Título: Além do Fato: Luis Posada e a bebida de George Bush
Autor: Saul London
Fonte: Jornal do Brasil, 19/10/2005, Internacional, p. A8

Escritor, cineasta, diretor de programas de mídia digital da Universidade Politécnica da Califórnia, em Pomona, pesquisador do Instituto de Estudos de Política

Como ligar o veto de um juiz americano à extradição do terrorista Luis Posada Carriles para a Venezuela e o fato de que o presidente dos EUA, George Bush, tenha voltado a beber? A resposta começa no fato de Bush não ter participado de um programa para dependentes. Diz ter curado o vício aos 40 anos, correndo. Deus falou a ele, ou Jesus. Trocou os Alcóolicos Anônimos por exercícios e orações. O presidente tem muitos problemas. Iraque, Afeganistão e aprovação abaixo dos 40%. Além disso, segue a receita de Karl Rove, derivada de Napoleão, Frederico, o Grande e do Partido Nazista: esquecer tudo sobre verdade, integridade e ética, afirmar-se na audácia e na agressão. A fórmula o salvou em duas eleições, mas se erodiu. De acordo com o jornal National Enquirer (21/9/2005), a primeira-dama Laura Bush teria flagrado o marido bebendo no rancho de Crawford, Texas. Bush, de 59 anos, voltou ao copo diante da catástrofe do Katrina e das falhas de seu governo no socorro às vítimas. Antes de questionar o jornal (N. do E.: o Enquirer é um tablóide sensacionalista), vale lembrar que o veículo revelou o vício de Rush Limbaugh, republicano e um dos colunistas favoritos da Casa Branca.

¿Quando os diques de Nova Orleans se romperam, ele se serviu de whisky puro em um copo e bebeu de uma só vez. A primeira-dama, chocada, gritou: Pare George!¿, descreve uma fonte ¿da família¿. Laura Bush desconfiava desde uma entrevista do marido no dia 12/9, quando foi perguntado se havia sido mal informado sobre o furacão.

¿Não. Quando a tormenta veio, muitos disseram que escapamos por pouco. Havia um relaxamento e acho que realmente escapamos, porque eu ouvi pessoas, que sobrevoavam a região, dizendo isso. Havia planos para o caso de rompimento, mas houve um relaxamento naquela hora crítica¿. (Site da Casa Branca, 12/9).

A tentativa frustrada de esclarecer deveria compensar a falta de iniciativa. Mas com o banho de sangue no Iraque, a popularidade caindo e a gasolina subindo, Bush sentiu o golpe.

¿O triste é que ele vem bebendo desde então. Continuou depois de voltar do rancho¿, afirma a fonte. ¿As baixas americanas o afetam muito e o resultado é que Bush bebe aqui e ali, para enfrentar¿, completa. O país já teve outros assim, como Ulysses Grant e Warren Harding. Para a médica Katherine Van Wormer (autora de um livro sobre tratamento de dependentes), o presidente parou a bebida, mas ainda crê poder baixar a ansiedade através dela (Counterpunch, jan/2003).

Em 20/9, o presidente voltou a Nova Orleans. Prometeu a reconstrução, mas delegou aos moradores criar um plano para o futuro. ¿Olhamos adiante para ouvir sua visão de forma a poder fazer melhor o nosso trabalho¿, afirmou. No dia seguinte, emendou: ¿Se quer encorajar pequenos negócios, isente-os de impostos. É uma pausa fiscal. De qualquer forma aquela região não teria crescimento mesmo¿, ironizou Bush. Se tivesse posado para fotos na ¿região¿, ele teria de apertar mãos sujas e sentir o cheiro da morte. Preferiu ficar de férias, vendo golfe pela tevê e não corpos boiando e desespero.

Van Wormer lista outros sintomas: ¿Julgamento rígido, impaciência, comportamento infantil, certa irracionalidade, projeção e reação excessiva¿. E paranóia, como na declaração:

¿Devemos nos preparar para para barrar Estados párias e seus clientes terroristas antes que possam nos atacar com armas de destruição em massa¿. A médica também identifica o olhar do juiz, a visão bíblica quando o presidente diz: ¿Não trabalho com nuances. Clareza moral é importante, é o Mal contra o Bem¿. (Counterpunch, 10/2002).

O compromisso contra o terror se evaporou no caso de Posada (preso nos EUA, acusado de explodir um avião cubano em Caracas, matando 73 pessoas). Bush disse: ¿Os EUA não separam os que cometem atos de terrorismo e aqueles que os ajudam. Ambos são assassinos. Qualquer governo que escolhe se aliar ao terror também escolheu ser inimigo da civilização. E ela deve fazê-los pagar suas contas¿ (Discurso no Instituto National Endowment for Democracy, 10/2005). Apesar disso, a Casa Branca não impediu que o advogado de Posada argumentasse que o venezuelano seria torturado caso fosse extraditado. Apesar do Departamento de Estado, em relatório recente, ter tirado a Venezuela da lista negra. Posada abalou a reputação de Bush na luta contra o terror, o último reduto de força de um presidente cujos líderes no Congresso (Tom DeLay e Bill Frist) estão às voltas com a Justiça. Autor de um livro sobre o presidente, o médico Justin Frank justifica. ¿Alcóolatras fora de programas de reabilitação, como ele, sofrem mais com o estresse¿. (Enquirer, 21/10).