O Globo, n. 32617, 25/11/2022. Economia, p. 15

Pressão por um nome

Manoel Ventura
Jeniffer Gularte


Com dificuldade na articulação da “PEC da Transição”, proposta de emenda à Constituição que abre espaço no Orçamento do ano que vem para cumprir suas promessas eleitorais, o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) passou a ser pressionado até mesmo por aliados para anunciar seu ministro da Fazenda. O diagnóstico de integrantes do PT e de outros partidos de sua base é que falta um “rosto” para encampar a medida que permitirá ao novo governo pagar o Bolsa Família de R$ 600 em 2023 e também outros gastos. A PEC hoje tem um impacto de quase R$ 200 bilhões, mas tende a ser desidratada.

A pressão foi escancarada ontem por um dos principais aliados de Lula, o senador Jaques Wagner (PTBA), para quem a dificuldade de destravar a aprovação da PEC se dá pela ausência de um nome para a pasta.

— Acho que falta mais, por enquanto, é um ministro da Fazenda — afirmou Wagner, quando perguntado por jornalistas se falta um articulador empoderado por Lula para agilizar o andamento da PEC no Congresso. — O problema é que não tem nome na mesa, tem na cabeça do presidente.

A leitura entre petistas é que a fala de Wagner representa um sentimento de que falta alguém para negociar, pedir e cobrar o engajamento de líderes de partidos aliados. O senador foi escalado para assumir a articulação política da PEC no Congresso e tem sido considerado o “Casa Civil” da transição. Na quarta-feira, Wagner recebeu uma romaria de deputados e senadores no seu gabinete. As conversas contaram com outros nomes do núcleo duro petista, como a presidente do PT, Gleisi Hoffmann, o deputado José Guimarães (CE) e o líder do PT na Câmara, Reginaldo Lopes (MG).

O diagnóstico da necessidade de um ministro da Fazenda será levado a Lula numa reunião hoje em São Paulo — o presidente está há duas semanas sem ir a Brasília, primeiro por conta da COP27 e depois para se recuperar de uma cirurgia na garganta. A cúpula do PT deve participar em peso desse encontro, entre eles Wagner e Gleisi, além do vice-presidente eleito, Geraldo Alckmin (PSB).

Mais tarde, Gleisi se contrapôs a Wagner, afirmando que o problema é outro:

— Está faltando articulação política no Senado, por isso que eu acho que nós travamos na PEC — disse. — Não é falta de ministro.

Enquanto Lula não define sua Esplanada, seus aliados, dentro e fora do PT, colocam Fernando Haddad como o mais cotado para assumir a Fazenda. Um dos indicativos foi o fato de Lula ter escalado o ex-ministro para representá-lo no Almoço Anual de Dirigentes de Bancos da Febraban hoje, em São Paulo, com a presença do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto. A notícia foi antecipada pela colunista do GLOBO Míriam Leitão.

Dobradinha com Persio

Na tentativa de arrefecer as desconfianças do mercado financeiro com Haddad, integrantes da transição afirmam que o economista Persio Arida, ex-presidente do BNDES e um dos pais do Plano Real, poderia compor uma dobradinha com ele.

Uma das hipóteses aventadas é Persio ser escolhido para o Ministério do Planejamento, mas ainda não houve convite, segundo interlocutores. Essa pasta, hoje integrada ao Ministério da Economia, será recriada por Lula. Essa possibilidade animou o mercado ontem, que fechou com alta da Bolsa e queda do dólar .

Na equipe de transição, a avaliação é que a indicação de Persio para o Planejamento, além de reduzir a resistência do mercado a Haddad, criaria pontes com segmentos do setor financeiro e empresarial. Além disso, indicaria que Lula está construindo um governo de coalizão, não escolhendo só nomes do PT ou aliados mais próximos.