Título: Contra o boicote
Autor:
Fonte: Jornal do Brasil, 15/10/2005, Opinião, p. A10

Merece elogios a decisão do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), que condenou 20 laboratórios farmacêuticos por tentativa de boicote à entrada de medicamentos genéricos no mercado brasileiro. A punição exigirá o pagamento de uma multa correspondente a 1% do faturamento das empresas em 1998 - o melhor ano dos resultados do setor farmacêutico nacional. Qualquer tentativa de turvar o avanço dos medicamentos genéricos é mais do que uma afronta comercial. A introdução dos genéricos trouxe monumentais benefícios para o consumidor. Oferece, afinal, uma alternativa mais barata para os produtos já consagrados. Estudos recentes comprovaram que a entrada dos genéricos no mercado contribuiu para rebaixar os preços de referência. Internacionalmente, tais remédios custam cerca de dez vezes menos do que nos anos 90. O boicote é, portanto, socialmente vergonhoso.

Da decisão do Cade, contudo, chama a atenção o fato de o processo referir-se a 1997, quando uma reunião teria sido organizada pelo laboratório Janssen-Cilag com funcionários das 20 empresas - um encontro destinado a formalizar o cartel e definir as estratégias de barrar os genéricos. Os oito anos em questão transformam-se em um notável exemplo de como o Brasil padece de uma legislação promotora de atrasos e estimuladora de lentidão.

Convém empenhar-se para modernizá-la. Somente assim será possível ao país obter decisões mais ágeis e eficientes. A ausência de mudanças tem sérias implicações jurídicas, sociais e econômicas. A experiência internacional mostra que não se pode dispensar um instrumento crucial: a legislação antitruste. A política de concorrência privada depende dela - conferindo-lhe transparência e efetividade. Trata-se de uma exigência para a harmonia entre o interesse público e as iniciativas empresariais - inclusive dos poderosos laboratórios.