Valor Econômico, v. 20, n. 4964, 20/03/2020. Brasil, p. A2

Economistas aprofundam apostas de queda do PIB

Anaïs Fernandes
Ana Conceição
Arícia Martins


A possibilidade de o cenário político conturbado no Brasil continuar após o período mais agudo da crise do coronavírus está no radar de analistas, que seguem jogando para o campo negativo estimativas de desempenho da economia neste ano.

O BNP Paribas e a MCM Consultores estimam queda de 1% no Produto Interno Bruto (PIB) de 2020. Antes, o banco projetava alta de 1,5%, e a consultoria, de 1,4%. “O setor de serviços preocupa particularmente, porque é bastante concentrado, de certa maneira, em centros urbanos e muito suscetível aos impactos de demanda”, diz Gustavo Arruda, economista-chefe do BNP.

Com a aguda deterioração das condições financeiras, o tombo da confiança e efeitos permanentes da crise sobre segmentos mais frágeis, a recuperação da economia, após a semiparalisação, tende a ser gradual, mantendo a atividade em nível baixo no ano, escreve a MCM em relatório.

Para eles, é prematuro avaliar quão eficientes serão o corte da Selic para 3,75%, informado anteontem, e as demais medidas tomadas por Banco Central, Conselho Monetário Nacional e Ministério da Economia. “Dada a crescente amplitude da crise, é provável que medidas adicionais venham a ser adotadas em breve, e que, mesmo assim, uma contração do PIB neste ano seja inevitável”, disseram, antes dos anúncios feitos ontem.

Em uma faixa de projeções ligeiramente superior, o Bank Of America (BofA) revisou sua previsão para o PIB deste ano de 1,5% para -0,5%, enquanto o banco Safra cortou de 1,6% para -0,3%. O hiato do produto (nível de ociosidade da economia) deve se fechar apenas em 2023, diz o Sa

Na ponta pessimista, o ASA Bank espera agora retração de 3% da economia em 2020. A revisão ocorre dois dias após o banco ter cortado sua projeção de alta de 1,2% para zero. “Torcemos para estarmos errados nestas projeções”, dizem em relatório os economistas Carlos Kawall, Gustavo Ribeiro e Leonardo Costa, destacando que a incerteza é elevada.

No cenário do ASA, haveria paralisação parcial da atividade no segundo trimestre e restrições à circulação de pessoas em ao menos um terço do período.

A MCM destaca que sua revisão não se limita a este ano - foi de 2% para 1,4% em 2021. Na sua avaliação, torna-se maior o risco de que, passada a fase emergencial da crise da covid-19, durante a qual lideranças políticas devem trabalhar juntas, quedas de braço entre os Poderes voltem a prevalecer, restringindo o espaço para aprovar reformas. “A ameaça para os próximos anos, portanto, é de que, diante de um ‘cenário-base’ medíocre, o ‘cenário alternativo adverso’ seja muito preocupante. "

No contexto atual, o ASA diz que o foco de governo e Congresso está na reação à crise, e não nas reformas. Isso reflete, segundo o banco, falta de capacidade operacional do Legislativo, com congressistas afetados pela doença, e “o aumento do ruído político entre o governo e o Parlamento”.