Correio Braziliense, n. 21743, 27/09/2022. Política, p. 5

Intolerância política se espalha

Raphael Felice


A eleição presidencial deste ano está temperada por um componente que aprofunda a polarização verificada nas pesquisas de intenção de votos: crimes provocados por divergências políticas. O primeiro ataque envolvendo petistas e bolsonaristas foi em julho, quando o agente penitenciário federal Jorge Guaranho invadiu a festa de aniversário do dirigente do PT em Foz do Iguaçu (PR), Marcelo Arruda, e o assassinou a tiros. De lá para cá, vários registros tem sido feitos e noticiados.

No último final de semana foram pelo menos três. Em Angra dos Reis (RJ), foi a agressão contra a militante de esquerda Estefane de Oliveira Laudano, de 19 anos, pelo bolsonarista Robson Dekkers Alvino, de 52. Mas o ataque a Hildor Henker, em Rio do Sul (SC), por um petista e a facada recebida por Antônio Carlos Silva de Lima, de 39, em Cascavel (CE) por um bolsonarista somente vieram à tona ontem pela imprensa.

O ataque contra Hildor ocorreu por volta das 16h30 e, segundo testemunhas, deu-se por razões políticas. Ele e outra pessoa bebiam juntos quando se desentenderam. Já fora do bar em que estavam, o autor do crime atingiu o rosto da vítima com um tapa e o golpeou com uma faca. O caso é investigado pela Polícia Civil catarinense, que não divulgou a identidade do autor do crime — seria um homem de 58 anos com passagens na polícia por lesão corporal e injúria.

Na cidade cearense de Cascavel, Antônio Carlos Silva de Lima foi assassinado também a facadas por anunciar que votaria no presidenciável do PT, Luiz Inácio Lula da Silva. O homem que desferiu os golpes, Edmilson Freire da Silva, 59, já está preso preventivamente.

Segundo testemunhas, o suspeito teria chegado ao local gritando: “Quem é eleitor do Lula aqui?”. Antônio teria dito: “Eu sou!”. A partir daí, os dois começaram uma discussão. Quem presenciou afirma que os nomes do petista e do presidente Jair Bolsonaro (PT) foram ouvidos no bate-boca, até Edmilson atingir o outro nas costelas.

 

Atentado

No último domingo, o deputado federal Paulo Guedes (PT-MG), que faz campanha pela reeleição, foi alvo de um atentado à bala. Ele discursava em um trio elétrico em Montes Claros (MG) e foi alvo de três tiros. O autor dos disparos seria o policial militar Dhiego Souto de Jesus, 30, que estava à paisana, mas ninguém foi atingido.

O entrevero começou quando supostamente Dhiego passou perto do comício e uma mulher que o acompanhava gritou o nome de Bolsonaro. O carro em que estava teria sido cercado e o PM afirmou em depoimento que atirou para se proteger.

Guedes denunciou o caso pelo Twitter e anunciou ter acionado a Polícia Federal por se tratar de um crime eleitoral. Dhiego foi preso pela PM.

Também no domingo, a PM paulista tentou prender o chefe do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto Guilherme Boulos —  em campanha para se eleger deputado federal pelo PSol — depois que integrantes do Movimento Brasil Livre acusaram o candidato de agredir um adolescente de 15 anos que o provocou. Foi durante uma caminhada na Avenida Paulista.

Boulos acusou os militantes do MBL de usarem o menor para provocar a equipe dele e depois o acusaram falsamente. O jovem ainda foi agredido por militantes do PSol, como mostram vídeos que circulam nas redes sociais.

Uma equipe da PM foi chamada e o tenente Waldson Ferreira de Moura Junior tentou levar Boulos preso. O candidato argumentou e outras pessoas impediram e, no fim da discussão, foi liberado. O policial, porém, foi apontado como apoiador de Bolsonaro, conforme registram suas redes sociais, e acusado de tentar efetuar uma prisão apenas baseado nas convicções políticas pessoais.

Em Brasília, o clima eleitoral também se mostra tenso. Por volta das 19h de domingo, uma mulher que usava uma bolsa estampada com o rosto de Lula foi agredida próximo da 710 norte. A vítima, que preferiu não se identificar, disse que estava voltando a pé empurrando sua bicicleta, depois de um evento realizado no Eixão, quando um homem a derrubou e começou a chutá-la.

“Ele chegou por trás, me puxou, mas não teve provocação. Se ele quisesse roubar, ele roubava, porque a bicicleta ficou no chão. O propósito foi me jogar no chão e ficar me chutando”, relatou a vítima ao Correio, que disse que não costuma usar acessórios com estampas políticas por medo de agressões.

Ela disse que tentou fazer, ontem, um boletim de ocorrência, mas o sistema de duas delegacias que procurou estava fora do ar.