O Globo, n. 32581, 20/10/2022. Política, p. 4
Estável e indefinido
Luã Marinatto
Passado o primeiro debate do segundo turno entre Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Jair Bolsonaro (PL), e em meio a uma sequência de fatos políticos marcantes — como os tumultos durante a visita do presidente a Aparecida (SP) e a frase do candidato à reeleição sobre “pintar um clima” com adolescentes venezuelanas —, o cenário da disputa presidencial mostra poucas inflexões. A dez dias da votação decisiva, em 30 de outubro, o petista alcançou 49% da preferência dos entrevistados na pesquisa Datafolha de ontem, contra 45% do atual chefe do Executivo.
Esta é a primeira vez em que o instituto coloca os dois adversários em situação de empate técnico, no limite máximo da margem de erro de dois pontos percentuais — nestas condições, o empate é considerado estatisticamente improvável. A flutuação em relação ao levantamento anterior, divulgado na última sexta-feira, deu-se apenas na intenção de voto de Bolsonaro, que oscilou positivamente um ponto, enquanto Lula ficou com o mesmo percentual.
A cristalização da disputa é reforçada pelo número de indecisos na pesquisa estimulada, que recuou de 2% para 1%. Já os que anunciam a intenção de votar branco ou nulo passaram de 6% para 5%. Na análise por votos válidos, que desconsidera estes dois índices — tal qual faz a Justiça Eleitoral ao anunciar os resultados do pleito —, Lula está com 52%, contra 48% de Bolsonaro, repetindo o empate técnico no limite da margem. Também nesta situação, diz o Datafolha, o cenário de igualdade concreta é improvável. Na sexta-feira, o placar era de 53% a 47% a favor do petista.
Uma terceira forma de olhar para os resultados do levantamento é por meio das respostas espontâneas, quando os eleitores precisam dizer de cabeça em quem votarão, sem que o entrevistador apresente os nomes dos candidatos. Nesta modalidade, o ex-presidente aparece com 47%, e Bolsonaro totaliza 44%. Na semana passada, Lula tinha 46%, enquanto o atual mandatário aparecia com 41%. A diferença entre os dois passou de cinco para três pontos percentuais no período, estando ligeiramente mais apertada do que na pesquisa estimulada.
A proximidade entre os resultados nas perguntas estimuladas e espontâneas também reforça o alto nível de sedimentação dos votos e a margem estreita de movimentação dos candidatos. Na espontânea, são 3% de indecisos, um estoque baixo, porém ainda disponível para estratégias de comunicação de ambos os candidatos até o dia 30.
Efeito consignado?
A ligeira reação de Bolsonaro, ainda que em movimentações dentro da margem de erro nos números gerais, pode ser explicada pela análise de dados segmentados da pesquisa. Entre os eleitores que recebem o Auxílio Brasil, por exemplo, a vantagem de Lula sobre o rival encurtou 13 pontos. Lula tinha 62% na última sexta-feira, passando para 56%. Já o presidente, que cita a concessão do benefício com frequência, foi de 33% a 40% no período. A margem de erro neste recorte é de cinco pontos.
No último dia 11, a Caixa Econômica Federal passou a oferecer empréstimo consignado a beneficiários do programa, com juros de 3,85%. O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União (TCU) pediu à Corte que suspenda a concessão deste tipo de crédito por enxergar nela objetivo meramente eleitoral, mas ainda não há decisão.
Já o eleitorado evangélico, alvo de uma das mais intensas disputas entre os dois adversários desde o primeiro turno, também caminhou favoravelmente a Bolsonaro. Ele oscilou positivamente um ponto e agora tem 66% da preferência dos fiéis, enquanto Lula foi de 31% para 28%.
A vantagem do presidente sobre o petista neste segmento já cresceu sete pontos percentuais na comparação com a primeira pesquisa divulgada após a votação de 2 de outubro, liberada no dia 7, quando Bolsonaro vencia por 62% a 31%. Em uma tentativa de contra-ataque, Lula lançou ontem uma carta aos evangélicos.
Por outro lado, o ex-presidente avança junto aos católicos, ainda que a passos mais lentos. No primeiro levantamento depois do primeiro turno, ele liderava com 55%, contra 38% de Bolsonaro. Ontem, o panorama era de 58% a 37% — uma vantagem lulista quatro pontos maior, portanto.
Inversão entre homens
No Sudeste, região mais populosa do país, a dianteira de Bolsonaro passou de quatro para sete pontos em cinco dias. Ele andou de 48% para 50%, e Lula recuou de 44% para 43%. Na primeiras emanado segundo turno, Bolsonaro tinha três pontos à frente do rival. No Nordeste, principal reduto petista, o candidato à reeleição foi de 27% para 29%, enquanto o ex-mandatário murchou um ponto percentual, aparecendo agora com 67%.
Outro recorte em que Bolsonaro evoluiu foi entre os homens, onde a liderança numérica inverteu-se, mantendo-se o empate técnico. Enquanto o presidente passou de 46% a 49%, Lula variou de 48% para 47%. A prevalência petista junto ao eleitorado feminino, porém, permaneceu inalterada, no placar de 51% a 42%.
A nova rodada da pesquisa Datafolha mostrou ainda que Lula é rejeitado por 46% dos entrevistados — mesmo índice anterior —, enquanto 50% dizem não votar em Bolsonaro de jeito nenhum, num recuo de um ponto ante os 51% do último levantamento.
O instituto também mostrou que a avaliação do governo Bolsonaro permaneceu no mesmo patamar de cinco dias atrás. Somam 38% os eleitores que classificam a gestão do presidente como boa ou ótima, e 39% os que a consideram ruim ou péssima. Outros 22% acreditam que a administração de Bolsonaro é regular.