Correio Braziliense, n. 21794, 17/11/2022. Política, p. 2

Lula promete preservar, mas cobra de países ricos

Francisco Artur


No centro das atenções de uma plateia formada por líderes da sociedade civil, cientistas, diplomatas e jornalistas, o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) discursou, ontem, na Conferência Internacional do Clima (COP27), em Sharm el Sheikh, no Egito. O futuro chefe do Executivo prometeu zerar o desmatamento na Amazônia até 2030.  

“O combate à mudança climática terá o mais alto perfil na estrutura do meu próximo governo”, enfatizou Lula. Para cumprir essa meta, segundo ele, serão necessárias ações para reativar os trabalhos da equipe de fiscalização e proteção ao meio ambiente. “Nos três primeiros anos deste governo que está acabando (Jair Bolsonaro), o desmatamento na Amazônia aumentou 73% e houve um desmonte na fiscalização. Isso vai acabar e ficará no passado”, destacou, sob aplausos. 

Ao comentar os desafios para conciliar desenvolvimento econômico e proteção ao meio ambiente, Lula disse que o agronegócio será “um aliado estratégico” nos próximos anos. Segundo ele, o agro será otimizado, de forma que não haverá necessidade de derrubar a floresta. 

“No nosso governo, buscaremos um agro regenerativo e sustentável, com investimento em ciência, tecnologia, e com educação no campo”, frisou. “Com os 30 milhões de hectares de terra degradada que temos, vamos torná-las agricultáveis, sem precisar desmatar um metro de terra, para continuarmos a ser um dos maiores produtores de alimentos no mundo.”  

O presidente eleito afirmou que sua gestão vai provar ser “possível promover crescimento econômico e inclusão social tendo a natureza como aliada estratégica e não mais como inimiga a ser abatida a golpes de tratores ou motosserras”.

Lula lembrou, porém, que o combate às mudanças climáticas é uma ação coletiva e dependerá dos esforços de todos os países. O trabalho, conforme ressaltou, terá de contar com o apoio financeiro das nações ricas para as mais pobres. 

“Não haverá futuro enquanto estivermos cavando um poço sem fundo entre ricos e pobres”, argumentou. Nesse momento, o presidente eleito mencionou o acordo firmado em 2009 pelos países ricos de oferecer, a partir de 2020, US$ 100 bilhões anuais para que as nações mais pobres enfrentassem os efeitos da crise climática. “Esse compromisso nem foi nem está sendo cumprido”, criticou.

Com a vitória de Lula nas eleições, a Noruega anunciou a retomada do financiamento do Fundo Amazônia. O país, que até 2019 concedia R$ 3,5 bilhões (93,8%) para que o Brasil combatesse o desmatamento no bioma, declarou ter interesse em manter os repasses. A Noruega tinha congelado o financiamento por discordar da política ambiental do governo Bolsonaro. 

A Alemanha, por sua vez, manifestou interesse no retorno ao Fundo Amazônia. Após as eleições brasileiras, o secretário do Ministério para Cooperação e Desenvolvimento da Alemanha, Jochen Flasbarth, disse no Twitter que o governo alemão tem interesse em fazer contato com o Brasil. “Há uma forte vontade dentro do governo alemão de chegar ao Brasil rapidamente agora”, escreveu.

COP no Brasil

No Egito, Lula anunciou interesse em que a próxima edição da conferência do clima seja realizada na Amazônia brasileira. O evento é promovido pela Organização das Nações Unidas (ONU). “Vamos falar com o secretário-geral da ONU para que a COP de 2025 aconteça no Brasil, na Amazônia: ou no estado do Pará ou no Amazonas. Os dois estão aptos a sediar”, afirmou no discurso. 

A razão para que o próximo evento do clima ocorra na Amazônia brasileira, segundo o futuro chefe do Executivo, é fomentar que líderes mundiais conheçam a região presencialmente.

“Será muito importante que a próxima COP aconteça na Amazônia, porque será a única forma de as pessoas conhecerem de perto a realidade concreta da região, não apenas a partir de leituras”, justificou.

O senador Fabiano Contarato (PT-ES), que está em Sharm El-Sheikh, disse ao Correio que o discurso do presidente eleito representa a mudança da posição do Brasil no cenário internacional. “Lula repõe a dignidade do Brasil em âmbito internacional, sepultando o isolamento da vergonhosa diplomacia de seu antecessor”, afirmou. “Sustentabilidade e combate à fome, mais que rótulos internacionais poderosos, serão legados efetivos do novo governo.”(Colaborou Henrique Lessa