Valor Econômico, v. 20, n. 4966, 24/03/2020. Brasil, p. A6

Não calcular impacto político da medida foi grande erro

 Claudia Safatle


O governo cometeu um grande erro ao publicar, domingo à noite, a Medida Provisória 927, que permitia às empresas suspender contratos de trabalho por quatro meses sem pagar salários. A explicação de uma alta fonte da área econômica foi de que, na pressa, os técnicos que prepararam a MP não avaliaram o impacto político que ela teria ao ser divulgada sem uma outra medida provisória que deveria ser editada de forma simultânea.

O objetivo da MP 927 era o de regulamentar o trabalho em casa (“home office”), que é uma forma de prestação de serviços não reconhecida por lei exceto para casos bem específicos. A segunda MP - que ainda está sendo preparada para regulamentar o “layoff” (interrupção temporária da jornada de trabalho) - é que definirá quem vai pagar, quanto vai pagar e como vai pagar o trabalhador em “home office”.

Provavelmente o seguro-desemprego, reforçado com emissão de dinheiro nesses tempos de coronavírus, é que custeará uma parcela do salário. Não está definido, ainda, o quanto (50% ou 75% do valor) e se o empregador terá de assumir parte dessa conta.

Os técnicos estão fazendo cálculos e a nova MP não tem data definida para ser publicada.

“Falta comando”, disse uma alta fonte oficial. “Está uma torre de Babel”, comentou outro assessor, referindo-se à confusão que foi instalada com a divulgação da MP 927 que era draconiana com o trabalhador, ao deixá-lo sem trabalho e sem salário por quatro meses.

Ontem o presidente Jair Bolsonaro revogou o artigo 18 da MP 927, que previa, como combate aos efeitos da pandemia, a suspensão dos contratos de trabalho por quatro meses sem nenhum tipo de remuneração ao trabalhador. “Determinei a revogação do art.18 da MP 927, que permitia a suspensão do contrato de trabalho por até 4 meses sem salário”, escreveu Bolsonaro no Twitter, após a medida ter sido condenada por vários parlamentares. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), a qualificou de “capenga”.

Uma coisa parece certa, a priori: será muito difícil e extremamente oneroso para todos manter o comércio fechado por mais de 15 dias. Esta é uma medida que terá que ser reavaliada por todos os governadores.

A área econômica sabe que vai ter que rodar a maquininha e imprimir dinheiro para enfrentar a pandemia. Mas acha que conseguirá fazer isso de forma controlada durante a crise do coronavírus.