Valor Econômico, v. 20, n. 4962, 18/03/2020. Legislação & Tributos, p. E2

Inteligência de negócios e os dados abertos

Letícia Mary F. do Amaral
Priscila Dias


Há pouco mais de um mês, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) divulgou que disponibilizou para consultas a base de Dados Abertos, atualizada até 31 de dezembro de 2019, iniciativa que busca a transparência de acordo com a legislação que abrange o assunto, e tem por padrão ser atualizada a cada três meses. Essa base relaciona todos os créditos inscritos em dívida ativa da União, Previdenciária e junto ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS).

Isto quer dizer que, agora, é possível ter acesso à relação de todas as pessoas físicas e jurídicas que possuem débitos com a Fazenda Nacional inscritos em dívida ativa da União e junto ao FGTS, na condição de devedor principal, corresponsável ou solidário. As pessoas físicas não precisam se preocupar, pois essa base está de acordo com a Lei Geral de Proteção de Dados, mascarando parcialmente os números do Cadastro de Pessoa Física (CPF).

A maior importância dessa modernização se concentra no ponto de vista da inteligência de negócios por trás dos dados divulgados. Mas, como assim? A divulgação da grande base de dados atualizada em formato aberto (.csv) permite aos estrategistas, ao minerar e cruzar os dados disponíveis, encontrar todos os créditos ativos da União, inclusive os garantidos, os suspensos por decisão judicial e os parcelados.

Ressaltando que essas informações são de livre utilização, consumo e cruzamento, pois são distribuídas sob licença aberta, isto é, não há qualquer formato proprietário e podem ser usadas da forma que os analistas acharem melhor, inclusive comercializá-las.

A ferramenta disponibilizada pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, através dos dados abertos, consegue divulgar quais empresas têm dívidas com o governo. Assim, um olhar estratégico sobre isso, permite que qualquer empresa que esteja fazendo negócios com outra empresa ou pessoa possa extrair dessa base decisões importantíssimas sobre análise de crédito e gestão de risco, por exemplo.

Em adição a isso, a ferramenta também permite que a empresa faça uma análise profunda de sua concorrência, identificando players de mercado que possam estar se beneficiando de preços mais vantajosos de um lado, mas que carreguem um grande passivo tributário de outro.

Do ponto de vista social, a base de Dados Abertos permite, por exemplo, relacionar os estabelecimentos que um contribuinte costuma frequentar e identificar sua situação fiscal, com o objetivo de incentivá-lo a optar por estabelecimentos sem dívidas de impostos ou FGTS, sendo um indutor de regularidade e conscientização tributária. Um verdadeiro ins de cidadania e educação tributária.

A disponibilização dos dados abertos governamentais é algo muito importante para o país e para os negócios, pois o aumento da transparência na gestão pública promove maior segurança para que as empresas disruptivas do mercado utilizem tais dados a seu favor, podendo assim aproveitar espaços e viabilizar novos negócios, trazendo uma maior segurança e inteligência na tomada de decisões.

Cada vez mais as empresas estão unindo a tecnologia com a inteligência de mercado para que essa junção ofereça informações valiosas para orientar estratégias de negócios. A inteligência de negócios ou BI - Business Intelligence é o processo de cruzamento de dados relacionados aos clientes e ao mercado como um todo, cujo objetivo é utilizar essas informações para tomar decisões relevantes, por meio da transformação de dados em informações, dessas informações em conhecimento e, finalmente, de conhecimento em inteligência.

Isso permite que a empresa que tenha adotado a tecnologia em seus negócios obtenha uma visão mais clara e assertiva de suas ações, conduzindo e estabelecendo um planejamento de longo prazo, podendo, assim, adotar estratégias mais eficientes e eficazes para otimizar seus negócios e, consequentemente, aumentar faturamento e lucro.

Aplicando a soma da tecnologia com a inteligência de negócios, a empresa deixa de apenas responder às demandas do mercado e passa a agir com antecipação, ditando o ritmo a ser seguido pela concorrência, com essa proatividade sendo a garantia de melhores negócios para investidores e empresários.

Tudo isso, cada vez mais, demonstra um mercado crescente para o Direito da Inteligência de Negócios, por meio do qual o consultor jurídico se torna um parceiro estratégico de seus clientes, pois, ao saber bem manusear as ferramentas de dados abertos que estão disponíveis, pode ser o elo na captação, análise e tratamento de dados, o que é necessário para que o cliente empresarial possa tomar decisões que visem o crescimento de seus negócios.

Letícia Mary Fernandes do Amaral e Priscila Dias são advogadas tributaristas e de direito da inteligência de negócios e, respectivamente, sócia e associada da Amaral, Yazbek Advogados

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