Valor Econômico, n. 4953, 05/03/2020. Política, p. A17

Congresso mantém veto de Bolsonaro

Vandson Lima
Renan Truffi


O Congresso Nacional cumpriu sua parte no acordo entre o governo e o Legislativo e aprovou ontem a manutenção do veto do presidente Jair Bolsonaro a dispositivos do Orçamento impositivo.

Com isso, o governo recupera a prerrogativa de definição de quando executar as emendas. Mas o Congresso não saiu de mãos abanando. Os projetos encaminhados pelo governo, ainda a serem votados, preveem que dos R$ 30,1 bilhões de emendas do relator, o Congresso manterá controle para a destinação de R$ 20,5 bilhões; R$ 9,6 bilhões vão voltar para o governo decidir como e onde gastar.

De acordo com o acerto, os congressistas derrubaram vetos a outros dispositivos sobre o tema, relativos a despesas que não poderão sofrer contingenciamento caso haja diminuição de receita - especificamente ações do Programa de Pesquisa e Inovações para a Agropecuária; despesas com o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT); com a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa); com a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz); com o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea); e com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

As tratativas dão rumo, mas não encerram a disputa entre os dois Poderes. Isto porque o Congresso agora irá analisar, na próxima semana, os projetos encaminhados pelo governo para regulamentar o Orçamento impositivo e outras pendências orçamentárias. Primeiro, as matérias passarão pela Comissão Mista de Orçamento (CMO). A análise no plenário está prevista para sessão na terça-feira.

Anteontem, Alcolumbre encerrou a sessão do Congresso sem analisar esses projetos do governo, como era previsto, cerca de uma hora após o presidente Bolsonaro ir ao Twitter e negar ter feito qualquer acordo. Ontem, ele minimizou o episódio. Negou ainda que o Congresso esteja tentando implementar um “parlamentarismo branco”, tomando para si atribuições do governo. “Não tem negócio de parlamentarismo branco. É o Executivo cuidando das suas coisas e o Parlamento das suas”, respondeu.

Com a redução de R$ 9,6 bilhões em emendas, principalmente de relator, o governo garantiu o patamar de R$ 94,5 bilhões de despesas discricionárias (não obrigatórias) solicitado na mensagem modificativa do Orçamento encaminhado em dezembro. Se não houvesse remanejamento das emendas, as despesas discricionárias seriam de R$ 81,6 bilhões, comprometendo o funcionamento da máquina pública.

A equipe econômica informou que somente as emendas de relator, considerando a reserva de contingência de R$ 1,5 bilhão, serão reduzidas de R$ 30,1 bilhões para R$ 19 bilhões com a aprovação dos PLNs. Já as emendas de comissão, segundo dados do Ministério da Economia, seriam reduzidas de R$ 700 milhões para R$ 400 milhões. As emendas individuais serão mantidas em R$ 9,5 bilhões. O mesmo acontece com as emendas de bancada, que somam 5,9 bilhões.

Isso representaria um remanejamento de recursos para o Executivo de R$ 11,4 bilhões, porém, o PLN enviado ao Congresso Nacional vai prever apenas R$ 9,6 bilhões. Isso porque R$ 1,8 bilhão já está em fase de execução.

O secretário especial de Fazenda, Waldery Rodrigues, afirmou em entrevista que a previsão de votação dos projetos apenas na terça-feira favorece sua aprovação. Ele comentou que esse cronograma foi fixado pelo presidente do Senado, em acordo com lideranças, e reflete a “maturidade e importância” da nova regulamentação. É um prazo que está de acordo com o timing de funcionamento do Legislativo, acrescentou.

Waldery disse ter lido que um dos motivos do adiamento da votação dos projetos, que inicialmente seriam apreciados anteontem, foi o fato de alguns parlamentares desejarem mais tempo para analisar suas implicações. “Consideramos de caráter positivo”, disse. “O adiamento vai a favor da votação. ”

Questionado se foi ou não celebrado um acordo entre governo e Congresso em torno do Orçamento impositivo, fato negado pelo presidente Jair Bolsonaro, o assessor especial de Relações Institucionais do Ministério da Economia, Esteves Colnago, não respondeu diretamente. Disse que, com os projetos, a pasta busca regulamentar a nova realidade do Orçamento impositivo e dar segurança jurídica para sua execução.

Segundo ele, o ministério buscou regulamentar da forma mais prudente possível a execução do Orçamento e emendas novas, como de relator e de comissão, e nível de despesa discricionária para que haja “segurança” na administração da máquina pública e na gestão de políticas públicas. “O governo conseguiu garantir que o gasto discricionário do Executivo ficasse no mínimo igual ao de 2019”, disse Colnago. “Mesmo no novo ambiente, temos segurança de transcorrer este ano sem grandes problemas”, complementou.

Para o secretário do Orçamento Federal, George Soares, os PLNs encaminhados ao Congresso buscam clarificar a execução do Orçamento impositivo. Ele explicou que a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) já tinha regras claras para a execução de emendas impositivas individuais e de bancada, que existem desde 2015. Mas não para as emendas de comissão e de relator, incluídas para o Orçamento de 2020. Essa situação causa insegurança jurídica aos técnicos que executam o Orçamento, disse. O PLN estende às emendas de comissão e de relator as normas que já estavam em uso para as emendas individuais e de bancada.

O secretário adjunto do Tesouro Nacional, Otávio Ladeira, confirmou ainda que a estimativa de resultado primário dos Estados e municípios será reduzida a zero este ano. A previsão anterior era um saldo positivo de R$ 9 bilhões. Segundo o secretário, a estimativa mudou porque os Estados receberam, no último dia 31 de dezembro, cerca de R$ 11 bilhões em recursos da cessão onerosa. Mas não gastaram o dinheiro em 2019. O gasto ocorrerá em 2020, o que diminui o primário dos entes.