Título: Abandono da eficiência
Autor:
Fonte: Jornal do Brasil, 19/10/2005, Opinião, p. A10

A ação errática do governo, combinada com intermináveis disputas políticas no Congresso, vem promovendo o arrefecimento de uma das maiores conquistas da administração pública brasileira: as agências reguladoras, órgãos fundamentais para a instalação e sustentação do marco regulatório de setores-chave da economia - premissa para a garantia de segurança a investidores e respeito aos consumidores. Primeiro serviram para abrigar velhos companheiros sem mandato e assegurar o controle político do governo, numa partidarização incompatível com as exigências de funcionamento de tais agências. Agora, conforme mostrou reportagem do Jornal do Brasil, há uma crescente insatisfação com a demora do Palácio do Planalto para indicar diretores aos órgãos. Com efeito, corre-se o risco de não ter quórum mínimo para tomada de decisões de interesse de empresas e consumidores. Soma-se ao incômodo com a falta de empenho governista pela aprovação da lei geral das agências reguladoras. Há 18 meses, dorme nas gavetas do Congresso a proposta do marco regulatório. Sem perspectiva de votação, torna-se terreno fértil para instabilidade no ambiente de negócios.

Maus presságios. Nos dois primeiros anos do mandato do presidente Lula, vozes saudosas do Leviatã estatal confundiram o papel das agências e de seus respectivos comandos: pretenderam suprimir a autonomia que a legislação lhes outorga - condição essencial para atuarem com base em critérios técnicos e não submetidas ao controle do chefe do Executivo. O modelo de gestão balizado por marcos regulatórios claros e precisos, bem como fundamentado em agências reguladoras atuando nos mais importantes setores, constituiu um dos exemplos de uma administração pública moderna e eficiente. Não foi um ganho do governo Fernando Henrique, mas uma vitória do Brasil.

Hoje se informa que a chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, pretende priorizar quadros técnicos na escolha. Partidos aliados do governo, contudo, não abrem mão de contemplar correligionários. Um velho vício. Historicamente patrimonialista, nossa política recusa a aceitar o óbvio: uma administração pública insulada e livre das pressões partidárias é condição para sua eficiência. Portanto, são inquietantes as evidências de esfacelamento das agências, de demora na definição do marco regulatório e de uma disputa política que turva os horizontes de uma boa gestão pública.