Valor Econômico, n. 4950, 29/02/2020. Brasil, p. A6

PIB cresceu 1,1% em 2019, projetam analistas
Ana Conceição


Quando divulgar as Contas Nacionais na quarta-feira, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) deve confirmar o esperado: que o Produto Interno Bruto (PIB) fechou 2019 com um crescimento tímido, ao redor de 1%, pelo terceiro ano consecutivo. E com uma frustrante desaceleração no quarto trimestre na comparação com o terceiro. Mediana das estimativas colhidas pelo Valor Data aponta que a economia cresceu 1,1%, após expansão de 1,3% em 2017 e em 2018.

No quarto trimestre, a mediana mostra alta de 0,5% na comparação com o terceiro trimestre, quando subiu 0,6%, feito o ajuste sazonal. O intervalo das projeções vai de 0,3% a 0,7%.

Desastre de Brumadinho (MG), guerra comercial entre EUA e China, incertezas ao longo da tramitação da reforma da Previdência e recessão na Argentina têm sido apontados como razões para o crescimento pífio no ano passado. Mas, depois de um terceiro trimestre em que a economia andou mais que o esperado, estimava-se uma aceleração no quarto final, após aumento da população ocupada no mercado de trabalho, ainda que em vagas precárias.

Os resultados ruins da indústria, do varejo e dos serviços no fim do ano, especialmente em dezembro, consolidaram entre economistas a frustração com o ritmo da atividade. O Índice de Atividade Econômica do Banco Central (IBC-Br), que sintetiza esses indicadores, aumentou apenas 0,89% em 2019 e após sua divulgação se iniciou uma onda de revisões para o PIB de 2020, já que a “herança estatística” deixada para este ano deverá ser menor.

Outro fator que ajuda a explicar o ritmo mais fraco no fim do ano passado foi a inflação, após o choque do preço das carnes. “O resultado da inflação prejudicou o varejo”, afirma Rodolfo Cabral, economista da 4E Consultoria. Isso e a decepção com os dados do quarto trimestre fizeram a casa reduzir a estimativa para o PIB do período de 0,8% para 0,5.

Apesar disso, pelo lado da demanda, o destaque do quarto trimestre deve ser o consumo das famílias, que deve crescer pelo sexto trimestre. A projeção é de alta de 1,1%, após avanço de 0,8% no terceiro trimestre, na série com ajuste sazonal.

Os investimentos decepcionaram, apesar da retomada da construção e da queda dos juros. Mesmo com a reforma da Previdência, a incerteza econômica permaneceu elevada, por fatores internos e externos. A mediana das estimativas aponta que a formação bruta de capital fixo (FBCF, medida do que se investe em máquinas, construção civil e inovação) caiu 1,9% no quarto trimestre, após duas altas. No ano, deve crescer 3,2%, menos que os 3,9% de 2018.

O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) vê um resultado pior, de queda de 2,7% no trimestre. O dado pode estar ainda “poluído” pela importação de plataformas de petróleo, que tem efeito apenas contábil.

Sem elas, o resultado tenderia a ser melhor. Seja como for, o instituto estima aumento de apenas 2,1% nessa linha do PIB no ano. A queda dos investimentos deve provocar um recuo de 0,1% na absorção doméstica, segundo o banco Haitong, que estima recuo de 2% na FBCF. Depois do forte desempenho em meados do ano, a queda na produção de caminhões em ônibus pressionou a composição do investimento no período entre outubro e dezembro.

No lado da oferta, a indústria decepcionou e deve crescer apenas 0,3% no quarto trimestre, após alta de 0,8% no trimestre anterior. O segmento de transformação continuou afetado pela queda forte nas exportações para a Argentina. No PIB, a indústria também inclui a construção civil, que deve ter crescido no quarto trimestre e obtido em 2019 seu primeiro resultado positivo desde 2013. Entre 2014 e 2018, o PIB do setor caiu 30%. Os serviços, por outro lado, devem crescer um pouco mais, 0,6% no quarto trimestre, após alta de 0,4% no período anterior, na série ajuste sazonal.

Embora já esteja bem consolidada a percepção de que o crescimento do PIB em 2019 ficou em torno de 1%, os números do ano, e os do quarto trimestre especialmente, vão servir de gatilho para revisões no PIB de 2020. Uma onda de recálculos já aconteceu, com alguns já indicando expansão abaixo de 2%, mas esse movimento pode se generalizar.

A gestora AZ Quest reduziu a estimativa para 2020 de alta de 2,8% para 2,5% e tem viés de baixa para o número. André Müller, economista-chefe da casa, aponta dois fatores para a revisão: um ambiente global mais conturbado e os dados domésticos de novembro e dezembro de 2019, que vieram numa direção mais fraca. “O viés de baixa decorre da expectativa de uma projeção inicial para o primeiro trimestre, que é mais baixa do que seria compatível com uma economia crescendo a 2,5%”, afirma. A gestora prevê crescimento de 0,3% no PIB do primeiro trimestre na comparação com os últimos três meses do ano passado.

A despeito desse quadro, Müller trabalha com um cenário em que a economia acelera ao longo de 2020. Para ele, o ciclo de corte de juros ainda não tem tido efeito pleno na atividade. Müller espera retomada dos investimentos, capitaneada pelo setor de construção.

É o que diz também Cabral, da 4E. “Em 2020, o consumo e a renda devem crescer. A construção civil tem mostrado recuperação consistente. ” A 4E reduziu a estimativa do PIB deste ano, de 2,8% para 2,3%, com viés de baixa devido à frustração do quarto trimestre, mas pondera que ainda existem fundamentos que permitem algum otimismo neste ano.