Valor Econômico, n. 4958, 12/03/2020. Política, p. A10

Economistas veem risco de judicialização

Hugo Passarelli


A ampliação do Benefício de Prestação Continuada (BPC) deixa o Orçamento federal operando perto do limite e pode representar um teste importante para o teto de gastos públicos, avaliam especialistas. Também há risco de o Executivo decidir judicializar a questão, uma vez que não há uma previsão de receitas para abrigar o montante extra.

Cálculos preliminares da Instituição Fiscal Independente (IF) indicam acréscimo de despesa de R$ 21,5 bilhões ao ano, diz Felipe Salto, diretor-executivo da entidade. O valor pode aumentar a partir da incorporação de informações mais detalhadas, diz. “O resumo é que estaremos operando no limite do limite”, afirma.

O especialista destaca que, a depender da aprovação dos projetos de lei do Congresso Nacional (PLNs), as despesas discricionárias da União, as que têm margem de manobra, podem ficar em torno de R$ 100 bilhões. Como o funcionamento da máquina pública exige um mínimo de R$ 77 bilhões, restariam R$ 23 bilhões para serem contingenciados. Se houver frustração de receitas pode ser necessário ampliar a meta de déficit federal, hoje em R$ 121,5 bilhões para 2020.

Mesmo sem ter uma projeção, Salto diz que o risco é menor para o teto de gastos, que ainda teria relativo espaço para acomodar o valor extra. A Emenda Constitucional 95 determina que, em caso de rompimento do teto, ficam proibidos aumentos reais do funcionalismo ou aprovação de projetos de lei que elevem despesa. ‘Pode ser um teste importante para o teto”, diz Salto.

O economista Marcos Mendes, um dos idealizadores do teto de gastos, lembra que há prerrogativas constitucionais e da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) que impedem a criação de uma despesa sem a devida fonte de recursos. “Há espaço para o Executivo judicializar ou ir ao Tribunal de Contas da União e argumentar que não existe sustentação para uma despesa aprovada dessa forma”, disse.

Mendes avalia que hoje há ameaças crescentes à continuidade do mecanismo. “Existe a desculpa de que precisa gastar para estimular a economia e por isso aumentar os gastos públicos. O Brasil não tem espaço fiscal para isso”, afirma. Em sua opinião, o aumento de gastos públicos levaria a uma piora das expectativas e teria efeito contracionista na economia.

Segundo Mendes, a derrubada do veto ao aumento do BPC é resultado da inépcia do governo em negociar com o Congresso Nacional.