Título: Em busca de um rosto para a globalização
Autor: Paula Barcellos
Fonte: Jornal do Brasil, 15/10/2005, Idéias, p. 4
Inquieto com a realidade do mundo que enfrenta diariamente, o teólogo Leonardo Boff lança o primeiro de três títulos da coleção Virtudes para um outro mundo possível. Hospitalidade: direito e dever de todos destrincha o contexto dramático do fluxo das populações mundiais que pressionam os limites geográficos dos Estados-Nação, geralmente em busca, segundo o autor, de condições melhores de vida e mesmo da pura e simples sobrevivência. Questões ligadas à convivência, à tolerância e à comensalidade serão abordados nos próximos volumes da coleção.
Nas primeiras páginas do livro, Boff dá uma aula sobre a contemporaneidade e constata, lamentavelmente, que junto ao processo de globalização ocorre a balcanização e a fragmentação do tecido social. Dentro dessa perspectiva, ressalta não haver caminho: ''somos urgidos a rasgar rumos novos'', escreve. Um dos meios de se criar um modelo de co-existência mais humano e eficaz seria a instituição, ou sua retomada, do paradigma do hóspede.
Para tanto, o teólogo parte do mito de Báucis e Filêmon, para depois esmiuçar a hospitalidade como forma de iluminar um novo tipo de globalização. Ou, nas palavras do autor, uma globalização com rosto. O mito da tradição grega conta a história de um casal hospitaleiro, cuja lição, segundo Boff, deveria ser repetida até os dias de hoje: ''quem acolhe o peregrino, o estrangeiro e o pobre hospeda a Deus''. O mito, no livro, é compreendido como revelador das dimensões do ser humano. Como um meio ilustrativo de demonstrar que ''a hospitalidade supõe a superação dos preconceitos e confiança quase ingênua'' para quando exercida em sua plenitude ''revelar a lógica do universo e da vida''.
Por mais que a visão de hospitalidade do autor seja quase utópica, vista como um dos objetos de salvação do atual contexto mundial, ele faz questão de enfatizar que ''o ideal nunca se realiza totalmente, nem essa é sua função''. Sua função seria alimentar sempre o ânimo em busca da melhora, da superação.
Um dos pontos cruciais levantados pelo teólogo aparece, apenas, após a centésima página: ''como viver a hospitalidade na era da internet, de seres virtuais?''. Talvez, por ainda estarmos vivendo a efervescência deste momento, Boff não tenha uma resposta clara: ''se não sabemos concretamente que políticas assumir, em nível global, podemos alimentar atitudes e comportamentos que embasem a hospitalidade e possam criar uma nova subjetividade nos cidadãos''. Formas de atingir tal mudança, como boa vontade incondicional e diálogo franco, por exemplo, são pontuados nas últimas páginas do livro.
Boff lança o livro na terça-feira, no Sesc Avenida Paulista, em São Paulo, após debate com Mario Sergio Cortella. Informações: (11) 6693 7944