Valor Econômico, v. 20, n. 4961, 21/03/2020. Política, p. A10

Governo decide ir ao STF contra ampliação do BPC

Fabio Murakawa
Ribamar Oliveira 


O presidente Jair Bolsonaro decidiu acionar a Advocacia Geral da União (AGU) para impetrar ação no Supremo Tribunal Federal (STF) questionando a constitucionalidade da lei que ampliou o acesso das pessoas ao Benefício de Prestação Continuada (BPC).

O Congresso Nacional derrubou o veto do presidente à lei no último dia 11 de março, em meio à  disputa entre o governo e o Legislativo em torno do controle de R$ 30 bilhões do Orçamento.

A derrubada do veto foi vista como uma retaliação dos parlamentares à quebra de acordo costurado com a articulação política do Planalto e o Ministério da Economia sobre a gestão desses recursos.

A rejeição ao veto foi encaminhada na quarta-feira passada ao ministro-chefe da Casa Civil, Walter Souza Braga Netto. O prazo para o presidente Bolsonaro promulgar a lei se encerrava na última sexta-feira.

Após a derrubada do veto, o governo entrou com um pedido junto ao Tribunal de Contas da União (TCU). Na peça, o Planalto solicitava que o órgão esclarecesse se o governo estava obrigado a pagar os novos benefícios, mesmo que a lei aprovada não tenha obedecido ao artigo 195, parágrafo quinto, da Constituição. Esse dispositivo diz que nenhum benefício ou serviço da seguridade social poderá ser criado, majorado ou estendido sem a correspondente fonte de custeio total. No entender do governo, a Constituição não foi respeitada, e o custo da medida é estimado em R$ 21 bilhões por ano.

O ministro Bruno Dantas, do TCU, concedeu liminar, de forma monocrática, à solicitação feita pelo Ministério da Economia.

A liminar de Dantas, no entanto, foi derrubada pelo colegiado do tribunal, que considerou que a decisão extrapolou a competência do TCU, que não pode suspender uma lei. Apenas o Supremo Tribunal Federal tem essa competência.

Formalmente, o governo só poderá ingressar no Supremo questionando a constitucionalidade da lei depois que ela for promulgada pelo presidente Jair Bolsonaro. No entanto, depois da promulgação e da publicação no Diário Oficial da União (DOU), as pessoas com renda familiar de até meio salário mínimo já terão direito de receber os benefícios, que consistem em aposentadoria para o idoso de 65 anos e em um salário mínimo para pessoas com deficiência.

Haverá, portanto, uma situação de fato. O Ministério da Economia terá que começar a pagar os benefícios do BPC para as pessoas que preencherem os novos requisitos. O STF, no entanto, poderá conceder liminar à ação apresentada pela AGU, suspendendo o artigo da lei, até que o plenário do tribunal julgue o mérito da ação de inconstitucionalidade.

Tudo dependerá, portanto, do entendimento do ministro relator da ação no STF, que poderá não conceder uma liminar, por causa dos efeitos da pandemia do novo coronavírus sobre a população. No atual cenário, a questão poderá adquirir uma forte repercussão política, resultando em mais um desgaste para o governo Bolsonaro. Cortar ajuda à população considerada mais vulnerável em meio à crise pode contribuir para minar a popularidade do presidente.