Correio Braziliense, n. 21731, 15/09/2022. Política, p. 5

Cresce pressão pelo voto útil

Vinicius Doria


A última pesquisa do Ipec, divulgada no início da semana, realimentou as esperanças da equipe de campanha do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) de que a corrida presidencial seja definida no primeiro turno. Faltando apenas 17 dias para a eleição, o voto útil em favor do petista deixou de ser conversa de bastidores para entrar, definitivamente, na agenda dos apoiadores como estratégia para evitar um confronto com Jair Bolsonaro (PL), que tenta a reeleição, no segundo turno.

Nas redes sociais, a tese do voto útil em favor de Lula ganha cada vez mais espaço e provocou reações irritadas de Ciro Gomes (PDT) e Simone Tebet (MDB), cujos eleitores são os principais alvos do assédio da militância pró-Lula. A possibilidade de migração de votos para o petista também mobilizou o comando da campanha de Bolsonaro, que prepara artilharia para barrar o avanço da estratégia adversária. O foco é reforçar os argumentos para atrair o eleitor antipetista, aquele que pode trocar de candidato por temor de uma vitória de Lula no primeiro turno.

Cinco centrais sindicais encamparam, ontem, o apelo pelo voto útil em Lula, em carta aberta endereçada “especialmente aos eleitores do PDT (de Ciro Gomes)”. Força Sindical, Pública Central dos Servidores, UGT, NCST e CBS declararam, no documento, que reconhecem “o valor de Ciro”, mas que, “neste momento, é mais importante apoiar e pedir para que todos apoiem o candidato Luiz Inácio Lula da Silva”. Uma sexta entidade, a Intersindical, também entrou na campanha pela migração dos votos ciristas. Em nota, declara que “os eleitores e eleitoras de Ciro e das demais candidaturas à Presidência devem fazer aquilo que seus candidatos não tiveram a grandeza de fazer” e que “devem retirar qualquer chance de Bolsonaro ir ao 2º turno”.

O próprio Lula postou, nas redes, que “nunca fez eleição para ganhar no segundo turno”. “Eu, que tenho 46%, tenho que acreditar que é possível, nos próximos dias, conquistar a porcentagem que falta, sem desprezo a ninguém”, tuitou, ao pedir ajuda da militância para intensificar a distribuição de material de campanha. O petista sabe que qualquer pontinho conquistado nas próximas duas semanas pode ser suficiente para definir a disputa pelo Palácio do Planalto.

Lula lembrou que é preciso mirar nos indecisos e em quem não está disposto a comparecer à votação. “Temos quase 20% da população que, nas pesquisas, dizem que vão se abster. O cara que não vota significa que, depois, não tem direito de reclamar. Nós precisamos, nesses 18 dias, de quem gosta muito de telefone celular, quem fica agarrado o tempo inteiro no celular, quem fica usando ‘zap’ (WhatsApp), fazendo Twitter, quem fica no TikTok”.

Na segunda-feira, a pesquisa Ipec mostrou que a soma dos votos válidos (que exclui votos em branco ou nulos, além das abstenções) declarados ao petista chegou a 51%, mais do que a soma dos votos dos demais adversários, indicando a possibilidade de a eleição ser definida já em 2 de outubro. Números que alimentaram a militância digital dos apoiadores do ex-presidente, que intensificaram, nas redes sociais, os apelos pelo voto útil.

A equipe de campanha de Lula está estimulando eleitores famosos a usar o poder de influência que têm para cooptar votos no cesto dos adversários. O ex-jogador Raí, por exemplo, postou em sua rede social. O técnico Vanderlei Luxemburgo, que dirigiu alguns dos principais times do pais, também chama o voto para o petista ao declarar que estará com ele no primeiro turno.

 

Reação

Ciro e Simone reagiram à onda do voto útil. A senadora do MDB disse, ontem, em Recife, que tais apelos são “um desrespeito à população brasileira”. E reforçou a importância da eleição em dois turnos para depurar as decisões do eleitorado.

“A eleição é de dois turnos exatamente por isso: para que, no segundo turno, a gente faça a eleição, obviamente, dentro dos que forem se apresentar”, justificou. “É um desrespeito à população brasileira numa das eleições, talvez a mais importante, a mais difícil desde a redemocratização. Esta é uma eleição que pode, definitivamente, tirar o Brasil do mapa da fome, da pobreza, da miséria. Ou não, a depender da escolha do eleitor”, acrescentou.

Ciro, por sua vez, foi mais incisivo, dirigindo suas críticas diretamente a Lula e ao PT, como vem fazendo nas últimas semanas. Acusou o partido de promover, com a tese do voto útil, “terrorismo e fascismo de esquerda”.

“O fascismo está saindo do bolsonarismo doente para o petismo fanático. É fascismo puro do Lula e do PT, e isso nós temos que derrotar”, disparou o pedetista, em Salvador, ontem, em um compromisso de campanha.

“Nosso povo humilhado, faminto, não tem sequer o direito de votar no sistema de dois turnos?”, questionou o presidenciável. (Colaborou Victor Correia)

 

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