Valor Econômico, n. 4953, 05/03/2020. Política,
p. A15
Bolsonaro escala
humorista para dar bananas à imprensa
Vandson Lima
Matheus Schuch
Fabio Murakawa
No dia em que foi divulgado que o Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro teve o
menor avanço dos últimos três anos, o presidente Jair Bolsonaro escalou um
humorista para falar sobre o assunto com a imprensa. Fantasiado de
Bolsonaro, o ator Márvio Lúcio, que interpreta o personagem “Carioca”, saiu do
Palácio do Alvorada na comitiva presidencial e ofereceu bananas aos repórteres.
Não é a primeira vez
que, questionado sobre assuntos que lhe desagradam, o presidente ataca a
imprensa. Na verdade, trata-se de uma manobra frequente. Em 7 de outubro,
Bolsonaro e o chefe da Secretaria de Comunicação Social (Secom), Fabio
Wajngarten, defenderam um boicote publicitário à mídia após reportagem da
“Folha de S. Paulo” vincular o suposto esquema de candidaturas laranjas do PSL
em Minas Gerais à própria campanha presidencial.
No fim do mesmo mês,
Bolsonaro insinuou que poderia não renovar a concessão da TV Globo após a
emissora apresentar reportagem que o citava no caso do assassinato da vereadora
Marielle Franco, baseada no depoimento à Polícia Civil de um porteiro do
condomínio onde o presidente tem casa no Rio.
Em dezembro, questionado
sobre o avanço de investigações sobre o suposto esquema de desvio de recursos
públicos e lavagem de dinheiro que envolve seu filho mais velho, o senador
Flávio Bolsonaro (sem partido-RJ), tendo como pivô Fabrício Queiróz, o
presidente atacou a imprensa e se referiu a um repórter como tendo cara de
“homossexual terrível".
A ofensa pessoal a
jornalistas virou prática corrente e voltou a ocorrer em fevereiro, ao difamar
a repórter Patrícia Campos Mello, mudando o foco de questionamentos sobre a
morte do miliciano Adriano Magalhães da Nóbrega, próximo da família Bolsonaro.
O método voltou a se repetir contra a jornalista Vera Magalhães, há uma semana,
após ela noticiar que Bolsonaro compartilhou um vídeo no WhatsApp em que
convoca a população a participar de manifestações contra o Congresso Nacional e
o Supremo Tribunal Federal (STF), marcadas para 15 de março. Só que desta vez,
o presidente bateu cabeça com os fatos: disse que a jornalista mentia e que o
vídeo que repassara era de 2015. Só que a primeira cena é a facada que ele
mesmo levou em 2018.
Ontem, diante da
insistência dos jornalistas sobre o desempenho do PIB, Bolsonaro olhou para o
humorista e afirmou: “O que é PIB? Pergunta o que é PIB”, respondeu, se
dirigindo ao humorista, que estava no púlpito de entrevista. “[Pergunta para]
Paulo Guedes”, disse Bolsonaro.
Diante da negativa do
presidente em responder às perguntas, os jornalistas viraram as costas e
deixaram o local enquanto o humorista continuava com provocações, gritando
“outra pergunta”, “não tem retaliação”.
O humorista saiu do
Palácio da Alvorada no carro em que também estava o chefe da Secretaria de
Comunicação da Presidência da República, que acompanhou a encenação, dando
gargalhadas. O ministro da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos, também
estava presente.
Toda a encenação foi
gravada por cinegrafistas da TV Record, que também estiveram dentro do
Alvorada. O presidente anunciou a um pequeno grupo de populares que o
material gravado hoje será divulgado no “Domingo Espetacular” da TV Record.
Mais tarde, Bolsonaro
disse esperar que o desempenho da economia melhore neste ano, apesar do surto
de coronavírus que atinge diversos países do mundo. O presidente ressaltou que
o PIB não foi negativo, como em 2015 e 2016. Mas admitiu que o resultado
“baixou um pouquinho em relação ao [governo Michel] Temer”.
“Mas estamos com o
melhor semestre desde 2013, se eu não me engano”, disse. Questionado sobre a
frustração de expectativas do próprio governo, com previsões que chegaram a
superar a casa de 2%, Bolsonaro respondeu: “É o que eu sempre falo:
expectativa bota o mais baixo possível, para evitar justamente esse tipo de
pergunta”.