Valor Econômico, n. 4959, 13/03/2020. Finanças, p. C5

Operação da Polícia Federal investiga diretor que deixou o IRB

Ana Paula Ragazzi
André Guilherme Vieira


A Polícia Federal deflagrou ontem a Operação Suitcase, que investiga a prática de corrupção ativa e passiva. Foram cumpridos quatro mandados de busca e apreensão, expedidos pela 11ª Vara Federal de Fortaleza, nos Estados do Ceará e de São Paulo.

Um dos endereços visitados pela PF em São Paulo foi a sede do IRB Brasil Re, na avenida Faria Lima. Outro endereço, também na capital paulista, apurou o Valor, foi a residência de Fernando Passos, que até a semana passada era diretor financeiro do IRB. De acordo com fontes, Passos é o alvo principal dessa operação da PF, e os agentes que chegaram à empresa perguntaram especificamente pela localização da sala ocupada por ele. Em nota, o IRB informou que a operação realizada pela Polícia Federal em sua sede não está relacionada à companhia. Por meio de assessoria de imprensa, Passos negou que tenha sido alvo da operação.

Em comunicado, a PF informou que no centro da investigação da Operação Suitcase, que é desmembramento de ação que tramitou perante o Supremo Tribunal Federal (STF), está a delação premiada de dois colaboradores que citaram um ex-diretor do Banco do Nordeste (BNB), que teria recebido R$ 200 mil em espécie, que lhe foram entregues numa maleta em um hotel de Fortaleza. Esse diretor seria Passos, que liderou o departamento financeiro e de crédito do BNB de 2011 a 2014, quando foi para o IRB. O BNB divulgou uma nota afirmando que não foi alvo da operação da PF realizada ontem.

Passos teve de renunciar ao posto que ocupava no IRB semana passada depois que o Berkshire Hathaway, fundo do investidor Warren Buffett, ter negado a compra de ações do IRB na bolsa - Passos havia ventilado a informação a investidores e analistas. A divulgação de informação falsa pelo executivo instaurou uma crise de confiança do mercado em relação ao IRB, num momento em que a gestora de recursos carioca Squadra questiona a sustentabilidade dos resultados do ressegurador sob o comando financeiro de Passos. No ano, os papéis do IRB acumulam desvalorização de 76%. Ontem, dia muito nervoso no mercado financeiro, as ações caíram 27,95% e encerraram o dia a R$ 9,15 - ficaram muito próximas da menor cotação já atingida pelo papel, que foi R$ 8,44, registrada em 9 de agosto de 2017, logo após a chegada da empresa à B3.

De acordo com informações que ficaram disponíveis no formulário de referência do IRB enquanto Passos trabalhou na companhia, ele era alvo de um processo envolvendo sua passagem pelo BNB até o final do ano passado. Conforme o que constava no formulário, o Ministério Público Federal (MPF) propôs, em fevereiro de 2015, ação penal perante a 11ª Vara do Tribunal Federal Regional da 5ª Região - Seção Judiciária do Ceará, em face de Fernando Passos e demais colaboradores do BNB.

A alegação era a “suposta prática de atos que caracterizariam gestão fraudulenta relacionados ao cálculo do limite de crédito, em fevereiro de 2009, de uma empresa do setor elétrico e sua controlada perante o BNB”. Passos e outros acusados teriam “maquiado” análises de risco para liberar empréstimos a empresas com dívidas já muito elevadas, que não passariam pelo controle de risco do banco. Ele sempre alegou inocência.

O juiz de primeira instância rejeitou a denúncia em novembro de 2015, antes mesmo de citar os colaboradores do BNB, por ausência de justa causa para o procedimento da ação criminal. O MPF interpôs recurso contra a decisão do juízo de primeira instância e após idas e vindas na

Justiça durante todos esses anos, em 25 de novembro de 2019 decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) rejeitou a denúncia do MPF contra Passos e os demais colaboradores do BNB.

O IRB informava em seu formulário até a semana passada que a rejeição da denúncia, com trânsito em julgado em 3 de dezembro de 2019, não representava mais “qualquer risco para a permanência do executivo à frente de suas funções na companhia”. O documento também destacava que os órgãos competentes do Ministério Público estavam cientes desses fatos e, portanto, “outras medidas judiciais, incluindo ação civil relativas a potenciais infrações à lei de improbidade administrativa, podem ter sido ou poderão ser propostas em face do sr. Fernando Passos, o qual não tem ciência até o momento”, dizia o texto.

Por ter divulgado informações falsas sobre a compra de ações do IRB pelo Berkshire, Passos deverá ser investigado pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) por manipulação de preços no mercado. Até esses eventos recentes, o executivo era premiado e muito festejado por analistas e investidores no mercado pelo comanda área financeira do IRB.