Valor Econômico, v. 20, n. 4961, 21/03/2020. Opinião, p. A13

Mercados em tempo de pandemia

Carlos Primo Braga


John Templeton (1912-2008) foi um dos mais bem-sucedidos operadores em mercados financeiros globais. Ele costumava dizer que a frase mais perigosa no mundo dos investimentos era: “dessa vez é diferente”. Durante a euforia associada com a “bolha” das dot.com nos anos 90, por exemplo, empresas de tecnologia atraíram investimentos substantivos muito embora estivessem perdendo dinheiro de forma contínua. A tese era de que na “nova economia” o importante não era a lucratividade das empresas, mas a capacidade de atrair usuários. Da mesma forma após a crise financeira global, a expansão da economia global e o prolongado boom em Wall Street alimentaram a crença de que Bancos Centrais seriam capazes de evitar recessões indefinidamente.

A pandemia do covid-19 está fragilizando a fé na capacidade das autoridades monetárias. Ainda é cedo para prever o tamanho do estrago associado à crise, mas os mercados financeiros acumulam perdas, a volatilidade das bolsas aumentou dramaticamente e a destruição de valor traz memórias de 2008. É bem verdade que, como Paul Samuelson (Nobel de Economia, 1970) costumava observar, “o mercado de ações previu nove das últimas cinco recessões”. Os mercados financeiros tendem a flutuar entre os extremos de previsões otimistas e apocalípticas com uma velocidade que contrasta com o desempenho da economia real.

No entanto, vou desafiar a sabedoria de John Templeton e afirmar que “dessa vez é diferente”. Em primeiro lugar, a história de Wall Street sugere que quando os mercados transitam de euforia para pessimismo, como ilustrado pela correção de um bull (tendência de alta) para um bear market (tendência de baixa), em mais de 70% dos casos uma recessão ocorre nos EUA. Entre 19 de fevereiro e 12 de março de 2020, o índice S&P 500 colapsou 26,8%, indicando o final do bull market mais longo da história (quase onze anos) e uma correção substantiva.

Em segundo lugar, a capacidade de autoridades monetárias de corrigir as consequências econômicas de uma pandemia é limitada. Os cortes recessão ocorre nos EUA. Entre 19 de fevereiro e 12 de março de 2020, o índice S&P 500 colapsou 26,8%, indicando o final do bull market mais longo da história (quase onze anos) e uma correção substantiva.

Em segundo lugar, a capacidade de autoridades monetárias de corrigir as consequências econômicas de uma pandemia é limitada. Os cortes recessão ocorre nos EUA. Entre 19 de fevereiro e 12 de março de 2020, o índice S&P 500 colapsou 26,8%, indicando o final do bull market mais longo da história (quase onze anos) e uma correção substantiva.

Em segundo lugar, a capacidade de autoridades monetárias de corrigir as consequências econômicas de uma pandemia é limitada. Os cortes emergenciais de taxas de juros, injeções de recursos no mercado de recompra de títulos (repo), e a adoção de novas medidas de flexibilização quantitativa são políticas adequadas já que é importante evitar uma crise de liquidez. No contexto atual, porém, as reações dos atores econômicos podem ser contra-intuitivas. Ao invés de responder à queda da taxa de juros como um estímulo à aquisição de ativos de risco, investidores têm reagido como se a sinalização dos Bancos Centrais indicasse que o pior ainda estaria por vir. Eles vêm optando por ativos mais seguros como títulos do Tesouro americano. O rendimento (que se move em sentido oposto ao preço) dos títulos de 10 anos rompeu a barreira do 1% pela primeira vez na história e chegou a atingir um “satânico” 0,666% no dia 6 de março.

Em terceiro lugar, é importante reconhecer que o impacto da pandemia se traduz não apenas em um choque de demanda, em virtude da destruição de riqueza e o risco de se engajar em atividades de consumo, mas também em um choque de oferta com a paralisação de atividades econômicas. Na China, a produção industrial caiu cerca de 13,5% nos primeiros dois meses de 2020 e isso está afetando cadeias de valor agregado ao redor do mundo. O número de novos casos de covid-19 na China vem caindo rapidamente, mas a expansão internacional da doença significa que a demanda externa por produtos chineses será afetada nos próximos meses.

Nesse contexto, a esperança de uma recuperação rápida da segunda maior economia do mundo dificilmente se materializará.

Além disso, governos ao redor do mundo reconhecem que suas economias terão de ser colocadas em uma espécie de “coma” temporário com base em quarentenas, restrições a movimento de pessoas e práticas de distanciamento social para facilitar o controle da pandemia. Cresce também a percepção de que o impacto na economia - em particular no setor de serviços e entre pequenas e médias empresas - pode ser devastador. Em setores com dívidas elevadas, a reavaliação de risco pode gerar um efeito dominó de falências e uma crise generali de solvência.

Governos terão de complementar suas políticas monetárias com medidas fiscais expansionistas para minorar os efeitos da crise. Evidentemente tanto a munição das autoridades monetárias quanto o espaço fiscal de diferentes governos variam. No caso do Brasil, por exemplo, o governo terá de avaliar com cuidado a suspensão do teto de gastos já que tal medida pode ser contraproducente em termos da credibilidade do comprometimento da administração Bolsonaro com a consolidação fiscal, mas necessária no curto prazo.

Finalmente, cabe discutir a caracterização da covid-19 como um “cisne negro”, para usar a metáfora de Nassim Taleb. Um “cisne negro” é um evento que desafia expectativas, porque não reflete experiências passadas, e que pode ter um impacto dramático. A Organização Mundial da Saúde e vários comentaristas (por exemplo, Bill Gates), porém, já vinham alertando que uma pandemia poderia começar em qualquer

O verdadeiro “cisne negro” nesse momento é o confronto entre a Arábia Saudita e a Rússia. Ao responder ao excesso de oferta de petróleo com a decisão de expandir a sua produção, a Arábia Saudita confronta a Rússia, que havia desafiado a Opep, e gera um choque adicional (com o petróleo brent sendo atualmente negociado por volta de US$ 30 o barril em

O verdadeiro “cisne negro” nesse momento é o confronto entre a Arábia Saudita e a Rússia. Ao responder ao excesso de oferta de petróleo com a decisão de expandir a sua produção, a Arábia Saudita confronta a Rússia, que havia desafiado a Opep, e gera um choque adicional (com o petróleo brent sendo atualmente negociado por volta de US$ 30 o barril em contraste com US$ 61 por barril no início do ano). Essa queda nos preços terá um efeito devastador para a indústria de petróleo americana, que opera em condições de elevada alavancagem. Em síntese, os efeitos negativos dessa “pandemia econômica” estão apenas começando.

Carlos A. Primo Braga é professor associado da Fundação Dom Cabral e ex-diretor de Política Econômica e Dívida, Banco Mundial.