Correio Braziliense, n. 21761, 15/10/2022. Política, p. 3

Lula: rival terá de entregar faixa

Victor Correia


Recife foi o último destino do candidato do PT à Presidência, Luiz Inácio Lula da Silva, na série de viagens pelo Nordeste nesta semana. Antes de participar de passeata por ruas da capital pernambucana, o petista afirmou, em entrevista coletiva, que o presidente Jair Bolsonaro (PL) foi o chefe do Executivo que mais usou a máquina pública em um pleito — com a adoção de uma série de medidas eleitoreiras —, mas que não será bem-sucedido nas urnas. “Ele pode gastar o quanto quiser. O destino do Bolsonaro já está traçado. Ele vai ter de ter humildade e, no primeiro dia de janeiro, colocar a faixa (presidencial) no meu pescoço”, enfatizou.

Lula aproveitou para ironizar o ato do adversário no Recife, no dia anterior. “Agora ele disse que não gosta de nordestino. É por isso que o ato que ele fez aqui em Pernambuco foi um fiasco”, declarou o ex-presidente. “Seria até bom alguém ligar para ele, para ele ver na televisão a nossa passeata. Vai ver que é bem maior do que o vergonhoso ato que fez aqui ontem (quinta-feira). Bem maior. Se ele tivesse que viver de venda de camisa, no ato daqui, teria morrido de fome, de tão pouca gente que tinha.”

Na passagem por Recife, Bolsonaro participou de uma série de eventos, como reuniões com pastores e lideranças políticas. Porém, o discurso para apoiadores, em cima de um trio elétrico, estava bastante esvaziado em comparação com o público que ele costuma ter nas manifestações que convoca. No estado, o ex-presidente ganhou no primeiro turno com 65,25% dos votos, contra 29,91% do adversário.

Na entrevista, Lula atacou a atual gestão, especialmente nas áreas da infraestrutura e da saúde. “Ele (Bolsonaro) tem a cara de pau de dizer que fez as obras do Rio São Francisco. Tem até publicidade”, criticou, destacando que a maioria das inaugurações feitas pelo presidente foi de obras iniciadas em outros governos. “Esse cidadão não governa este país. Ele não cuidou da saúde como deveria ter cuidado. Negligenciou a vacina, quando poderia ter evitado 400 mil mortes. Se tivesse deixado de ser ignorante e conversado com o pessoal da saúde, dos laboratórios, em vez de brigar com os governadores, possivelmente muitas pessoas ainda teriam seus pais, seus avós.”

Como contraponto, Lula citou feitos de sua gestão no estado, como investimento de R$ 170 bilhões em obras de infraestrutura, R$ 14 bilhões aplicados no Minha Casa, Minha Vida, criação de 695 mil postos de trabalho e atendimento a 107 mil famílias no programa Luz para Todos. “Não há o hábito no Brasil de as pessoas quererem compilar as informações para elas mesmos usarem”, disse. “Resolvi começar a mostrar alguns números do nosso período de governo para que, quem sabe, algum jornal publique, e ele (Bolsonaro) vai ficar sabendo. Ele vai ficar sabendo como se governa com respeito”, acrescentou.

 

Reaproximação

Ao lado de Lula na coletiva estava a candidata ao governo pernambucano Marília Arraes (Solidariedade), que deixou o PT no começo deste ano. No primeiro turno, por acordo com o PSB, o presidenciável apoiou o socialista Danilo Cabral, que ocupou o terceiro lugar com 18% dos votos. A aliança no estado era uma das principais condições para a formação da chapa nacional entre PT e PSB.

Marília usou a imagem de Lula durante toda a sua campanha, o que gerou conflito entre os diretórios pernambucanos de PT e PSB. No primeiro turno, o ex-presidente fez questão de apresentar Cabral como seu candidato, mas pessoalmente não viu problemas em ser associado à campanha de Marília. A candidata disputa agora com Raquel Lyra (PSDB).

Também esteve presente o prefeito do Recife, João Campos (PSB), primo de Marília, contra a qual disputou o comando da cidade em 2020. Desde aquele pleito, os dois parentes estão rachados mas, com intermédio de Lula, reuniram-se novamente em prol da candidatura do ex-presidente. Segundo o petista, “você pode ter uma briga, mas a relação deles é sanguínea”. “Eles têm um DNA. (A reaproximação) É uma atitude honesta e corajosa, porque é visível, ninguém está escondendo que tinha divergências profundas.” Na entrevista, a postulante ao governo estadual reconheceu a importância de “passar por cima de qualquer divergência” para reconstruir o país. Campos não se manifestou.

Após a coletiva, Lula desfilou pelo centro do Recife, ao lado dos aliados, em uma caminhonete aberta. O comboio foi até o Pátio do Carmo, percorrendo um trajeto de um quilômetro, onde o petista discursou em um carro de som. “Queria pedir para vocês levantarem as mãos. Vou tirar uma foto e mandar para o Bolsonaro, para ele saber como se junta gente numa praça”, afirmou.