Valor Econômico, n.
4958, 12/03/2020. Legislação & Tributos, p. E1
STJ inclui serviços
portuários no cálculo do Imposto de Importação
Joice Bacelo
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) mudou o entendimento sobre as despesas com
descarga, manuseio e conferência de mercadorias em portos e aeroportos - a
chamada capatazia. Os ministros da 1ª Seção decidiram ontem, por um placar
apertado de cinco votos a quatro, que esse custo está inserido na composição do
valor aduaneiro e, consequentemente, deve ser incluído na base de cálculo
do Imposto de Importação.
A decisão foi proferida
em caráter repetitivo, o que significa que deverá ser seguida pela primeira e
segunda instâncias e também pelos ministros das duas turmas que julgam as
questões de direito público na Corte.
O efeito prático, para
as empresas, será um aumento na tributação. E não só do Imposto de Importação.
Advogados chamam a atenção que o julgamento de ontem terá reflexo em outras
situações. Isso porque o valor aduaneiro serve como base de cálculo também para
o IPI, PIS e Cofins- Importação e ICMS.
A discussão, se tivesse
desfecho contrário, geraria prejuízo de cerca de R$ 12 bilhões para a União -
levando em conta a devolução do que foi pago pelos contribuintes nos últimos
cinco anos.
Os ministros analisaram
o tema por meio de três recursos (REsp 1799306, REsp 1799308 e REsp 1799309).
Todos eles haviam sido apresentados pela Procuradoria-Geral da Fazenda
Nacional (PGFN) contra decisões do Tribunal Regional Federal (TRF) da 4 ª
Região que favoreciam as empresas.
As decisões nas turmas
vinham sendo proferidas, até então, em sentido contrário à Fazenda. Os
julgamentos, no entanto, não eram unânimes. E foi justamente por uma
mudança na composição que se deu a virada na jurisprudência.
O ministro Francisco
Falcão, que ocupou o lugar de Humberto Martins - atual corregedor nacional de
Justiça - proferiu o voto que acabou virando o jogo. Humberto Martins tinha
posicionamento favorável ao contribuinte, já o ministro Falcão proferiu
voto em sentido diferente, que favoreceu a União.
A discussão, na 1ª
Seção, era saber se o artigo 4º da Instrução Normativa da Receita Federal de nº
327, publicada no ano de 2003, poderia servir de base para a cobrança do
imposto.
Esse julgamento teve
início em dezembro do ano passado. Naquela ocasião votou somente o relator,
ministro Gurgel de Faria, de forma favorável ao contribuinte - que acabou
ficando vencido. Ele aplicou o entendimento que até então prevalecia na Corte.
O artigo 40 da Lei nº
12.815, de 2013, para Gurgel de Faria, é claro no sentido de que os
serviços de capatazia “não integram o valor aduaneiro e, portanto, não devem
ser considerados para fins de composição da base de cálculo”. Por esse motivo,
segundo o relator, a norma que foi editada pela Receita Federal acabou por
ampliar a base de cálculo do imposto sem amparo em lei.
Já o ministro Francisco
Falcão, que abriu o julgamento na sessão de ontem, apresentou voto divergente.
Ele afirmou que não se tratava apenas de ato administrativo interno. O ministro
citou que o Decreto nº 6.759, de 2009, que regulamentou as atividades
aduaneiras de fiscalização, controle e tributação das operações, ratificou a
norma que anos antes foi editada pela Receita Federal.
Falcão levou em conta,
ainda, o Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio, conhecido como GATT, de 1994,
que no artigo 7º estabelece normas para a determinação “do valor para fins
alfandegários”. “Ou seja, o valor aduaneiro”, disse o ministro ao proferir o
voto. “O referido artigo 7º foi regulamentado pelo Decreto 2.498, de 1998,
que no artigo 17 prevê o valor aduaneiro independentemente do método de
valoração utilizado”, frisou.
Os ministros Herman
Benjamin, Og Fernandes, Sérgio Kukina e Napoleão Nunes Maia Filho acompanharam
o voto do ministro Francisco Falcão. Já Regina Helena Costa, Mauro Campbell e
Assusete Magalhães seguiram o relator e ficaram vencidos.
O procurador Péricles de
Sousa, da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, diz que há decisão do
parlamento do Mercosul para que as despesas de capatazia sejam incluídas no
código aduaneiro comum e que, se a decisão do STJ tivesse sido contrária, o
Brasil seria o único país a considerar a cobrança como ilegal. “Os outros
países podem escolher se querem ou não incluir e o Brasil não teria escolha”,
diz. “Politicamente pode ser zerado. Mas a decisão, aí, será do Ministério da
Economia. ”
Entidades do setor devem
levar o caso ao governo e ao Congresso, afirma Paulo Castelo Branco, presidente
executivo da Associação Brasileira de Máquinas e Indústrias (Abimei).
Ele vê a decisão do STJ como uma “distorção”. ‘Máquinas e equipamentos deveriam
ser isentos de impostos. Quando você compra máquina para a produção aqui no
Brasil, você vai gerar emprego e vai gerar imposto também”, afirma.