Valor Econômico, v. 20, n. 4962, 18/03/2020. Empresas, p. B3

Montadoras europeias suspendem produção
Daniel Thomas
Peter Campbell
Jonathan Eley 


Linhas de produção pela Europa caíram no silêncio na segunda-feira. Várias fábricas pela região foram desativadas. As montadoras empenharam-se em conter os danos de uma perda de negócios nunca antes vista.

À medida que o coronavírus se dissemina, países inteiros entram em confinamento. Montadoras de carros, uma depois da outra, foram anunciando a suspensão dos trabalhos, uma vez que a indústria automotiva se depara com sua pior desestabilização em dez anos.

O grupo francês PSA, dono das marcas Peugeot, Citroën, Vauxhall e Opel, anunciou na segunda-feira que iria fechar todas as fábricas na Europa, incluindo as de Mulhouse, na França, e de Ellesmere Port, no Reino Unido.

A fabricante francesa de pneus Michelin anunciou que pretendia paralisar as fábricas na Itália, Espanha e França a partir de ontem “por, no mínimo, uma semana”.

A italiana FCA Chrysler vai fechar oito instalações, incluindo seis em seu mercado doméstico.

A Volkswagen, maior montadora do mundo, pode paralisar linhas de produção em razão de problemas em sua cadeia de fornecimento, uma vez que um número cada vez maior de países europeus fecha fronteiras e impõem medidas de confinamento, segundo fontes.

A fábrica da montadora em sua sede em Wolfsburg vai fechar dentro de alguns dias, a menos que o grupo possa substituir as peças que recebia de fornecedores italianos e espanhóis. Em um dia de turbulências para a indústria automotiva europeia, Renault, Ford e Nissan também fecharam instalações na Espanha. A Bavária, Estado natal da BMW, declarou estado de emergência.

A PSA informou que a decisão foi tomada “devido à aceleração observada nos últimos dias de casos graves da covid-19 próximos a locais de produção e a interrupções no fornecimento de importantes fornecedores, assim como ao declínio repentino dos mercados automotivos”.

“As coisas estão ficando mais complicadas e a situação está mudando rapidamente”, destacou a Volkswagen. “Temos bem mais fornecedores na Itália e Espanha do que na China para [nossa] produção na Europa. ”

As ações da francesa Renault, que fechou duas fábricas no norte da Espanha, caíram 20% na segunda-feira, elevando a desvalorização acumulada em 12 meses para 80%. Os papéis da conterrânea PSA caíram 16%.

As ações das montadoras alemãs também sofreram. As da Daimler caíram 11%, as da BMW, 12%, e as da Volkswagen, 13%.

“A realidade é que as ações automotivas na Europa estão sentindo o golpe, uma vez que as fábricas estão sendo fechadas e a oferta e a demanda vão ser afetadas severamente nas próximas semanas”, disse Thomas Besson, analista da Kepler Cheuvreux.Philippe Houchois, analista especializado no setor automotivo no banco de investimento Jefferies, afirmou que “a situação provavelmente vai ficar pior daqui em diante”.

Philippe Houchois, analista especializado no setor automotivo no banco de investimento Jefferies, afirmou que “a situação provavelmente vai ficar pior daqui em diante”.

À medida que o vírus se espalha pela América do Norte, as montadoras nos Estados Unidos se preparam para paralisações similares. A pesquisa regular do Federal Reserve regional de Nova York, sobre a atividade industrial no Estado apontou a maior queda na história.

A Chrysler interrompeu a produção em uma fábrica no Canadá na quinta-feira passada, depois de trabalhadores terem parado de trabalhar por medo do coronavírus. Sindicatos de uma fábrica da Ford no

Kentucky pediram que as instalações fossem fechadas até que desinfetantes para as mãos e máscaras fossem distribuídos aos funcionários. Na segunda-feira, houve um breve protesto dos funcionários da área de pintura na principal fábrica da Chrysler, em Warren, mas a linha não chegou a ser interrompida pela manifestação.

Algumas empresas de bens de consumo, que já se deparam com sérias quedas nas vendas, também vêm interrompendo completamente o trabalho.

Na segunda-feira, a Associated British Foods, dona da varejista de moda Primark, anunciou o fechamento de lojas na Itália, França e Espanha, responsáveis por mais de 30% da receita.

“Não podemos fazer nenhuma previsão sobre quanto tempo isto vai durar”, afirmou John Bason, diretor de finanças da Associated British Foods. “Todo o varejo de roupas, seja de lojas on-line ou de concreto, está sendo afetado pela queda na demanda”, completou.

A sueca H&M, uma das maiores varejistas de roupa do mundo, divulgou uma atualização do desempenho no primeiro trimestre destacando que as lojas em 13 países estavam fechadas ou o seriam em breve.

Nos EUA, várias redes, por conta própria, decidiram fechar lojas para tentar desacelerar a disseminação do vírus, incluindo fabricantes de artigos esportivos como Nike, Under Armour e Lululemon e grupos de moda como Urban Outfitters e Abercrombie & Fitch. Na sexta-feira, a Apple anunciou o fechamento de todas suas lojas fora da China.

Especialistas em reestruturação de dívidas preveem que terão pela frente um dos períodos mais movimentados de suas vidas profissionais, à medida que empresas fiquem sem caixa e se deparem com a necessidade de pagar dívidas e cobrir custos como salários e alugueis.

“Em certos aspectos, é uma combinação da Grande Crise Financeira, do 11 de Setembro e da sars, tudo embrulhado em um único e horrível pacote, criando um choque na demanda”, afirmou Joseph Swanson, diretor-gerente sênior na Houlihan Lokey. “Estamos falando sobre perder o consumidor”, disse. (Colaboraram David Sheppard e Neil Hume)