Valor Econômico, v. 20, n. 4964, 20/03/2020. Finanças

BNDES prepara medidas para ajudar empresas

 Fabio Graner


Depois de anúncios do Banco do Brasil e Caixa, o BNDES agora prepara medidas para ajudar no combate aos efeitos econômicos do coronavírus, apurou o Valor. O desenho das iniciativas está sendo finalizado pela área técnica do banco e a intenção é anunciar algo nos próximos dias.

Há anos passando por um processo de redução, o BNDES está um pouco atrás nesse movimento de reação à crise. Mas tem sido procurado por clientes que já percebem um mercado de crédito mais fechado e avesso a emprestar e enxergam no banco uma alternativa para obter recursos nesse momento. E, com um caixa de R$ 140 bilhões, reforçado recentemente pela venda de ações da Petrobras antes que elas despencassem, se estrutura para agir.

Vistos com desconfiança e objetos de sonhos de privatização pela atual equipe econômica, os bancos públicos mais uma vez estão sendo acionados para fazer o enfrentamento de uma grave crise econômica. Ontem, a Caixa Econômica Federal fez novo anúncio de medidas. O presidente Jair Bolsonaro, anteontem, informou que o BB colocaria mais de R$ 70 bilhões em recursos para crédito. Desde a semana passada, já são mais de R$ 170 bilhões prometidos pelas instituições federais.

Pode até não ser como ocorreu em 2008 e 2009, mas já está claro que os bancos públicos se reapresentam como jogadores importantes na política econômica de combate à crise. No mínimo, ao já apresentarem recursos e prometerem não retrair como tradicionalmente fazem os privados.

No caso do BNDES, as prioridades da reação ainda estão sendo definidas. A instituição deve ter um olhar para empresas menores, mas também estuda reforçar mecanismos de articulação com outros bancos, alavancando recursos para empresas. Esse tipo de operação já existe, mas precisa ser revista para o momento de crise. Também deve haver criação de linhas novas de crédito, em especial para saúde, e suspensão de pagamentos, caminho já adotado por outros bancos.

O presidente da Associação dos Funcionários do BNDES, Arthur Koblitz, defende que o banco trabalhe com políticas de estímulo. Alongar dívidas, por exemplo, é uma das iniciativas necessárias que ajudaria a economia e a própria sobrevivência do banco. Também defende uma ampliação ambiciosa do capital de giro.

“É preciso também discutir algo em termos de taxa de juros diferenciada.

A TLP deve mostrar seus problemas agora”, disse. A Taxa de Longo Prazo (TLP) é a referência dos empréstimos do banco, mas é formada como taxa de mercado. Koblitz também sugere reforçar linhas para infraestrutura, mas aponta que isso precisa ser acompanhado de ações fiscais, senão não haverá demanda.

O economista-chefe da Confederação Nacional do Comércio (CNC) e conselheiro do BDNES, Carlos Thadeu de Freitas, avalia que o banco não tem condição de sair emprestando como no passado. Para isso ocorrer, diz, seria necessário reduzir juros, o que implicaria em subsídios do governo e consequente aumento do déficit fiscal. “O BNDES não deve ser muito usado dessa vez, não vai conseguir fazer como no passado”, disse.

Para ele, como Caixa e BB captam recursos de depósitos à vista, têm mais condições de fazer política de crédito do que o BNDES. “Tenho impressão que tem dinheiro sobrando na Caixa e no BB. Os bancos privados não querem dar dinheiro para ninguém, porque têm medo”, afirmou Freitas. Por isso, ele defende que o Banco Central derrube mais os juros. “O BC tem que colocar juro real negativo para os bancos terem que emprestar dinheiro”, sugeriu.

O economista e professor da FGV Nelson Marconi afirmou que os bancos públicos são fundamentais nesse momento em que os privados tendem a se retrair. Ele ressalta que o momento torna “patente” a relevância do Estado, até há anos criticado pela atual equipe econômica. Marconi aponta que o os bancos, em especial o BNDES, hoje estão com menos capacidade de agir, mas seguem sendo importantes. “Um setor que o BNDES tem que entrar fortemente agora é de saúde, financiar equipamentos. Ele tinha que ter linha muito forte nisso. E refinanciar dívida com seus clientes”, afirmou.

Para o presidente da Fenae, associação dos funcionários da Caixa Econômica, Jair Ferreira, os bancos públicos precisam intensificar suas ações, sendo mais audaciosos. “A Caixa, sendo 100% pública, tem que entrar de sola. Há um risco de quebradeira total. As empresas vão precisar de recursos. É hora de colocar dinheiro, alongar prazos”, disse defendendo que o banco abandone a ideia de devolver dinheiro ao Tesouro.