Valor Econômico, v. 20, n. 4961, 17/03/2020. Política, p. A9
Ex-aliados querem saída de Bolsonaro da Presidência
Carolina Freitas
Marcelo Ribeiro
Dois antigos aliados de Jair Bolsonaro pediram ontem a saída dele do cargo de presidente da República. O deputado federal Alexandre Frota (PSDB-SP), que havia rompido com Bolsonaro ano passado, anunciou que ingressa hoje com pedido de impeachment do presidente no Congresso
Nacional. Já a deputada estadual Janaina Paschoal (PSL-SP) reconheceu pela primeira vez ontem ter se arrependido de votar em Bolsonaro e defendeu: “Esse senhor tem que sair da Presidência da República. ”
O posicionamento dos dois políticos se deu como reação à participação de Bolsonaro em atos pró-governo no domingo, em Brasília. O presidente estava resguardado em casa depois de ter voltado dos Estados Unidos com uma comitiva em que quatro pessoas foram diagnosticadas com covid-19.
Bolsonaro fez uma transmissão ao vivo em vídeo na semana passada usando máscara e sugeriu que as manifestações fossem suspensas. O pedido obedecia uma recomendação do Ministério da Saúde, já que o Brasil tem transmissão comunitária do vírus. Três dias depois, porém, no domingo, Bolsonaro foi ao encontro de quem teimou em ir para a rua, apertou mãos, falou à curta distância e segurou o celular das pessoas para tirar fotografias, em frente ao Palácio do Planalto, onde não costuma aparecer em fins de semana.
O primeiro exame de Bolsonaro, na semana passada, deu negativo para coronavírus. Hoje ele fará um novo teste. Para Janaina, a atitude do presidente durante os protestos configura “crime contra a saúde pública”. “Como é que esse homem vai lá potencialmente contaminando as pessoas? Pegando nas mãos, beijando? Ele tá brincando? ”, discursou Janaina, na tribuna da Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp). A fala da deputada durou seis minutos e ecoou em um plenário esvaziado, mas foi transmitida pela internet e repercutiu nas redes sociais.
“As autoridades têm de se unir e pedir para ele [Bolsonaro] se afastar. Nós não temos tempo para um processo de impeachment. Nós estamos sendo invadidos por um inimigo invisível. Precisamos de pessoas capazes de conduzir a nação. ” A deputada afirmou considerar adequado, nesse momento, que o vice-presidente, Hamilton Mourão (PRTB) assuma. “Deixa o Mourão, que entende de defesa”, disse.
Janaina defendeu no discurso medidas restritivas mais duras para frear a progressão no número de casos em São Paulo e no país. “Quando as autoridades têm o poder e o dever de tomar providências para evitar um resultado danoso, e assim não procedem, elas respondem por esse resultado. Isso é homicídio doloso”, afirmou.
A deputada estadual foi convidada, em 2018, para ser candidata a vice de Bolsonaro. Decidiu, no entanto, disputar a Assembleia de São Paulo e se tornou a parlamentar mais votada da história do Brasil, com 2 milhões de votos. Janaina é autora do pedido de impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff (PT), afastada em 2016.
Em Brasília, Alexandre Frota prepara pedido de impeachment em que vai argumentar que Jair Bolsonaro apoiou e participou de manifestações que tinham entre suas pautas ataques ao Poder Legislativo. “Juridicamente, a peça é irretocável”, afirmou.