Título: A reza do terço
Autor: D. Eugenio Sales
Fonte: Jornal do Brasil, 15/10/2005, Opinião, p. A11

Nos últimos meses a comunidade brasileira tem sido bombardeada por acontecimentos que ferem profundamente a dignidade nacional. A maturidade do país foi posta à prova e felizmente vem superando as dificuldades a que tem sido submetida. No horizonte humano, terreno, o bom senso nos diz que, ao lado da deformação moral, há reservas que, utilizadas, fomentam a confiança no futuro. No plano religioso, ao lado de falhas, temos que agradecer a Deus tantos aspectos positivos.

Numa visão global, a Igreja Católica alimenta um juízo positivo de sua atuação no Brasil. Ao lado de inegáveis sombras, sobressaem fatos que nos estimulam a uma atitude de otimismo, que nos conduz a um crescente esforço em favor da Igreja de Deus em nosso país. Não nego as deficiências humanas a serem corrigidas com a graça de Deus. Aponto indícios que nos conduzem ao agradecimento pela bondade do Senhor.

Limito-me a um aspecto que é bastante revelador da maturidade religiosa e que abre grandes horizontes para o fortalecimento da obra de Cristo.

Os meios de comunicação social cada vez mais nos revelam seu poder e valor na comunidade religiosa. Na década de 30, no Brasil circulavam, em vários Estados, cerca de seis diários católicos. Desapareceram, talvez, por inanição, o que revela a debilidade da comunidade. Subsistiram semanários e cresceram, inclusive, em qualidade. Veio a fase das emissoras de rádio, atingindo todo o território nacional. São credoras de gratidão pelo trabalho religioso e social desenvolvido. Cito a educação, incluindo as escolas radiofônicas. Nesse campo há muito a dizer e a agradecer a Deus.

O surgimento das emissoras católicas de televisão veio responder às repetidas exortações da Santa Sé sobre a importância dos Meios de Comunicação Social na propagação da Fé e no fortalecimento do Reino de Deus. No início essas atividades, por parte de dioceses e paróquias, limitavam-se à transmissão da Santa Missa. Tão abençoados por Deus, graças aos esforços de pioneiros, é que hoje existem no Brasil, ao menos, três redes nacionais, acrescidas por tantas outras emissoras ou programas de televisão, em âmbito mais restrito. Em um passado ainda recente essa realidade parecia algo utópico.

Alguns acontecimentos ocorridos há pouco nos fazem refletir sobre a extraordinária penetração desses instrumentos de comunicação e seu valor na transmissão da mensagem evangélica. Sem dúvida, trata-se de um poderoso meio de levar à população o conhecimento da Doutrina Católica e proporcionar a educação religiosa, confortar os enfermos em seus lares e nos hospitais, possibilitando o acompanhamento, de atos religiosos, com muito fruto para os fiéis.

Cumprir o mandato divino de levar aos confins da terra a presença da Igreja, é algo que exige uma reflexão profunda sobre a importância desses meios e de seu devido aproveitamento. Cito alguns exemplos que demonstram o valor e a versatilidade de tais recursos, para o conhecimento do Evangelho e a vivência da obra de Cristo.

Incógnito, viajava pelo Nordeste. Ao passar por uma cidade pequena, de automóvel, três senhoras caminhavam pela rua e chamaram-me pelo nome. Não nos conhecíamos. Referiam-se aos programas dominicais, transmitidos para todo o Brasil por redes de televisão. Entre tantos outros episódios, recordo alguns. Visitava a Feira da Providência. Entrei em uma barraca, onde um grupo de artesãs da Amazônia trabalhava, demonstrando sua habilidade. Cumprimentei-as e imediatamente percebi, pela reação, que não era um desconhecido. Perguntei como me reconheceram. Cada uma das quatro, referia-se ao programa semanal, em três redes de TV católica e leiga. Lembro as visitas do Santo Padre ao Brasil, a transmissão do sepultamento de João Paulo II, a posse de seu Sucessor, Bento XVI e a 20ª Jornada Mundial da Juventude.

A transmissão do Rosário merece uma atenção particular. A estrutura dessa prática de piedade poderia parecer pouco adaptada à televisão. No entanto, a reza do terço do Rosário, na recitação da prece, unida à meditação da vida de Jesus, do anúncio do seu nascimento à coroação de sua Mãe no céu, é de grande riqueza espiritual. Possibilita à Igreja cumprir sua missão de levar aos recantos de nosso campo pastoral a Palavra de Deus, suas conseqüências em nossas vidas, conforto aos que choram, amparo aos aflitos e aos necessitados de maior fidelidade à Igreja do Senhor.

Antigamente, não se percebia a eficácia da recitação do Terço através dos meios de comunicação social. Hoje, os acontecimentos mostram, à saciedade, que essa devoção, pelo seu valor na vida familiar e na comunidade eclesial, é algo de precioso. Temas religiosos, ocupam vários horários em televisões, criando um ambiente de fé em nossa sociedade, às vezes, tão paganizada.

Causa admiração e conforto a Carta Apostólica ''Rosarium Virginis Mariae'', do Sumo Pontífice João Paulo II, ao Episcopado, ao clero e aos fiéis sobre o Rosário com data de 16 de outubro, do ano de 2002.

O Santo Padre, em Audiência diante da imagem de Nossa Senhora de Pompéia, proclamou a 16 de outubro de 2003 o ''Ano do Rosário'' que se estendeu até outubro de 2004. Ele assim falou: ''Devemos redescobrir a profundidade mística na simplicidade desta oração, tão querida à tradição popular''. E adiante: ''Confio este documento sobre o Santo Rosário aos Pastores e aos fiéis de todo o mundo''.

Sem negar que vivemos dias difíceis, reafirmo que temos indicações bem claras de que podemos e devemos viver e alimentar um clima de otimismo diante do futuro. Buscando o apoio do bem, venceremos o mal e suas seqüelas.