O Globo, n. 32593, 01/11/2022. Política, p. 8

A recuperação vermelha

Marlen Couto


A vitória do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) contra Jair Bolsonaro (PL) pode ser explicada pelo crescimento do petista em estados da Região Sudeste, que concentra os maiores colégios eleitorais do país. É o que mostra um levantamento do GLOBO a partir de dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que comparou o desempenho de Lula com o de Fernando Haddad, candidato do PT no segundo turno da disputa de 2018. Embora Lula e Bolsonaro tenham crescido em regiões nas quais o rival tem maior adesão do eleitorado, o mapa da apuração revela que o avanço do petista foi maior que o do candidato à reeleição no “território inimigo ”, na comparação com a eleição anterior.

Embora Lula também tenha avançado no Nordeste, onde conquistou 1,9 milhão de votos válidos a mais que Haddad, o presidente eleito cresceu mais, em números absolutos, no Sudeste, região em que Bolsonaro conquistou adesão da maioria dos eleitores. Nos quatro estados sudestinos, Lula somou 7,7 milhões de votos a mais nas urnas que o ex-prefeito paulista alcançou em 2018.

Alta em São Paulo

Os números de novos votos conquistados na região mais populosa do país correspondem a 58% do saldo positivo de 13,3 milhões de votos alcançados pelo candidato petista frente ao pleito de quatro anos atrás. Respectivamente, os três colégios eleitorais mais populosos registraram os maiores crescimentos. O presidente eleito teve mais votos em quase todos os estados do país. A exceção é Roraima, onde Lula teve 5,7 mil votos a menos que Haddad.

— É inegável que Lula é uma figura muito maior do que Haddad, pela sua história, por ter sido presidente por dois mandatos, pela conexão que tem com parte expressiva do eleitorado. Mas há um elemento adicional. Nas eleições deste ano Lula conseguiu resgatar parte do eleitorado original do PT, principalmente do eleitor de classe média e média-baixa nas grandes cidades do Centro-Sul do país. Esse desempenho de Lula fez toda a diferença no resultado final — avalia Bruno Carazza, professor da Fundação Dom Cabral.

No estado de São Paulo, onde o placar terminou em 55,24% a 44,76%, favorável a Jair Bolsonaro, Lula teve salto de pouco mais de 4,1 milhões de votos em relação a Haddad. Lula venceu na Região Metropolitana da capital, mas foi derrotado por Bolsonaro no interior, onde a diferença entre os candidatos chegou a 16,8 pontos percentuais. Na capital paulista, Bolsonaro teve 60,3% dos votos há quatro anos. No domingo, essa proporção caiu para 46,5%. Lula, por sua vez, alcançou 53,46%, ante 39,62% de Haddad. Ao todo, o presidente eleito teve 486,4 mil votos a mais que Bolsonaro na cidade.

No Rio, Lula teve 1,4 milhão de votos a mais que Haddad em 2018. O resultado foi puxado também pela capital, onde terminou atrás de Bolsonaro, mas com uma diferença de 5,3 pontos percentuais.

Em Minas, o presidente eleito teve crescimento de 1,5 milhão de votos, na comparação com o candidato petista há quatro anos. O estado foi o único do Sudeste em que Lula somou mais da metade dos votos válidos e foi aquele em que a distância entre os presidenciáveis foi a mais apertada do país, de apenas 0,4 ponto percentual, o que representa apenas 49.650 votos.

Os dados do TSE apontam que Lula conseguiu manter a vitória do primeiro turno em 372 das 659 cidades (56% do total) nas quais o governador reeleito Romeu Zema (Novo) também venceu na disputa pelo Executivo mineiro, apesar do apoio de Zema a Bolsonaro no estado.

O padrão de votação em Lula, em Minas, seguiu marcado pelo seu maior desempenho em cidades pequenas. Se na capital, Belo Horizonte, o petista ficou atrás de Bolsonaro e somou 45,7% dos votos, contra 54,25% do atual presidente, no interior, o petista chegou a 50,84%, enquanto o candidato do PL marcou 49,16% do total.

Recuo bolsonarista

No Sudeste, embora tenha conquistado mais da metade dos eleitores e tenha terminado a eleição com 4,2 milhões de votos a mais que Lula, Bolsonaro teve queda, em números absolutos, de 1,3 milhão no total de apoiadores em relação à votação de 2018. A redução foi de mais de 1 milhão de votos somente em São Paulo e chegou a 265 mil no estado do Rio, reduto eleitoral do hoje presidente. Em Minas Gerais, principal foco da campanha de Bolsonaro no segundo turno, houve pequeno crescimento em relação a 2018, de 41,2 mil novos votos.

Ao todo, Bolsonaro registrou saldo negativo de votos em seis estados. Além de São Paulo e Rio, foram contabilizadas perdas no Rio Grande do Sul (-160,5 mil), Paraná (-65 mil ), Distrito Federal (-39 mil) e Acre (-7,1 mil).

Por outro lado, o candidato do PL cresceu mais no Pará e em estados do Nordeste, como Bahia e Ceará, movimento que já havia ocorrido no primeiro turno. No estado da região Norte, a alta foi de 331,7 mil votos, a maior registrada no país. Considerando os nove estados nordestinos, o atual presidente teve 1,13 milhão de votos a maisque em 2018.