquanto os homens trabalhavam em campo aberto. O vale abriga outras sete vilas, também arrasadas. Ainda ontem, os habitantes reclamavam que não estavam recebendo apoio da polícia e dos serviços de emergência.

Na escola particular Shaheen, em Balakot, 650 crianças estão presas nas ruínas do prédio de quatro andares, que caiu às 8h50, quando todos os alunos estavam em classe - sábado é dia útil no calendário muçulmano.

Lá, os pais também escavavam com as mãos para tentar livrar os filhos da morte. Seis corpos foram retirados e outros quatro, localizados no telhado do colégio. Apenas 19 crianças foram resgatadas com vida.

- Estávamos todos sentados quando aconteceu o terremoto. Levantamos e tentamos correr, mas tudo desabou - contou a adolescente Busra, retirada ontem dos escombros coberta de poeira e com ferimentos na perna. - Fiquei enterrada até o pescoço. Tem muita gente lá embaixo.

O trabalho de resgate foi suspenso diversas vezes, devido aos freqüentes tremores secundários. As réplicas deixavam a população em pânico. A maioria dos sobreviventes não tem comida ou abrigo. Alguns resistem com biscoitos e refrigerantes conseguidos em um armazém arrasado.

Toda a região de Balakot - na província Fronteira Noroeste, vizinha à Caxemira - é palco da devastação. Metade das casas de concreto sucumbiram aos tremores. Dezenas de corpos estão estirados a céu aberto. Deslizamentos de terra bloquearam a estrada que leva à vila.

Repórteres que fizeram o caminho, a pé contam que pelo menos 150 corpos estavam no percurso de 8 km. Alguns haviam sido colocados na estrada por parentes, à espera do enterro. Outros eram levados nos ''charpoys'' - as tradicionais macas funerárias islâmicas.

Um garoto carregava a irmã, de quatro ou cinco anos. A menina perdeu completamente a pele do rosto e de um lado do corpo, quando uma enorme pedra caiu sobre a casa. Ele não sabia o que fazer.

- Não tem curativos, nem remédios. Não tem médicos, nada. O que eu faço? - desesperou-se pelas ruas.

Chris Schmoter, uma médica alemã que dirige um leprosário em Balakot, afirmou que estava fazendo o que podia. Seis de seus pacientes morreram quando o telhado do hospital desabou. Vinte estão feridos.

- Trabalhei com refugiados nos últimos 17 anos, mas estou em choque. Nunca vi tanta devastação - disse.

O aldeão Haji Nawaz perdeu a mulher e os quatro filhos quando sua casa veio abaixo.

- Tudo tremia e pedras rolavam das montanhas. Em menos de um minuto, metade da cidade estava destruída - lembra. - O governo envia tropas e ajuda para o exterior. Por que demora tanto quando o desastre é aqui?

Javed Akhtar, um médico de Rawalpindi, correu para Balakot logo após o sismo, e conseguiu recuperar os corpos de 25 dos 30 parentes - incluindo irmãs, tios, primos e a avó.

- A menos que a ajuda oficial chegue loco, os mortos ficaram sob os escombros por pelo menos um mês - criticou.