Valor Econômico, v. 20, n. 4905, 20/12/2019. Política, p. A12

 

CPMF digital e veto a fundo eleitoral opõem governo e Congresso Nacional
 Fabio Murakawa
 Raphael Di Cunto
 Marcelo Ribeiro
 Matheus Schuch 


 

A possível criação de um imposto sobre transações financeiras digitais e o financiamento de campanhas eleitorais são dois temas que colocaram novamente o governo e a Câmara dos Deputados em posições antagônicas. Ontem, o presidente Jair Bolsonaro chegou a mencionar a possibilidade de vetar o fundo eleitoral previsto no Orçamento do ano que vem. Após reação dos deputados, no entanto, mudou o discurso e disse que fora alertado sobre a possibilidade de um veto justificar até mesmo a abertura de um processo de impeachment.

A previsão de um fundo eleitoral de R$ 2 bilhões foi aprovada na terça-feira pelo Congresso Nacional, como parte do Orçamento de 2020. Foi o próprio Bolsonaro quem enviou a proposta para o Parlamento. No entanto, o presidente alega que apenas seguiu a legislação e que a campanha tem que acontecer “em condição de igualdade” e “que “não vê como justo” o critério para a distribuição de dinheiro.

“Para deixar bem claro: nós temos uma Constituição, está lá no artigo 85 da Constituição: são crimes de responsabilidade os atos do presidente da República que atentem contra a Constituição Federal, em especial contra o exercício de direitos políticos, individuais e sociais. O Congresso pode entender que eu, ao vetar [o fundo], atentei contra este dispositivo constitucional e instalar um processo de impeachment contra mim”, afirmou o presidente durante transmissão ao vivo nas redes sociais.

Ele acrescentou que está aguardando o parecer conclusivo da sua assessoria jurídica. “Deu para entender, pessoal? Vocês querem que eu corra risco de um impeachment?”, complementou. “Vão dar pancada em mim se por acaso minha assessoria jurídica manter a tese. Aí eu vou ter que sancionar o fundão.”

Pela manhã, no entanto, Bolsonaro havia sido mais assertivo sobre a possibilidade de vetar o fundo eleitoral. Durante café da manhã com jornalistas, o presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), demonstrou não estar preocupado com a ameaça. E sinalizou que há votos suficientes para derrubar um eventual veto.

Indagado se a manobra poderia ser interpretada como uma estratégia de Bolsonaro para desgastar o Congresso, Maia afirmou que isso poderia gerar pressões por retaliações do outro lado também, o que seria ruim. “Aí daqui a pouco o Congresso vai começar a fazer a mesma coisa? Aprovar reajuste do salário mínimo e subsídio do óleo diesel para ficar bem  com a população e jogar o desgaste para ele vetar, já que não tem dinheiro. A Câmara não fez esse jogo nos últimos anos e seria muito rumi para a sociedade se fizesse”, ponderou.

Outro assunto que gera divergência entre os dois Poderes é a possibilidade de criação de um tributo sobre transações financeiras por meio digital.

Bolsonaro voltou a dizer que “todas as cartas estão na mesa”, ao se referir ao possível retorno de um imposto nos moldes da antiga Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF). Ele disse, porém, que esse tipo de tributo “está demonizado”.

Já Maia afirmou ontem que a eventual proposta não seria aprovada pelos deputados federais. “A resposta da Câmara vai ser ‘não’ [para] imposto sobre movimentação financeira com o nome que você queira dar. Você pode dar o nome que você quiser. Não passa”, assegurou Maia.

Ele rebateu as afirmações de Guedes, que disse, na quarta-feira, que havia espaço para negociar o imposto no Congresso Nacional. O parlamentar disse que alertou Guedes da inviabilidade de a proposta sair do papel. “Estamos convencidos de que não. Eu disse para ele [Guedes] na reunião ontem [quarta-feira] que não tem espaço para isso.”

Maia disse que ainda estão sendo avaliadas alternativas ao imposto. “Estamos estudando. Deixa o pessoal da comissão trabalhar. Querem que eu fale tudo, faça tudo”.