Valor Econômico, v.20, n. 4865, 24/10/2019. Empresas p.B3

 

EDP acredita em protagonismo do Brasil


Grupo, que investirá R$ 11 bi no país até 2022, vê expansão das fontes eólica e solar, devido à queda de custos


Por Rodrigo Polito

Um dos executivos mais longevos do mercado global de energia, António Mexia, presidente mundial do grupo português EDP há mais de 13 anos, é categórico ao afirmar que o futuro da indústria, que atravessa o processo de transição energética, será baseado na eletrificação e por fontes renováveis. Neste cenário, o Brasil, em sua opinião, terá um papel de protagonismo mundial.

“Vivemos em um contexto de transição energética, em um mundo que será cada vez mais elétrico. E o Brasil tem condições extraordinárias, vai ter um papel de liderança a nível mundial”, disse Mexia, que veio ao país nesta semana.

À frente de uma empresa com faturamento global de € 3,3 bilhões (o equivalente a cerca de R$ 15 bilhões) e um parque gerador de 27 mil megawatts (MW), ele aposta nas renováveis não só pelo aspecto ambiental, mas também pelo ponto de vista econômico.

“Quando comecei a vir para cá [Brasil], há 14 anos, e começamos com a estratégia das renováveis, as pessoas olhavam com algum ceticismo. Hoje, as formas mais baratas de energia são sempre as renováveis. E nisso o Brasil tem um potencial incrível”, disse, lembrando que Portugal registrou há dois meses o recorde mundial de preço mais baixo da fonte solar, de € 14,9 por megawatt-hora (MWh). No Brasil, no leilão de energia da semana passada, a fonte solar foi negociada a R$ 84,39/MWh (cerca de € 18,5). “Quando cheguei na indústria, falávamos de praticamente € 600 [por MWh]”.

Não à toa, o Brasil responde por 20% do Ebitda (sigla em inglês para lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização) global e por 10% do resultado líquido do grupo EDP, que prevê investir R$ 11 bilhões no país nos próximos três anos. A companhia tem 2,9 mil MW instalados de hidrelétricas e de 331 MW de parques eólicos. Para 2022, o plano é vender 300 MW de eólicas e construir 1,2 mil MW de projetos do tipo.

Na visão do executivo, o país reúne as condições para ser base de multinacionais, de vários setores, na América Latina, pela importância do seu mercado interno e pela possibilidade de que as companhias avancem para outros países a partir do território brasileiro.

Mexia vê um cenário favorável para o Brasil, composto por inflação baixa (pouco superior a 3%) e taxa básica de juros projetada em 4,5% no fim do ano. O PIB, porém, não reagiu. “É por isso que coisas como reforma da previdência e reformas fiscais são importantes”, afirmou. “A complexidade da estrutura fiscal do Brasil hoje ainda é um obstáculo ao crescimento”.

Ainda no campo do “dever de casa” que o Brasil precisa fazer, Mexia fez sonoro alerta para o problema do risco hidrológico, conhecido pela sigla GSF, que resulta em inadimplência de R$ 7,6 bilhões no mercado de curto prazo de energia. “Temos aí um pacote no Senado que está um pouco parado, que seria importante que saísse, porque isso irá clarificar o investimento na hidroeletricidade.”

O presidente mundial da EDP também comentou sobre o debate em curso na Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) relativo ao aprimoramento das regras para a geração distribuída - instalação de sistemas de geração, principalmente a energia solar, utilizados por consumidores finais. Ele elogiou a postura da agência de dar transparência ao assunto, porém entende que deveria haver um processo gradual de cobrança dos usuários pelo uso da rede de distribuição.

De forma geral, o foco do grupo no Brasil hoje se concentra em transmissão de energia e fontes de geração solar e eólica. “Estaremos com certeza nos leilões de transmissão e de renováveis”, disse Mexia. Questionado sobre o interesse em eventual privatização da Eletrobras, o executivo disse que isso está fora dos planos. “É uma estrutura muito complexa. Neste momento, não é o nosso foco.”

Concentrado na transição energética e na queda dos custos da fontes renováveis, o presidente mundial da EDP afirmou ter convicção pessoal de que a mobilidade elétrica vai crescer significativamente no mundo, inclusive no Brasil. “A eletrificação dos transportes é um elemento decisivo para a descarbonização. A mobilidade elétrica é absolutamente vital”.

Apesar de reconhecer que as dimensões territoriais do Brasil aparentemente representam um desafio logístico para a mobilidade elétrica, ele lembrou que mais de 90% da utilização que as pessoas fazem dos carros são nas cidades. “Estamos falando de qualidade de vida nas cidades e a questão da poluição. O veículo elétrico, com energias renováveis, vai alterar de forma radical a qualidade de vida nas cidades”.

Para o executivo, a descarbonização e as mudanças climáticas são essenciais na atualidade. Por isso, é importante fazer o máximo possível para que o aumento da temperatura global seja limitado a 1,5 grau, e não a 2 graus. Pode parecer pouco, diz ele, mas muita coisa na natureza pode desaparecer com essa pequena diferença.

“O que parecia difícil no passado [a união de empresas concorrentes] se torna óbvia diante do atual cenário”, afirmou Mexia, durante evento, na terça-feira, onde a EDP reuniu montadoras e fornecedores de carregadores em um projeto para instalação de rede de carga ultrarrápida em São Paulo.

 

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Grupo muda estratégia para leilão


Leilão da Aneel de linhas de transmissão está marcado para dia 19 de dezembro


Por Rodrigo Polito 

A EDP Brasil planeja uma mudança de estratégia para o próximo leilão de linhas de transmissão da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), em 19 de dezembro. A companhia, que, até então, priorizava projetos que continham sinergias com outros ativos do grupo, estuda agora empreendimentos em outras regiões do país.

“Até agora, temos preferidos projetos que têm sinergias com as regiões onde estamos presentes. Mas o mercado está cada vez mais competitivo, por um lado, e menos líquido, tem menos projetos [ofertados]”, afirmou o presidente da EDP Brasil, Miguel Setas. “Portanto, estamos olhando para outros mercados, outras regiões do país, que não são exclusivamente aquelas onde estávamos focando para maximizar sinergias”, completou o executivo.

No leilão, serão oferecidos 12 lotes, com um total de 2.470 km de extensão de linhas, com investimentos previstos de R$ 41 bilhões.

Em agosto, a EDP Brasil finalizou a aquisição dos direitos de concessão de um lote de 142 km de linhas entre Santa Catarina e Rio Grande do Sul, ampliando para 1.441 km a extensão em seu portfólio de projetos de transmissão.

Ontem, a companhia recebeu a licença de instalação para o último trecho de um lote de transmissão em Santa Catarina, que está com 43% das obras concluídas.

No terceiro trimestre, a EDP Brasil registrou lucro líquido de R$ 354 milhões no terceiro trimestre, com crescimento de 15,3% ante igual período do ano anterior. Na mesma comparação, a receita líquida recuou 9,58%, para R$ 3,439 bilhões, e o Ebitda (sigla em inglês para lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização) avançou 14,6%, totalizando R$ 778,8 milhões.

Segundo Setas, o resultado foi influenciado pela revisão tarifária das distribuidoras do grupo. Nos processos das concessões do Espírito Santo e São Paulo, houve aumento da base de remuneração de ativos. Na prática, a base reflete investimentos realizados pelas distribuidoras na prestação dos serviços que serão cobertos pela tarifa.

No caso da distribuidora do Espírito Santo, a revisão provocou aumento de 28,1% da base de remuneração líquida, com redução de 4,84% na tarifa média ao consumidor. Com relação à EDP São Paulo, a queda na tarifa de 5,33% veio acompanhada de aumento da base de remuneração líquida de 45,3%.

As duas revisões tarifárias aprovadas pela Aneel geraram, na prática, efeito contábil de R$ 228 milhões com geração de valor às concessões das distribuidoras.