Título: Saddam encontra o banco dos réus
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Fonte: Jornal do Brasil, 19/10/2005, Internacional, p. A12

Começa hoje o julgamento do ex-ditador iraquiano, Saddam Hussein, e de mais sete membros de seu regime, que durou 23 anos. No entanto, o advogado de defesa afirmou ontem que vai pedir um adiamento de três meses da audiência.

O julgamento acontece dois anos depois de Saddam ter sido encontrado em buraco, em um local próximo à sua cidade natal. Ele e os outros sete, integrantes de seu antigo partido - o Baath -, serão julgados por cinco juízes, que não tiveram as identidades reveladas. Apesar de inúmeras acusações, o ex-ditador vai ao tribunal para responder por um só o crime: o massacre de 143 xiitas na cidade de Dujail, em 1982.

Segundo fontes da Justiça iraquiana, entretanto, a aguardada sentença deve demorar a sair. O advogado de Saddam, Khalil Dulaimi, já avisou que vai pedir mais tempo para preparar a defesa de seu cliente e acusa a Corte de ser ilegal.

Dulaimi, com pouca experiência, disse que pretende questionar a legitimidade do tribunal, cujos juízes foram escolhidos pela ocupação americana. O advogado vai apresentar um documento alegando que a Corte não tem jurisdição e pedirá mais tempo para ler o relatório de 800 páginas que acusa o sunita.

Instaurado logo após a queda de Saddam, em dezembro de 2003, o Tribunal Especial Iraquiano (TEI) foi criado por Washington, o que para a defesa e organizações de direitos humanos evidencia a imparcialidade do julgamento.

''O ex-presidente iraquiano não terá um julgamento justo nessa Corte. Ela foi criada ilegalmente e lhe nega direitos humanos básicos'', disse Dulaimi, em comunicado.

As ONGs Anistia Internacional e Human Rights Watch, também manifestaram preocupação com a politização do caso e declararam que a Corte não dá garantias exigidas pela lei internacional. O ex-ditador não pôde, por exemplo, escolher seu advogado.

Já a procuradoria diz que 45 dias são suficientes para o estudo do caso, ao contrário do que alega a defesa. Mas a decisão final sobre o adiamento caberá aos cinco juízes, treinados na Grã-Bretanha.

Para o primeiro-ministro do Iraque, Ibrahim al Jaafari, o julgamento está ocorrendo tarde demais.

- Não há crimes mais claros que os cometidos por Saddam - disse o xiita, que perdeu cinco parentes, incluindo um irmão, executados pelo antigo regime.

A princípio, a audiência será pública e televisionada, como anunciou o porta-voz do TEI, o juiz Raed Al Juhi, na semana passada.

- A não ser que a Corte decida, na última hora, fazê-la a portas fechadas - acrescentou Al Juhi.

O país está sob um forte esquema de segurança. Sabe-se apenas que o julgamento ocorrerá em um prédio na Zona Verde, no Centro de Bagdá. A hora prevista para começar não foi divulgada.

Já o referendo para a nova Constituição, ocorrido no sábado, está sob suspeitas de irregularidades. Segundo autoridades iraquianas, os resultados prévios mostram ''anomalias''.

- Não excluímos erros técnicos nem fraude - informou um representante da Comissão Eleitoral.

O funcionário explicou que pode ter havido problemas na transcrição dos resultados:

- Se for este o caso, iniciaremos um processo de correção e será feita uma recontagem.

O motivo da suspeita foi o alto índice de votos para o ''sim'', principalmente nas regiões curdas do Norte e xiitas do Sul. De acordo com a Comissão, em seis províncias xiitas que tiveram pouca participação no plebiscito, o ''sim'' superava os 90%.