Valor Econômico, n. 4960, 14/03/2020. Brasil, p. A2

Tamanho do bloqueio de despesas vai definir debate sobre mudança da meta

Fabio Graner


É o tamanho da necessidade de contingenciamento de despesas que será a variável decisiva para o governo mexer ou não na meta fiscal. O problema da frustração de receitas, no quadro atual das regras fiscais, reforça o cenário de bloqueio de gastos previstos para os ministérios. A dúvida é quanto. E, de acordo com uma fonte graduada, isso está perto de ficar claro se deve ser discutido na reunião da junta orçamentária, amanhã.

“Se a necessidade for de um corte relativamente pequeno, de R$ 10 bilhões a R$ 15 bilhões, não tem por que mudar a meta. Se os números apontarem para um corte acima de R$ 30 bilhões, aí é inviável e não tem como escapar”, disse uma fonte. Esse interlocutor disse acreditar que essa discussão tende a se intensificar mais para o relatório do segundo bimestre, a ser finalizado em maio, quando os impactos econômicos da atual crise ficarão mais claros e serão incorporados. Entre economistas privados, contudo, o debate já esquentou.

A possibilidade de se alterar a meta já está no radar da equipe econômica há vários dias por conta do problema de restrição de receitas, conforme mostrou o Valor na quarta-feira da semana passada. O movimento, contudo, ainda era visto como prematuro por algumas fontes, que mantêm essa visão. Mas não havia uma postura radicalmente contra a tese, diferentemente do que ocorre com a regra do teto de gastos.

Um interlocutor aponta que seria tecnicamente inviável fazer isso para o próximo relatório, a ser divulgado na próxima sexta-feira (20). Isso porque todos os parâmetros econômicos já foram anunciados e estão sendo considerados para a projeção de receitas. E seria necessário enviar projeto de lei ao Congresso alterando a meta. Como o Parlamento não costuma criar caso para gastar e tem cobrado ações contra a crise, isso dificilmente seria problema.

Há, porém, no governo quem considere tranquilo fazer essa mudança logo nesta semana. De acordo com uma fonte, os impactos econômicos do coronavírus justificariam eventual revisão da meta, que daria mais flexibilidade para o governo atuar, em um quadro de PIB mais baixo e com redução de receitas. No Congresso, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), já enviou sinais favoráveis a uma proposta de mudança.

Em tese, esse primeiro relatório bimestral, que sinaliza o que se deve fazer na gestão fiscal, conta com parâmetros macroeconômicos que não implicam um cenário tão dramática de perda de receitas. Ele foi feito, porém, antes da semana cataclísmica no mercado, o que reforç de baixa nas estimativas de crescimento econômico.

Nesse sentido, uma fonte lembra que uma coisa é reduzir a estimativa de PIB para de 2,4% para 2,1% (que é que vale neste momento) e outra, com impactos bem mais intensos, é baixar para 1,4%, como algumas casas no mercado já estão fazendo. “Nesse caso, a perda de receita serian muito grande”, explica a fonte.

Outro graduado interlocutor demonstra considerar precipitada a discussão, dizendo que todo começo do ano tem contingenciamento, mas tem sempre muito espaço para reverter isso posteriormente. “A gente não faz ideia do que vai ser o ano ainda. Não tem sentido pensar nisso agora [mudança da meta]”, afirmou a fonte.